'Ainda é preciso explicar por que as mulheres merecem estar em cargos de liderança'

Dhafyni Mendes, cofundadora da Todas Group, reconhece que muitas empresas estão abertas a uma cultura de equidade, porém, ainda faltam soluções corporativas para o desenvolvimento e retenção de carreiras femininas

Mariana Missiaggia
03/Abr/2025
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'Ainda é preciso explicar por que as mulheres merecem estar em cargos de liderança'

Se há algumas décadas estávamos discutindo a entrada das mulheres no mercado de trabalho, hoje seria mais relevante voltar os nossos olhos para uma nova questão: por que boa parte delas está deixando seus empregos? A provocação, de Dhafyni Mendes, cofundadora da Todas Group, é baseada em números e nas interações que permeiam o seu dia a dia.

Há cinco anos, Dhafyni criou a Todas Group junto com sua sócia Tatiana Sadala. Com base na sua própria história, descobriu na prática o que significa gerenciar múltiplas demandas, tomar decisões sob pressão e equilibrar responsabilidades. Mãe aos 19 anos, sem nem mesmo ter ainda entrado no mercado de trabalho, ela conta que ter dividido a sua trajetória com outras mulheres a fez enxergar as muitas barreiras estruturais que enfrentam - até hoje - para se destacar no mercado de trabalho.

Seu trabalho à frente da Todas Group é mapear esses percalços e pensar em soluções corporativas não apenas para o desenvolvimento, mas também para a retenção de carreiras femininas por meio de cursos e mentorias para empresas de diferentes portes. O objetivo é mostrar que, ao priorizar mulheres, as empresas podem atrair mais lucro, investimentos e ampliar suas visões de negócios. Nomes como L'Oréal, Johnson & Johnson, Ifood e TIM fazem parte dessa lista.

Hoje, o negócio conta com mentoras como a apresentadora Gabriela Prioli; Kim Farrell, Head Global de Creators TikTok; Rachel Maia, Presidente do Conselho Administrativo Pacto da ONU; dentre outras. Além de ter levantado iniciativas como a Equilucro, uma calculadora virtual que estima o quanto empresas deixam de lucrar por não equilibrarem os gêneros em suas contratações.

Em entrevista ao Diário do Comércio durante a quarta edição do Women Entrepreneur Forum (WeForum), em Belo Horizonte, Dhafyni citou um estudo da Organização Internacional do Trabalho que diz que empresas que têm mulheres em cargos de liderança têm de 5% a 20% mais lucratividade, além de promover bem-estar, produtividade e inovação.

Ainda assim, globalmente, as mulheres estão sendo menos promovidas em relação aos homens. Como resultado disso, eles são mais numerosos nos cargos de gerência e, consequentemente, sobem em maior número para posições superiores de liderança. Apesar de um progresso modesto, Dhafyni indica que as mulheres ainda são sub-representadas e veem a ascensão profissional como algo distante.

Um material do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made), da Universidade de São Paulo (USP), sobre o custo da maternidade no Brasil, mostra que 11,1 milhões de mulheres tiveram de abrir mão de suas carreiras em 2022 para cuidar dos filhos e da casa, apesar de desejarem estar no mercado. Se conseguissem permanecer, a força de trabalho cresceria em torno de 10%.

Motivos para as mulheres abandonarem o trabalho não faltam: remuneração baixa, sobrecarga de trabalho doméstico, falta de reconhecimento, jornada de trabalho excessiva, falta de plano de carreira, pressão e competitividade no ambiente corporativo. E os índices são ainda piores entre mulheres das classes D e E, jovens (entre 18 e 35 anos), LGBTQIA+ e pretas e pardas.

Outra pesquisa mais recente traz um outro alerta: cientistas mulheres estão deixando as instituições acadêmicas no auge de suas carreiras. A pesquisa da CUPA-HR, associação americana para profissionais de RH que atuam no ensino superior, mostra que a porcentagem de mulheres em cargos acadêmicos diminui com o aumento da idade. Mais da metade (52%) dos docentes na faixa etária de 25 a 30 anos são mulheres, mas as profissionais representam menos de um terço (30%) no grupo de 65 a 70 anos. Essa queda é ainda mais visível para mulheres nas áreas de STEM (sigla em inglês para áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática).

As mesmas tendências aparecem em outra pesquisa, essa da Academia Nacional de Ciências, Engenharia e Instituto de Medicina dos Estados Unidos. O material destaca que os esquemas de gênero influenciam sistematicamente as percepções e avaliações de competência de mulheres e homens, o que causa uma subavaliação das mulheres e uma superavaliação dos homens.

"Cientistas e engenheiros demonstram preconceito contra mulheres que se candidatam a bolsas, empregos e cargos permanentes. Para atingir a mesma classificação de competência que um homem, uma mulher deve ter um histórico significativamente superior", cita o estudo.

Ainda assim, Dhafyni diz que, no Brasil, os últimos anos foram marcados por avanços com programas de governo que visam a equidade de gênero no ambiente de trabalho, como o Empresa Cidadã, que prevê a prorrogação dos dias de licença-maternidade e paternidade, a Lei de Igualdade Salarial e o Emprega Mais Mulheres.

Algumas empresas saíram na frente e criaram as suas próprias diretrizes em busca dessa meta.  Signatárias do Pacto Global da ONU, por exemplo, podem aderir ao Movimento Elas Lideram, que propõe a meta de atingir 30% de mulheres na alta liderança até o fim deste ano e 50% até 2030.

"São ganhos conquistados a duras penas e, sem dúvidas, são encorajadores, porém, também são frágeis. Ainda é lento o progresso das mulheres em posições de gerência e chefia. Ainda é preciso explicar por que as mulheres merecem estar em cargos de liderança", disse.

Em um dos estudos realizados pela Todas Group, Dhafyni diz ter esmiuçado durante cinco meses as 40 maiores líderes da América Latina para entender o que foi determinante na carreira dessas mulheres que chegaram ao topo de organizações. Durante essa pesquisa, conseguiu mapear 16 habilidades que todas citaram.

A partir daquilo, entenderam que existem pontos essenciais e comuns à carreira e ao crescimento feminino nesses espaços e desenvolveram uma metodologia para que todas pudessem expandir essas 16 habilidades em diferentes estágios de carreira. De forma resumida, Dhafyni explica que essas mulheres passam por uma avaliação para entender quais são as fortalezas de cada uma e quais são os lugares em que precisam evoluir de forma mais eficiente.

"Essas mulheres que estão nos cargos mais altos não são ótimas nas 16 habilidades, mas elas sabem com clareza quais habilidades em que são muito boas. Mas é cultural da brasileira olhar para as suas fraquezas", disse.

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