Embracon aposta em consórcio de serviços para atrair empreendedores
Administradora se reposiciona para atrair um público que planeja, segundo Luis Toscano (foto), vice-presidente de operações, e adere à modalidade para ampliar, reformar ou fazer melhorias em seu negócio
A rede de supermercados São Vicente, com sede em Nova Odessa, distante 130 quilômetros da capital paulista, costuma usar para fazer melhorias ou ampliações em suas lojas.
Já a corretora de seguros AFASeg, de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, não somente aderiu para aumentar suas instalações, como para impulsionar suas receitas com um novo produto.
O tradicional consórcio, antiga modalidade de crédito que facilita a aquisição de bens de alto valor, como veiculos e imóveis, e mais recentemente, a realização de sonhos, como casamentos, viagens e até cirurgias plásticas -o chamado consórcio de serviços -, agora tem sido procurado cada vez mais por um outro público: os empreendedores.
Considerado uma maneira econômica e de baixo risco de se investir a longo prazo e menos burocrática do que um financiamento, a modalidade de consórcio tem se apresentado como solução para ter ou montar um negócio, já que não é atrelada a um bem específico - em especial aos pequenos e médios, seja para ampliar a sede, reformular o portfólio, redesenhar a loja, contratar uma consultoria ou investir a longo prazo para necessidades futuras.
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Um levantantamento da ABAC (Associação Brasileira das Administradoras de Consórcio) dá uma ideia disso: em um setor que movimentou R$ 96,32 bilhões em volume de negócios de janeiro a novembro de 2018 (alta de 3,2% ante igual período de 2017), a venda de novas cotas da modalidade avançou 50% nesses onze meses.
Já os créditos comercializados no décimo primeiro mês de 2018 aumentaram 64,6% ante igual período do ano anterior. Novembro também registrou o recorde mensal de venda de cotas de consórcio de serviços no ano: foram 5,5 mil, com alta de 31,2% no acumulado de contemplações, e de 65% nos créditos correspondentes.
E essa é uma das apostas da Embracon, administradora de consórcio com 30 anos de mercado e 120 mil clientes ativos, que passa por um processo de transformação digital, segundo Luis Toscano, vice-presidente de operações.
"Ao longo de quase 60 anos do setor, foram surgindo clientes com diversas necessidades. E nossa política é começar pela melhor experiência, da venda até que seja contemplado, disponibilizando todas as ferramentas que ele precisa para tomar sua decisão", diz. "Com a modalidade, dá para usar o dinheiro do jeito que (o empreendedor) precisar."
Apesar de ainda não existir um número fechado, já que o produto foi lançado há menos de seis meses, a aderência ao consórcio de serviços na administradora têm sido tão promissora, de acordo com o executivo, que a empresa projeta vender R$ 20 milhões em cotas em 2019 - o equivalente a 3% de seu faturamento.
Como exemplos, Toscano cita a AFASeg, primeira corretora de seguros que identificou forma de complementar seu portfólio, alavancar receitas e ampliar sua sede com o consórcio - além de aumentar a fidelidade de clientes que buscam uma compra planejada, segundo o proprietário Antônio Felício Arsuffi.
"Levamos esse produto para o Clube dos Corretores de Seguro do ABC e, entre setembro e dezembro de 2018, um grupo formado por 30 profissionais apresentou vendas de R$ 3,5 milhões", afirma.
Ou o caso da rede São Vicente, com 20 supermercados e um Centro de Distribuição espalhados na região de Campinas e Americana, no interior paulista, adepta da modalidade para ampliação e reforma de lojas, assim como da de imóveis, quando pretende adquirir novos terrenos, permitindo trabalhar mais de um empreendimento por vez.
"É uma facilidade. Essa dívida de longo prazo (120 a 180 meses), sem correção pelo IOF e pela Selic (apenas taxa de administração e INCC anual, no caso de imóveis), melhora o fluxo de caixa. E quando precisamos, é só acompanhar e dar um lance próximo da realidade", diz o diretor financeiro Francisco Tamborlini.
Na entrevista a seguir, Toscano explica como a modalidade pode beneficiar o empreendedor, além de comentar os investimentos da administradora em inovação para melhorar a experiência dos consorciados:
Como o consórcio de serviços, que é muito amplo, passou a atrair empreendedores?
O critério para adquirir um consórcio é simples: basta comprovar capacidade financeira. Se você pode comprometer até 30% dos seus rendimentos com as parcelas, pode comprar de R$ 30 mil até R$ 5 milhões em créditos para fazer o que quiser.
Se tem um público que se planeja é o de empresários. Mesmo o iniciante se planeja. Ele abre um escritório ou uma loja pagando aluguel, e vê no consórcio uma alternativa: pagando um pouquinho por mês, ele pode comprar um terreno ou imóvel para construir ou ampliar a sede própria. E a modalidade começou a atrair (empreendedores) por dois motivos.
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Com a crise, nos últimos cinco anos, surgiram empresas criadas por empreendedores profissionais que saíram do sistema financeiro, por exemplo, tinham uma carteira de clientes e montaram escritório de representação para vender seguro e também consórcios. Com isso, eles ampliaram seu negócio, e suas receitas. Então, eles vendem consórcios com seus outros produtos, o que tem ajudado não só a montar o escritório, mas a comprar computadores, por exemplo.
Por outro lado, há supermercados, por exemplo, que buscam consórcio para fazer ampliação ou reforma nas lojas (como é o caso da rede São Vicente), empresas de ônibus que querem ampliar suas garagens...
Outros exemplos de uso dessa modalidade são usar a carta de crédito para contratar uma consultoria que ajude a melhorar o serviço que você oferece, ou fazer um projeto com um contador para montar uma contabilidade interna, um projeto tributário... Se sou uma loja e quero mudar meu catálogo, também dá. Ou seja, dá para usar consórcio de serviços para o que precisar.
Qual o diferencial que a modalidade oferece para quem pretende abrir o próprio negócio?
Pense nas opções que o empreendedor tem hoje para tomar decisão. O banco, que poderia fomentar seu negócio, tem linhas de empréstimo muito caras, pedem muitas garantias.
Já os critérios do BNDES para liberar um financiamento, atender todas essas exigências que ele pede, é difícil. Já o consórcio não tem esse rigor: estou falando de um funding que é dele e em grupo – diferente de um banco, que faz intermediação e empresta a juros mais altos.
Agora pegue um empreendedor no começo, que não tem histórico e entra num banco para pedir R$ 100 mil. O banco vai falar: não dá. Já no consórcio não há esse problema, porque ele pode adquirir uma carta de crédito.
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Nós somos muito flexíveis, ele pode fornecer extrato, mostrar receitas que entram na conta, enfim, comprovar de diversas formas o seu rendimento financeiro. Essa flexibilidade ajuda muito quem está começando seu negócio.
Como exemplo cito um cliente, dono de uma empresa de odontologia. O empreendedor começou sozinho, comprou o imóvel via consórcio e, depois, amigos da escola resolveram formar um grupo, virar sócios. E na hora em que decidiram formatar o negócio juntos, usaram o consórcio de serviços para contratar um empresa para montar a estratégia de comunicação e marketing. Foi uma solução que custou R$ 50 mil para eles. É muita coisa para quem está começando mas, para formatar um negócio, é necessário trabalhar a imagem. E essa opção pelo consórcio deu tão certo que agora eles planejam virar franquia.
O sr. disse que a Embracon passa por uma mudança de posicionamento que inclui sua tranformação digital. Como a empresa enxerga esse novo momento do consumidor?
Em 2017, entendemos que a Embracon precisava mudar de posicionamento, tanto de marca como em relação ao seu público. E isso em um setor onde a maioria das empresas de consórcio tradicional trabalham “no papel”, nós teríamos que estar online. Então, investimos R$ 12 milhões nesse processo que chamamos de "transformação digital", que começa em levar a venda de consórcio para o ambiente digital, onde o consumidor pudesse simular planos e financiamentos pela internet.
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Colocamos essa plataforma à disposição dos nossos vendedores e, isso possibilitou que, em 2019, a Embracon passasse a fazer parte de outras plataformas de negócio, como marketplaces. Também investimos em redes sociais, assim como investimos em propaganda e em um aplicativo próprio. Nosso site também foi replanejado, para ficar mais fácil para o usuário alcançar nossos produtos e tirar dúvidas com nossos colaboradores. Ou seja, trabalhamos todas as vertentes para virar omnichannel de verdade.
Como a empresa trabalha a inovação?
Entendemos que a empresa tem de se aculturar à inovação, Não é uma questão de área especifica. Criamos um núcleo sistematizado nesse sentido, e estamos engajados, em busca de ideias para melhorar os processos e facilitar ainda mais a vida do consorciado (como o projeto CoLab, que introduz o tema e integra as equipes).
Acabamos de lançar uma campanha para startups e fintechs (o Hackathon Embracon, nos dias 23 e 24 de março), pensando em maneiras de incentivar a educação e a consultoria financeira pelos meios digitais.
Também estamos fazendo pelo viés do empreendedor, para melhorar ainda mais o dia a dia do seu negócio. O consumidor pede cada vez mais essas mudanças, e hoje há pessoas de todas as gerações usando consórcio. Mas é um processo que não é do dia para a noite.
Nos últimos cinco anos, no período de queda nas vendas de veículos, o mercado imobiliário um pouco parado e o varejo fechando muitas lojas durante a crise, como o setor de consórcios se comportou?
Consórcio tem uma característica muito interessante: ele se adapta ao ambiente. Quando falamos em mercado aquecido, com o consumo lá em cima, o setor acompanha. Por outro lado, quando enfrentamos um cenário de retração, de questões políticas e econômicas complexas, a população tende a poupar. Já o empresário não investe, fecha o cofre.
Nesses momentos, quem busca o consórcio não busca uma ferramenta de compra e aquisição, mas um porto seguro. Um investimento onde pode ser contemplado, não precisa se livrar de um bem; pode pegar o dinheiro e deixar rendendo com um percentual da Selic. A economia voltou ao normal, é só usar seu crédito.
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Exemplo disso são clientes como incorporadores de prédios. Com a crise, eles tinham um estoque alto de imóveis que não foram vendidos. Para manter o custo daquele imóvel fechado, optaram pelo consórcio. E falavam ao interessado: “você pode vir e mudar e continuar pagando o consórcio (ao invés de tentar um financiamento imobiliário). Quando for contemplado, você me paga e eu coloco isso no contrato.” Ou seja, você coloca alguém no apartamento e transfere a despesa. E todos saem ganhando.
Nesse ambiente, muitos fizeram manobras financeiras pra superar dificuldades. Para quem atravessou isso tudo, agora que a confiança aumentou e há mais de estabilidade econômica e política, a tendência é começar a melhorar.
FOTOS: Natália Guimarães/Divulgação e reprodução do site