Futuro do varejo: já ouviu falar nas DNVBs?
Conceito criado por Andy Dunn (na foto), CEO da Bonobos, propõe maior conexão com o cliente num processo em que a marca exerce total controle da experiência de compra -do desenvolvimento do produto até a venda final
Uma marca aspiracional, nativamente digital e verticalizada da indústria direto ao consumidor final. É assim que as chamadas DNVBs (Marcas Verticais Digitalmente Nativas) se apresentam.
O conceito foi criado há pouco mais de um ano por Andy Dunn, CEO da Bonobos, uma das principais marcas americanas de vestuário masculino, fundada em 2007, em Nova York. O negócio, que começou vendendo ternos pela internet, foi adquirido pelo Walmart, em 2017, por US$ 310 milhões.
No último ano, Dunn publicou um artigo sobre o assunto e nele reúne seus principais aprendizados, após mais de dez anos estudando as movimentações do varejo americano.
A HORA E VEZ DAS DNVBs
A digitalização levou muitas marcas do mundo offline para o meio digital, que viram no canal o nascimento de um novo mercado a ser explorado. Neste cenário, surgiram também novos modelos de negócios como as startups e o conceito omnichannel.
A bola da vez, as DNVBs estão focadas em promover experiências memoráveis, segundo Dunn. Essas empresas partem do princípio de que é preciso investir numa forte construção de marca para que os consumidores conheçam e comprem os produtos.
De forma resumida, as DNVBs operam pelo modelo D2C, em que vendem diretamente para seus clientes. E como são formuladas no ambiente digital, essas marcas se valem de todo o potencial da internet para estar mais próximo do consumidor e tentar conhecê-lo melhor.
Nas palavras de Dunn, o e-commerce tem pouca margem, enquanto o DNVB tem margens maiores. Uma empresa de e-commerce pode crescer incrivelmente rápido, enquanto uma DNVB pode não crescer tão rápido, mas é mais valiosa a longo prazo.
Em seu primeiro artigo sobre o tema, Dunn destaca as quatro principais características que definem uma DNVB:
1. O principal meio de comunicação com os consumidores, que tem como base o storytelling é a internet. E em quase todos os casos, a marca nasce digitalmente.
2. A marca é vertical, ela cresce junto com seus clientes. O nome da marca está no produto físico e no e-commerce, mas esse canal é apenas uma camada de ativação, e não é o ativo principal da comercialização.
3. A DNVB é maníaca pela experiência e intimidade com o consumidor. A experiência se sustenta em três pilares: produto físico, experiência web/mobile e atendimento ao cliente. A fusão desses pilares constrói a marca no imaginário do consumidor.
4. Esse modelo de negócio raramente opera apenas em canais digitais. Ele se estende para o offline através de varejo físico com experimentação e parcerias exclusivas com grandes varejistas. Em quase todas as parcerias, a marca controla sua distribuição externa.
Enquanto nos Estados Unidos, esse mercado está aquecido, com marcas como Everlane, Casper, Honest, Mack Weldon e Rockets of Awesome, no Brasil, o movimento ainda é tímido.
SEM INTERMEDIÁRIOS
As DNVBs demoram mais tempo para crescer porque fomentam um relacionamento com o consumidor desde o início, se conectando por meio das redes sociais. Assim, uma longa relação é construída com os clientes que se identificam com os propósitos das marcas – e é por isso que ter um propósito é tão importante neste caso.
O da Zissou, startup brasileira especializada em colchões, passa pelo resgate da qualidade de vida, já que mais da metade da população brasileira sofre de algum distúrbio que afeta a qualidade do sono.
A intenção da marca é mostrar que uma noite mal dormida pode resultar em mau humor e dores físicas, além de prejudicar projetos, negócios e as relações interpessoais.
Ou seja, a Zissou não se apresenta ao cliente vendendo colchão. A marca se aproxima com a proposta de redefinir a rotina de sono das pessoas. Para materializar essa relação, a marca dá cem dias de teste para que clientes experimentem e avaliem o produto, e, se não gostarem, recebem o dinheiro de volta.
Além disso, a marca segue um conceito bem inovador no modelo bed in a box, inédito no Brasil, em que o colchão passa por um processo de compressão, e é enrolado dentro de uma caixa de um metro de altura, que cabe no elevador, porta-malas, bicicleta ou ainda pode ser facilmente transportada em qualquer transporte público.
Amit Eisler, fundador da Zissou, diz que essa relação direta com o consumidor tem o poder de criar uma experiência única, produtos únicos e uma relação de custo e benefício fantástica.
"A partir do momento em que nos relacionamos direto com os clientes, cortamos todos os intermediários que não são necessários da cadeia. Com isso, conseguimos nos apropriar das margens desses intermediários e repassar isso como custo-benefício para o consumidor”, diz.
Essa margem que Amit aponta é bastante significativa. Em um setor em que as micro e pequenas empresas são as maiores responsáveis pela produção, a venda de colhões ainda é majoritariamente realizada por terceiros - 56,4% em lojas especializadas, 21,6% em comércios de móveis e 13,8% em lojas de departamentos. Esse fluxo encarece o produto até a chegada ao consumidor final.
Sobre o setor em que opera, Eisler diz que a indústria fatura R$ 5 bilhões ante R$ 30 bilhões do varejo. Portanto, um produto que sai da fábrica custando em torno de R$ 200, chega ao consumidor por volta de R$ 1 mil. Isso por conta de tantos intermediários, como distribuidor, varejista, franqueado e comissões, explica o empresário.
DNVB SEM SABER
A LIVO, marca brasileira de óculos de sol e de grau, é outro exemplo. Arthur Blaj, um dos sócios-fundadores, colocou o conceito em prática antes mesmo de ouvir falar nas DNVBs. Ele constatou uma brecha no mercado de óticas e resolveu fazer algo diferente do que vinha sendo visto nesse segmento.
A brasileira nasceu digitalmente, vendendo óculos em um e-commerce, ao mesmo tempo que possui pontos físicos para os clientes que desejam esse contato. O empreendedor cortou os intermediários para vender ao cliente final um produto de qualidade e com preço mais justo aos clientes. São eles quem desenham, produzem, vendem e entregam os óculos.
Assim como a Zissou, a LIVO também acredita nas marcas como agentes de mudanças na sociedade e lançou o projeto “O LIVRO por LIVO” – um incentivo à alfabetização e à leitura.
A cada óculos vendido, a empresa garante um mês de conteúdo para uma família na Eduqmais, uma plataforma de comunicação entre família e escola a fim de melhorar o engajamento dos pais na formação das crianças. Já dez óculos vendidos correspondem a um ano letivo do estudante.
FOTOS: Divulgação