Saiba como a tecnologia pode destravar a burocracia oficial
Diálogo entre sistemas informatizados é um dos caminhos da eficiência, diz Eduardo Mário Dias, professor da USP, em palestra na ACSP
Coexistem ao mesmo tempo, na área pública da saúde, 796 sistemas eletrônicos de informação. Mas eles não dialogam uns com os outros, o que representa uma indescritível dor de cabeça para controlar ou dividir estoques de medicamentos, compartilhar prontuários e comprar material.
O exemplo dessa espécie de arca de Noé na administração brasileira foi mencionado, em palestra nesta quarta-feira (23/5), por Eduardo Mário Dias, professor titular da Escola Politécnica da USP e há 43 anos especialista em questões de automação.
Ele foi o convidado do Conselho de Economia da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), que tem como coordenador o economista Roberto Macedo.
O tema de Dias foi “Automação e sociedade – quarta Revolução Industrial (indústria 4.0): um olhar para o Brasil".
Com relação ao controle de medicamentos, ele disse que apenas uma integração dos sistemas de informação poderia diferenciar, no país inteiro, o faturamento de produtos comprados de laboratórios daqueles que são falsificados.
Estima-se que são utilizados, anualmente, R$ 2 bilhões em medicamentos falsificados – adquiridos por meios ilícitos e que provocam sérios problemas de saúde.
A mesma anomalia atinge o comércio das próteses, afirmou Dias.
Uma integração de sistemas também permitiria a troca de informações técnicas para evitar, como ocorre hoje, que 30% das vacinas, em lugar de serem aplicadas, acabem se perdendo por não terem sido estocadas na adequada temperatura.
EXPORTAÇÃO DE CARNE E SOJA
O pesquisador relatou um dos projetos em que trabalhou e que desburocratizou e agilizou a exportação de produtos animais.
O mecanismo é de assustadora simplicidade. Ao ser despachado na origem, o contêiner com a carne congelada recebe na porta um lacre que o acompanha por todo o transporte.
Dentro desse lacre há um chip com informações completas sobre origem, destino, preço, guias alfandegárias e informações para a Receita Federal.
Ao pegar a estrada em direção ao Porto de Santos – onde a experiência já começou – o chip é lido e suas informações são transmitidas para o cais em que se dará o embarque.
Ao chegar no porto, basta uma nova leitura do chip para que o motorista descarregue seu contêiner. Economizam-se toneladas de papéis com guias impressas e ainda se ganham no mínimo 48 horas entre o transporte e o desembarque.
Esse mecanismo foi encomendado em 2009 pelo Ministério da Agricultura, mas só agora foi implementado.
Pela economia que proporciona, o sistema teve um custo absurdamente baixo. Apenas R$ 2,5 milhões.
Antes disso, afirma Dias, o governo havia gasto R$ 500 milhões, em sistemas que não funcionaram ou funcionaram mal.
O segredo não está propriamente no aproveitamento de tecnologia já existente, mas sobretudo no abandono da ideia segundo a qual os sistemas importados são mais eficientes que os produzidos no Brasil.
NOTA FISCAL ELETRÔNICA
Um exemplo engenhoso de soluções em que a tecnologia permite aumentar a arrecadação de tributos com o mesmo volume de faturamento foi dado pela nota fiscal eletrônica, disse o professor da Poli.
Com os caixas integrados a um único sistema, a emissão da nota no momento em que os produtos são comprados pelo cliente final significa 100% de sucesso no combate à sonegação, num mecanismo que também permite ao varejista controlar, em tempo real, seus estoques e faturamento das vendas.
A ideia partiu da Secretaria da Fazenda durante o governo José Serra, e a USP a executou, a um custo ridículo se comparado aos benefícios produzidos. O projeto saiu por UR$ 1,8 milhão.
O Ceará já adotou a mesma ideia, e Minas Gerais está a caminho de fazer o mesmo.
Outra experiência, encomendada pela Prefeitura de São Paulo pela gestão Kassab, procurou integrar as informações da CET e da Transurb.
A ideia não teve prosseguimento. Mas com o monitoramento de ônibus e veículos, acoplado ao tempo de abertura dos semáforos, o objetivo era economizar em 20% o tempo necessário aos trajetos urbanos.
Existe, nesse campo, disse Dias, um campo de experiências quase ilimitado. Citou, por exemplo, a criação de um waze público e do monitoramento dos celulares transportados dentro dos veículos para mapear preferências de trajetos e tentar desimpedi-los.
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