Netnografia: uma nova forma de analisar o consumidor
O método que mistura etnografia e internet está ajudando empresas a lançar produtos, construir campanhas de marketing e alinhar o posicionamento de marca
Em 1995, quando a internet ainda estava engatinhando no Brasil, o canadense Robert Kozinets começou a formular um método para utilizar o mundo online que fizesse realizar pesquisas etnográficas.
Para quem não está familiarizado com o tema, etnografia é o trabalho de campo realizado pelos antropólogos.
Pode ser definido como um contato prolongado com entre o pesquisador e o grupo social, com a finalidade de coletar de dados.
O exemplo mais clássico são os especialistas que passam meses, por vezes anos, morando com tribos indígenas para entender seus costumes, tradições e hábitos.
Mas não são apenas povos afastados das grandes civilizações que podem ser estudados dessa forma. As tribos urbanas também são alvo de estudos etnográficos.
Kozinets percebeu que as conversas nos fóruns, blogs e redes sociais eram riquíssimas em informações.
Como foco nesse potencial, foi possível coletar dados e entender como os grupos se comportavam. Ele, então, cunhou o termo netnografia, que une as palavras etnografia com internet.
Em vez de sentar em uma tribo e fazer anotações, esse método consiste em observar os comentários e interações dos internautas, coletar dados, perceber comportamentos e analisar as informações.
MAS O QUE ISSO TEM HAVER COM OS NEGÓCIOS?
Esse método foi amplamente divulgado e aplicado no mundo acadêmico. Mas também pode ser utilizado para empresas conhecerem mais sobre seu público-alvo e entenderem mudanças sociais que podem afetar seus negócios.
É uma nova forma de fazer pesquisas para uma nova geração, que interage socialmente mais pela internet do que pelo mundo físico.
A netnografia, como diz Bernardo Fernandez, presidente das associações das agências digitais do Distrito Federal e fundador da consultoria Folks Netnografia não consiste na criação de enquetes na internet para saber o que os consumidores querem. É um processo de observação de conversas e interações.
A pesquisa é qualitativa, de acordo com Débora Figueiredo, PHD em Netnografia e sócia da Folks Netnografia. Após a coleta de dados detalhada, é gerado um relatório minucioso sobre um público específico.
A Folks Netnografia é uma das pioneiras no Brasil nessa forma de pesquisa. Para montar a empresa, eles tiveram consultoria do próprio Kozinets.
A empresa já realizou trabalhos para a Coca-Cola, Johnson’s Baby e Avon. Os estudos feitos para essas marcas ajudaram a lançar novos produtos, construir campanhas de marketing e alinhar o posicionamento da marca.
Um dos trabalhos realizados pela Folks foi para o Sindicato das Mantenedoras de Instituições de Ensino Superior do Estado de São Paulo (Semesp).
A entidade queria entender por que os cursos que formam tecnólogos (graduação de nível superior de curta duração) têm baixa procura no Brasil.
Uma realidade que difere dos países da Europa, em que essas formações são bastante requisitadas.
Para essa análise a empresa uniu os recursos da netnografia e os do Big Data, para entender o comportamento de quatro milhões de interessados em bacharelado e de 110 mil interessados em cursos tecnólogos.
Um das conclusões foi que grande parte dos estudantes estava satisfeita com o curso, mas 67% não indicariam para os amigos.
As razões disso eram a falta de trabalho na área e de reconhecimento social, uma vez que eles são considerados subgraduados.
Após essa pesquisa, a Semesp submeterá modificações nestes cursos a o Ministério da Educação.
Fernandez acredita que a pesquisa pode mudar a forma como as empresas e instituições entendem seus negócios.
Para as empresas do varejo, a netnografia pode ajudar a conhecer melhor quem são os consumidores, seus padrões de compras e quais são os produtos ele estão à procura.
De acordo com Fernandez, esse método é mais eficaz do que as tradicionais pesquisas focus group (método de discussões em grupo utilizadas por empresas de marketing).
Uma vez que nas conversas com amigos nas redes ou em comentários de blog as pessoas tendem a emitir sua opinião de forma mais aberta e sincera.
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