Candidatos à Presidência evitam maiores confrontos no primeiro debate
Organizado pela rede Band, os oito concorrentes ao Planalto não disseram novidades e procuraram apenas sublinhar a imagem com a qual partirão à caça aos votos

O primeiro debate entre os candidatos à Presidência, promovido pelas emissoras de TV e rádio da rede Band, foi bastante morno, com poucos confrontos e sem nenhuma surpresa ou revelação.
Serviu apenas para que os concorrentes à sucessão fixassem uma imagem pública para seduzir segmentos díspares em que se dividem os eleitores.

O debate foi longo. Começou às 22h desta quinta-feira (9/8) e terminou à 1h12 da madrugada de sexta. Mesmo com a previsível baixa audiência, sobretudo nos blocos finais, uma das utilidades da iniciativa é de permitir que os marqueteiros selecionem, para exibir futuramente no horário eleitoral, os melhores momentos de seus candidatos.
Não se confirmou a previsão de que Jair Bolsonaro (PSL) se tornaria o alvo preferencial da agressividade, por sua condição de líder nas pesquisas de intenção de votos.
O ex-capitão do Exército se limitou a insistir em suas posições conservadoras, como ao argumentar que um dos problemas mais sérios da educação era a indisciplina nas escolas, questão que seria resolvida por meio da adoção de um regime interno semelhante ao dos colégios militares.
Também disse que os policiais que combatem a criminalidade têm suas atuações limitadas pela cartilha dos direitos humanos.
Geraldo Alckmin (PSDB) foi bastante abordado, certamente pela previsão de que ele se tornaria em breve o candidato em ascensão. Nos dois primeiros blocos, ele foi interrogado em três ocasiões e a seguir em duas outras, o que era o máximo permitido pelo rígido regulamento interno acordado pelos presentes.
Quem mais tentou colocar em posição desconfortável o ex-governador de São Paulo foi a candidata Marina Silva (Rede), para quem ele retribuirá o apoio do centrão, caso eleito, com o loteamento de seus ministérios por esses incômodos aliados, sobre os quais pesam investigações de corrupção.
Henrique Meirelles foi seriamente confrontado apenas por Guilherme Boulos (Psol), que o responsabilizou pelos juros elevados no varejo bancário e por se preocupar em fazer com que os mais ricos não pagassem mais impostos.
Mas o candidato do MDB saiu-se relativamente bem - e com um certo tom professoral -ao lembrar que na presidência do Banco Central, e sob o governo Lula, construiu as bases para a criação de 40 milhões de empregos.
Boulos exerceu seu direito à insistência ideológica, mesmo porque as pesquisas o dão como simples figurante, e também porque, na ausência de um representante do PT, exercitou com dignidade o radicalismo.
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Como, por exemplo, ao prometer uma reforma tributária que diminuiria o peso dos impostos indiretos e, para compensar, cobraria mais Imposto de Renda dos mais ricos e criaria alíquotas para as grandes fortunas e para as heranças.
COMBATE À CORRUPÇÃO
Álvaro Dias (Podemos) -que, a exemplo de Boulos, não vestia gravata -bateu insistentemente na tecla de seu apoio incondicional à Lava Jato, prometendo elevar a operação, hoje circunscrita a Curitiba, à condição de mecanismo nacional de combate à corrupção. Por duas vezes disse que nomearia para o Ministério da Justiça o juiz Sérgio Moro.
Sobre o confronto com os corruptos, Geraldo Alckmin afirmou que o melhor instrumento seria a reforma política, com a adoção do voto distrital. Por ele, os eleitores exerceriam sobre os parlamentares um tipo de vigilância hoje inexistente.
O candidato Ciro Gomes (PDT) foi resumidamente um moderado. Em poucos momentos comportou-se como o representante de um partido que se quer de esquerda.
Ao discorrer sobre seu modelo de Reforma da Previdência, além de prometer respeitar os direitos adquiridos, disse que criaria um mecanismo de capitalização, para que cada assalariado do setor público colhesse, ao se aposentar, os frutos individuais de sua poupança. Ora, é essa também a proposta de Alckmin.
A grande surpresa do debate foi cabo Daciolo (Patriotas), personagem desconhecido fora do Rio de Janeiro, Estado em que foi bombeiro militar e pelo qual está em seu primeiro mandato de deputado federal.
Evangélico e citando Deus e Jesus em suas respostas, o candidato conservador prometeu fazer uma auditoria da dívida pública - uma plataforma antiga que as esquerdas já abandonaram -e abrir guerra contra os sonegadores.
Num de seus momentos de descontrole, afirmou que operam dentro do Congresso Nacional verdadeiras "quadrilhas" que ele, se eleito, desmantelará.
LANCES AMISTOSOS
Em muitos momentos um candidato fazia a um outro uma pergunta sobre a qual ambos poderia fornecer as mesmas respostas, como se fossem, a exemplo do futebol, atacantes que trocam passes a caminho do gol. Álvaro Dias foi indagado sobre a violência contra a mulher.
E é claro que a condenou categoricamente. Mas o cabo Daciolo, escalado para comentar a resposta do adversário, contentou-se em afirmar, como se estivesse num culto evangélico, que "o problema é a falta de amor ao próximo".

O mesmo aconteceu entre Alckmin e Marina, ao falarem sobre a educação. O ex-governador fez um balanço sobre sua administração no Estado de São Paulo, e a ex-senadora lembrou o fato de ter sido analfabeta até os 16 anos, e o esforço que fez para a seguir chegar até a universidade.
Quando Boulos deu um diagnóstico sombrio sobre o aborto clandestino - "todos os dias morrem quatro mulheres" que recorrem clandestinamente à cirurgia -Marina, que deveria contradizê-lo (ela é por motivos religiosos contra a legalização da interrupção voluntária da gravidez), limitou-se a dizer que, por se tratar de um problema complexo, ele deveria ser levado a plebiscito.
A mesma Marina Silva teve momentos de profunda concordância com Ciro Gomes, quando o tema foi o rio São Francisco. Ambos estavam perfeitamente de acordo quanto à necessidade de evitar que afluentes daquele rio poluíssem suas águas.
Dois momentos de inesperado bom-humor: quando cabo Daciolo interpelou Ciro Gomes sobre uma organização "comunista" sobre a qual o candidato do PDT disse jamais ter ouvido falar, ou quando, referindo-se ao conjunto de seus adversários, Boulos disse que "aqui prevalessem os 50 tons de Temer", em alusão ao livro e ao filme erótico "Cinquenta Tons de Cinza".
O momento mais elegante do debate se deu bem ao final, quando, gastando parte do tempo precioso para suas considerações finais, Ciro Gomes pediu publicamente desculpas ao juiz Sérgio Moro, por ter dito que a mulher dele -que não é juíza -também recebia auxílio moradia.
CALENDÁRIO DE DEBATES
Dos 13 candidatos registrados pela Justiça Eleitoral, a rede Band convidou os oito que, em conformidade com a lei, pertencem a partidos com no mínimo cinco deputados ou senadores. O PT cumpre essa disposição. Mas Lula (PT) está preso em Curitiba, e decisão do TRF4, de Porto Alegre, vetou o pedido de seus advogados para que, mesmo indiretamente (como por vídeos), ele também estivesse presente.
Ao todo, os pretendentes à Presidência da República se confrontarão em seis oportunidades pela televisão. O próximo debate será no próximo dia 17, na Rede TV, enquanto o último, pela Rede Globo, está programado para o dia 4 de outubro.
FOTOS: Divulgação/Band/Kelly Fuzaro e Reprodução de TV