Guerra comercial entre China e EUA resvala no Brasil
A crise entre as duas economias reduziu os preços das commodities, diminuindo a lucratividade das exportações de minérios e produtos agrícolas do Brasil
A imposição de novas retaliações comerciais dos Estados Unidos à China representará poucas oportunidades para o Brasil e poderá complicar as exportações brasileiras.
A avaliação é do presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Ele ressalta que o baixo volume de exportações de bens manufaturados pelo Brasil não permitirá que o país tire proveito da sobretaxação de bens chineses pelo governo do presidente Donald Trump.
A partir desta quinta-feira (23/08), os Estados Unidos passaram a cobrar uma sobretaxa de 25% sobre bens importados da China avaliados em US$ 16 bilhões.
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A lista inclui 279 produtos, entre os quais tipos de óleo lubrificante, tubos de plástico flexível e motores de ar-condicionado. Em julho, o governo norte-americano tinha introduzido a tarifação extra para 818 produtos, no total de US$ 34 bilhões.
Em tese, o Brasil poderia aproveitar-se da retaliação comercial para exportar mais produtos manufaturados para o mercado norte-americano. No entanto, de acordo com Castro, as retaliações trazem mais incerteza sobre o comércio externo brasileiro.
Isso porque a guerra comercial entre as duas maiores economias do planeta reflete-se nos preços das commodities (bens primários com cotação internacional), que caem em momentos de tensão e diminuem o valor das exportações de minérios e produtos agrícolas do Brasil.
“Em termos de produtos manufaturados, nossa concorrência é muito pequena. O Brasil só tem 0,61% na participação mundial de exportações de manufaturados. É mais provável que o Brasil sinta o impacto indireto das medidas dos Estados Unidos via commodities”, declara o presidente da AEB.
A AEB projeta que a balança comercial (diferença entre exportações e importações) encerrará 2018 com saldo positivo de US$ 56,3 bilhões. O presidente da entidade considera o superávit comercial respeitável, até por se tratar do segundo maior saldo positivo da história. Ele, no entanto, adverte que os números não são tão positivos.
“O resultado da balança comercial não é causa, mas consequência. Um superávit em torno de US$ 56 bilhões seria comemorável se o país estivesse importando US$ 450 bilhões e exportando mais de US$ 500 bilhões. Só que o país encerrou o ano passado exportando US$ 218 bilhões e importando US$ 151 bilhões. A corrente de comércio [soma de exportações e importações] ainda está em valores muito baixos”, analisa Castro.
O presidente da AEB ressalta que a crise cambial da Argentina, que tinha recuperado o posto de maior comprador de manufaturados brasileiros no ano passado, tornará cada vez o Brasil mais dependente das commodities, cujos preços são mais sujeitos a turbulências internacionais, como a guerra comercial entre China e Estados Unidos.
Segundo ele, o comércio externo do Brasil só deslanchará se o país fizer reformas estruturais que aumentem a competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional.
“Nem é questão de abrir a economia [brasileira]. O Brasil não exporta mais porque o produto brasileiro é caro. Somente reformas que reduzam o custo dos bens brasileiros, como a da Previdência, a tributária e a política, e mudanças que abram espaço para investimentos em infraestrutura poderão melhorar a competitividade do país. Os desafios são muito mais internos que externos”, diz.
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