Por que essa baixa excitação política dos brasileiros?

Partidos não mobilizam, segundo a pesquisa Ibope/CNI. Em 2015, Dilma tinha uma avaliação tão baixa quando hoje a de Temer. Mas o impeachment gerava paixões

João Batista Natali
14/Mar/2018
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Por que essa baixa excitação política dos brasileiros?

A política deixou de excitar os brasileiros. Não é ainda um desencanto definitivo, mas alguns indicadores demonstram que a vida dos cidadãos anda mais para apática.

Um primeiro indicador. Michel Temer, segundo o Datafolha, é hoje visto como ruim ou péssimo por 70% dos brasileiros. Em agosto de 2015, a então presidente Dilma Rousseff experimentava uma taxa pouca coisa maior (71%).

Mas naquele momento a paixão pela política permanecia muitíssimo acesa.

Tanto que 66% eram favoráveis ao afastamento de Dilma, e os partidários e adversários do impeachment faziam manifestações de rua e empanturravam de amor e ódio as redes sociais.

Temer deixará naturalmente o Planalto em 1º de janeiro de 2019, e a sucessão dele será decidida no próximo mês de outubro.

Mas a temperatura eleitoral anda muitíssimo baixa. Mesmo dentro do Partido dos Trabalhadores, onde o filamento de mercúrio sempre indica maiores temperaturas, o clima é de desmobilização.

Pesquisa do Ibope, encomendada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), coloca o PT como o partido que evoca maiores simpatias. Mas são apenas 19%, ou menos de um quinto do eleitorado.

Foi ainda do Ibope o melhor índice de intenção de voto para Lula. Aconteceu em outubro do ano passado. Ele estava com razoáveis 35%.

Mas vejamos o que ocorreu depois disso. Em 24 de janeiro, quando os desembargadores da Justiça Federal de Porto Alegre ampliaram a pena de prisão do ex-presidente, foram pífias as manifestações de apoio a ele, na capital gaúcha e em São Paulo.

Em outras palavras, os petistas não demonstravam a mesma excitação que registraram em maio de 2016 para a defesa do mandato de Dilma (e na época os partidários do impeachment saíram às ruas bem mais numerosos).

O BOLSÃO DE BOLSONARO

Existe hoje uma paixão explícita – a favor e contra – no campo da extrema direita, cujo candidato presidencial é o deputado Jair Bolsonaro (RJ-PSL).

Pelo Datafolha, ele teria no primeiro turno de 7 de outubro no mínimo 13% e no máximo 20% das intenções (a taxa mais alta é sem a candidatura de Lula).

Mas a paixão que Bolsonaro inspira tem um conteúdo curioso.

Seus partidários se mobilizam para difundir uma imagem rósea do regime militar (1964-1985) ou defenderem o rearmamento da população como forma de combate à criminalidade.

No entanto, os que mais mencionam Bolsonaro são os simpatizantes do PT, que desde 2016, quando Lula ainda poderia se candidatar, sonhavam com um segundo turno entre o deputado do Rio de Janeiro e o ex-presidente.

Seria uma “barbada” para o então candidato petista, que venceria com facilidade o capitão da reserva do Exército.

Mas o atual Bolsonaro e o antigo petismo cultivam, juntos, um núcleo reduzido de paixões que não se alastra para o resto da sociedade, onde a tônica continua a ser a apatia.

A PALIDEZ DOS PARTIDOS POLÍTICOS

Tomemos novamente a pesquisa Ibope/CNI. Depois do PT, os partidos com as maiores preferências são o PMDB, com 7%, o PSDB, com 6%, e o Psol, com 2%.

A soma dos quatro partidos corresponde a 34%. Ou praticamente um terço dos brasileiros.

Para os demais, ou prevalece a fragmentação entre as outras siglas, que não são citadas, cada uma, por não mais que 1% dos entrevistados. Ou então há o pelotão de 48% dos que não têm nenhuma preferência partidária.

Essa informação é significativa. A pesquisa mostrou aos entrevistados 16 opções de partidos políticos (deixou de lado os 19 menos importantes, de um universo de 35 partidos registrados na Justiça Eleitoral).

Teoricamente, com 16 opções, cada um poderia encontrar seu canto para qualifica-lo sentimentalmente como sendo o seu.

Mas o fato é que os partidos não têm bandeiras – ou se diluem em estereótipos (mais saúde, mais educação, mais segurança, maior visibilidade à mulher) que acabam por fazer com que eles se confundam uns com os outros.

É bem verdade que política não se confunde com partidos. Os bolsonaristas provavelmente não sabem que ele deixou o PSC para se filiar ao PSL (duas siglas minúsculas). Mas, mesmo assim, sentem afinidades por Jair Bolsonaro.

O fato é que o horizonte político brasileiro não tem hoje personagens que flutuem acima do chão em que os partidos estão fincados. Isso ocorreu no passado com Getúlio Vargas ou com Jânio Quadros.

Outros personagens eram bem maiores que os partidos que representavam, como Carlos Lacerda (UDN), Adhemar de Barros (PSP) e Ulysses Guimarães (PMDB).

Mas não há hoje, no campo de visibilidade do eleitor, um Getúlio, um Lacerda ou um Ulysses. A redemocratização pós-1985 foi de certo modo autofágica. Ela engoliu Fernando Collor e aos poucos também foi engolindo Lula.

A DEMOCRACIA DO POSSÍVEL

Uma observação importante. Democracia não é sinônimo de eleitorado apaixonado.

A política pode acontecer em baixa temperatura, como são hoje mais ou menos os casos do Chile, da Itália, da Dinamarca ou de Portugal.

Mas não é esse o perfil da política brasileira, e nada indica que a pouca excitação seja o prenúncio de formas menos agressivas e mais civilizadas de disputa do poder.

Por fim, existe a política como descrédito nas instituições. A tese segundo a qual a queda de Dilma foi um “golpe” supõe a existência de uma ruptura a partir da qual nenhum dos protagonistas do “golpe” podem ser respeitados.

É um jeito malandro de dar nome às coisas, mas cuja prática e repetição ao infinito acaba – a exemplo do cachimbo – entortando a boca dos que o fumam.

E chegamos então onde hoje estamos. Um tanto perdidos e desestimulados quando se trata de discutir as coisas públicas.

FOTO: Thinkstock

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