Traiu, pagou

Maridos enganados são indenizados pelas esposas adúlteras

Ivone Zeger
24/Mar/2015
Advogada, consultora jurídica, palestrante e escritora.
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Não faz muito tempo, maridos traídos sentiam-se no direito de “lavar sua dignidade ferida” com o sangue da esposa infiel.

E conseguiam até se safar de responder pelo crime alegando a infame “legítima defesa da honra”, resquícios de uma tradição machista e patriarcal que concedia ao homem poder de vida e morte em relação à sua mulher.

Felizmente, os tempos mudaram. Hoje, a esposa infiel não paga mais com a vida. Em vez disso, paga com dinheiro – o que, convenhamos, é muito mais civilizado e racional.

Recentes decisões judiciais parecem reforçar essa nova tendência. No Rio de Janeiro, uma mulher foi condenada a pagar ao ex-marido, de quem já estava separada há 17 anos, uma indenização por danos morais no valor de R$ 200 mil.

Motivo: durante o período em que permaneceu casada, ela não apenas o traiu como também teve dois filhos com outro homem, atribuindo a paternidade ao cônjuge.

Em outra decisão, dessa vez em Minas Gerais, uma auxiliar de escritório teve de pagar R$ 15 mil ao ex-marido pelo mesmo motivo. A filha que o marido acreditava ser dele era, na verdade, fruto de um relacionamento extraconjugal.

Antes disso, um taxista carioca também havia ganhado na justiça o direito de ser indenizado pela esposa infiel, embora, nesse caso, não houvessem filhos envolvidos.

Há algumas coisas importantes a esclarecer em relação a essas decisões. A primeira é o que vem a ser exatamente a indenização por danos morais. Diz a Constituição em seu artigo 5º, inciso X, que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

O adultério, que antes era crime – inclusive sujeito à prisão – hoje não é mais. No entanto, dependendo do entendimento do juiz, ele pode ser visto como uma ofensa à honra e à imagem da pessoa, sendo, portanto, passível de indenização.

O valor é difícil de ser estabelecido, uma vez que o dano moral é subjetivo. Como se coloca um preço na dor, no sofrimento e na humilhação sofridos por alguém? A rigor, isso não tem preço.

A indenização seria apenas uma forma de oferecer algum tipo de compensação ao sofrimento emocional do ofendido e de penalizar o ofensor.

Para evitar extremos, como a fixação de uma quantia absurdamente alta ou ridiculamente irrisória, o bom senso manda que o valor da indenização por danos morais seja calculado com base nas possibilidades do ofensor e nas necessidades do ofendido. 

Há quem diga que essas indenizações são uma forma de mercantilizar a sociedade conjugal, de transformar o casamento num contrato comercial. Porém, é preciso lembrar que o casamento é, de fato, um contrato.

Ao dar o “sim”, você está se comprometendo a honrar compromisso afetivos, como a fidelidade conjugal, e também compromissos materiais, como os encargos financeiros necessários à manutenção da família. Como se sabe, todo o rompimento de contrato traz suas consequências. 

Por fim, gostaria de observar que, até agora, temos visto apenas homens ingressando com ações contra suas ex-mulheres. Não teria a mulher o direito de exigir indenização do esposo infiel, em especial se a infidelidade resultou em filhos nascidos fora do casamento?

Se o sofrimento emocional do homem traído é passível de indenização, por que não o da mulher traída? No dia em que os resultados dessas ações começarem a ser divulgados é que veremos até que ponto a igualdade entre os sexos, determinada por nossa Constituição, é respeitada nesse país. 

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