“Nenhuma pesquisa fundamenta a Reforma Tributária”
Durante evento na ACSP, Everardo Maciel afirma que as atuais propostas partem de erros de concepção e critica ao aumento da carga tributária - especialmente para o setor de serviços
Defensor da ideia de que todo sistema tributário é uma fábrica de problemas, Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal e consultor tributário, argumenta que não há fórmula mágica para a resolução dos problemas dessa natureza em nenhum lugar do mundo. Além disso, ele aponta que a reforma atual se baseia no discurso e que não há pesquisas que a fundamentem.
Nesta quinta-feira (10/10), Maciel se reuniu com representantes do setor de serviços na sede da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) para discutir as propostas da Reforma Tributária em tramitação no Congresso Nacional.
LEIA MAIS: Metade da população aprova criação de Imposto Único
“A questão tributária é muito preocupante e exige velocidade dos agentes econômicos no diagnóstico e solução dos problemas. A ACSP está atenta ao debate e seus impactos na vida do contribuinte”, diz Alfredo Cotait, presidente da ACSP e da Federação das Associações Comerciais do Estado (Facesp).
No auge da economia digital, empresas que prestam esse tipo de serviço arcam com impostos, como PIS e Cofins e Imposto sobre serviço (ISS), têm sido alvo de estudos e sugestões para a criação de seus próprios tributos.
Entretanto, até o momento, nenhuma das propostas em tramitação prevê alternativas específicas para o setor digital. Maciel parte desse exemplo para justificar sua tese de que a reforma tributária não trata das questões essenciais que problematizam o sistema.
LEIA MAIS: Qual é o potencial da tecnologia no sistema tributário?
O tributarista cita também a excessiva litigiosidade do país, que corresponde a R$ 3,3 trilhões – metade do Produto Interno Bruto (PIB). Há ainda, na visão dele, grandes indeterminações conceituais a serem resolvidas.
“Se o Fisco tem um entendimento, o contribuinte outro, e o judiciário, outro, os conceitos não estão bem determinados. Essa reforma parte de erros de concepção”, diz.
A CONTA DOS SERVIÇOS
Muito resistente à criação do imposto que incide sobre o consumo, o setor de serviços deve enfrentar um cenário extremo, diz Maciel. Ocorre que muitas categorias podem sair de uma tributação de, por exemplo, 2% para outra de até 25%. Um levantamento feito pelo especialista revela que, com a mudança, não haveria aumento menor que 200% para as categorias.
Como a emenda prevê uma alíquota acima de 25% para que não haja perda na arrecadação, o mesmo percentual seria aplicado a todos os bens e serviços e cobrado em todas as etapas de produção e comercialização.
De acordo com as estimativas de Maciel sobre o possível aumento na alíquota, considerando as propostas em tramitação, as escolas particulares, por exemplo, sairiam de um valor de 8,5% para 25%. Ou seja, um aumento de 211%.
“A imensa maioria desses contribuintes não faz ideia de que essa possibilidade existe. Por que não se leva essa discussão a público?”, diz.
DESCONSTRUÇÃO DA PEC 45
Na tentativa de reverter esse cenário e aproximar a população desse diálogo, a ACSP se uniu a outras entidades e federações para reunir estudos e números sobre cada setor para formular um documento único, e assim propor uma agenda de discussões e tornar o debate público, manifestando as propostas e preocupações levantadas.
Para Cotait, a eventual desoneração da folha de pagamento (com exclusão do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e das demais tributações sobre a folha) poderia amenizar eventuais impactos do imposto unificado. No entanto, isso dependerá da intensidade em que ela for adotada e de uma possível reavaliação do período proposto de dez anos para a transição entre os modelos de forma progressiva.
“Queremos desconstruir a PEC 45. Para nós, está claro que essa proposta está baseada em moldes antigos e modelos constitucionais que não contribuem para recolocar a economia brasileira nos trilhos”, diz Cotait.
A favor da redução e simplificação dos tributos, Marcel Solimeo, economista da ACSP, diz que o tamanho da alíquota preocupa, mas há outros impasses que não têm sido considerados nessa discussão. O economista cita como exemplo a falta de transparência no impacto que essas alterações teriam no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), num momento em que o índice alcançou relativo controle.
FOTO: Mariana Missiaggia