Leo Wojdyslawski, da Livraria Eiffel: ‘O Centro continua sendo um polo cultural’

Aberta há dois anos na região central de São Paulo, a livraria, especializada em obras de arquitetura e urbanismo, fica no Edifício Eiffel, ícone projetado por Oscar Niemeyer, e está a poucos metros do Instituto de Arquitetos do Brasil

Bruna Galati - DC News
29/Out/2024
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Leo Wojdyslawski, da Livraria Eiffel: ‘O Centro continua sendo um polo cultural’

A Livraria Eiffel chegou à Praça da República, no coração de São Paulo, com uma proposta cultural inovadora. Aberta há apenas dois anos, o espaço é dedicado ao universo da arquitetura e do urbanismo, situado aos pés do emblemático edifício Eiffel, projetado por Oscar Niemeyer e Carlos Lemos na década de 1950.

Sob a liderança de Leo Wojdyslawski, a livraria não apenas oferece uma seleção cuidadosa de livros, mas também se transforma em um ponto de encontro para debates e discussões sobre arquitetura, refletindo a paixão do proprietário pelo tema e sua visão empreendedora.

“Meu acervo inclui livros de arquitetura importados, nacionais e até de segunda mão. Dessa forma, minha abordagem se diferencia de grandes livrarias generalistas”, disse o fundador à DC NEWS. A seguir, sua entrevista.

 

DC NEWS – Como surgiu a ideia de abrir a livraria voltada para arquitetura?

Leo Wojdyslawski – Quase por acaso. Estava em um momento de transição de carreira. Eu me tornei advogado e atuei nesse campo por cerca de 25 anos. Mas a ideia de abrir a livraria surgiu de uma situação inesperada. Estava saindo do meu escritório de advocacia, onde era sócio, e ao caminhar pela Praça da República vi o imóvel – que antes era uma confecção – perfeito para uma livraria de arquitetura.

 

DCN – Por que perfeito?

Wojdyslawski – O imóvel fica no Edifício Eiffel, ícone projetado por Oscar Niemeyer. Está a poucos metros do Instituto de Arquitetos do Brasil e próximo a faculdades de arquitetura. Além disso, morei no prédio, o que torna a história ainda mais significativa. Com a antiga livraria de arquitetura da região fechada, percebi que havia uma lacuna a ser preenchida.

 

DCN – E você tinha alguma afinidade com o universo da arquitetura?

Wojdyslawski – Sim. Sempre tive paixão pela arquitetura. E essa conexão também vem do meu falecido pai, que era arquiteto. Cresci rodeado de desenhos e plantas dele, mesmo sem tê-lo conhecido, e isso alimentou meu amor pela área. Antes de me tornar advogado, cheguei a estudar na FAU [Faculdade de Arquitetura e Urbanismo], na USP, e muitos dos meus professores eram amigos do meu pai. O desejo de abrir a livraria foi um desdobramento natural da minha vida e da minha conexão com a arquitetura.

 

DCN – E experiência com comércio?

Wojdyslawski – Não. Então fui atrás de conhecimento. Conversei com muitas pessoas e fiz um curso online para me preparar. Após quase um ano de planejamento, consegui inaugurar o espaço.

 

DCN – Como foi morar e agora empreender no Centro de São Paulo?

Wojdyslawski – Morei no Centro por cerca de 15 anos e tive uma experiência bastante rica. O Centro é uma mistura de agitação e tranquilidade; há sempre algo acontecendo, mas ao mesmo tempo, existem cantos mais calmos. Porém, nos últimos anos, enfrentei alguns desafios, especialmente em relação à segurança e à limpeza. Em determinados períodos, a situação estava tão precária que cheguei a considerar fechar a livraria. A presença de moradores em situação de rua e a falta de infraestrutura eram preocupantes.

 

DCN – Então, ter um comércio no Centro é desafiador?

Wojdyslawski – No ano passado, por exemplo, o Centro estava em um estado deplorável. A sensação de abandono era palpável, e a prefeitura parecia ter deixado a região de lado. As ruas estavam sujas, com uma quantidade alarmante de pessoas em situação de vulnerabilidade, e a falta de infraestrutura básica, como banheiros públicos, era evidente. Em um momento, cheguei a questionar se valeria a pena manter a livraria, dado o cenário desolador que eu via. Além disso, a crescente violência e os relatos de roubos na região, como os ataques das gangues de bicicleta, fizeram com que muitos evitassem o Centro.

 

DCN – Algo mudou?

Wojdyslawski – Durante alguns meses, as vendas despencaram, e a incerteza quanto ao futuro da livraria aumentou. No entanto, mesmo diante dessas dificuldades, percebo que o Centro tem potencial para se recuperar, e aos poucos estamos vendo uma mudança positiva. Por enquanto, continuamos buscando alternativas, como o aumento das vendas online pela rede social.

 

DCN – Você cogita deixar a região?

Wojdyslawski – A localização no Centro de São Paulo é estratégica para nós. Temos um fluxo constante de estudantes e profissionais da área de arquitetura, além de estarmos próximos a instituições relevantes. O Centro, apesar dos desafios, continua sendo um polo cultural e acadêmico. Acredito que a livraria deve estar aqui, onde a arquitetura e o design se encontram com a história da cidade.

 

DCN – O que aconteceu no mercado de livrarias nos últimos cinco anos?

Wojdyslawski – Tenho notado um aumento significativo no número de novas livrarias independentes, especialmente no Centro. Essa mudança se deve, em boa parte, ao fechamento de grandes grupos de varejo, como a Livraria Cultura, a Siciliano e a Saraiva. Essas falências criaram um espaço importante para livrarias independentes. Com a saída desses nomes do mercado, muitos leitores passaram a buscar opções mais especializadas. Pequenas livrarias oferecem atendimento mais personalizado e curadoria diferenciada.

 

DCN – Como você busca se destacar no mercado?

Wojdyslawski – Minha estratégia é bastante distinta das outras livrarias. Enquanto a Gato Sem Rabo, por exemplo, foca em um ativismo específico ao vender apenas obras de autoras mulheres, eu opto por um nicho de mercado diferente. A minha livraria é voltada exclusivamente para a arquitetura e áreas relacionadas, o que não se trata apenas de um artifício de marketing, mas de uma escolha consciente. Não pretendo oferecer todos os livros disponíveis; meu foco é realmente o nicho da arquitetura. Quando alguém pensa em literatura sobre arquitetura, a minha livraria é referência.

 

DCN – E a concorrência?

Wojdyslawski – Embora exista concorrência, como a Amazon, meu acervo inclui títulos que ela não oferece, como livros de arquitetura importados, nacionais e até de segunda mão. Dessa forma, minha abordagem se diferencia de grandes livrarias generalistas, que costumam abarcar uma gama muito mais ampla de gêneros.

 

DCN – Vocês possuem livros de sebo. Como funciona essa curadoria?

Wojdyslawski – Notei que no exterior, como França e Estados Unidos, é muito comum encontrar livrarias que oferecem tanto livros novos quanto usados. Essa é uma prática bem diferente da que temos aqui. No Brasil, a maioria das livrarias opera com um modelo de consignação, em que as editoras deixam os livros e a livraria não precisa pagar até que os títulos sejam vendidos. Isso facilita bastante, pois não requer investimento inicial grande. Porém, quando falamos de livros importados ou usados, a dinâmica muda: eu preciso comprar os livros antecipadamente, o que significa que corro o risco de não vendê-los.

 

DCN – Nesse caso, qual sua estratégia?

Wojdyslawski – É essencial ser muito criterioso na hora de adquirir tanto os livros importados quanto os usados. Atualmente, temos cerca de 6 mil títulos em nosso portfólio.

 

DCN – A livraria foi inaugurada oferecendo o livro Brazil Builds no acervo. Ele foi publicado pelo Museu de Arte Moderna de Nova York, em 1943, e é difícil de encontrar. Como foi a venda desse livro? 

Wojdyslawski – A história por trás desse livro é interessante. Ele foi lançado em 1943 e 80 anos depois, em 2023, uma nova edição foi lançada durante uma exposição sobre arquitetura brasileira em Nova York. Eu inicialmente pensei que, com a nova edição disponível, o interesse pelo exemplar antigo fosse diminuir. Porém, para minha surpresa, as pessoas começaram a perguntar pelo livro original, e acabei vendendo todos os exemplares que tinha muito mais rapidamente do que eu esperava.

 

DCN – Por quanto?

Wojdyslawski – Cobrei R$ 2,5 mil por livro.

 

DCN – O que você acredita que os leitores buscam nas livrarias físicas?

Wojdyslawski – Buscam uma experiência de imersão em temas que os interessam. Aqui na livraria, notamos que muitos visitantes estão em busca de um aprofundamento em tópicos específicos, como história da arquitetura, design contemporâneo ou urbanismo. Isso revela uma sede de conhecimento que vai além do simples ato de comprar um livro. A interação com o ambiente, a possibilidade de folhear e descobrir novos títulos também são aspectos que atraem o público.

 

DCN – Como as livrarias independentes podem ajudar a melhorar os índices de leitura no Brasil?

Wojdyslawski – O papel da promoção da leitura no Brasil não é das livrarias, mas sim do governo, que precisa melhorar a educação. O que podemos fazer como livrarias é oferecer bons livros para aqueles que estão interessados, mas é preciso reconhecer que muitas vezes as livrarias operam em uma bolha. Livros como Brazil Builds são excepcionais, mas apenas uma pequena parte da população pode pagar [R$ 2,5 mil] por eles. O preço médio de um livro hoje gira em torno de R$ 70, o que já não é barato.

 

DCN – Uma barreira econômica?

Wojdyslawski – Muitas pessoas não compram esses livros não por falta de dinheiro, mas pela falta de cultura de leitura, que começa na escola. Nossa educação é deficiente, e isso impacta diretamente no hábito de leitura. Além disso, há um problema geracional: muitos jovens não têm o hábito de manusear livros físicos, acostumando-se apenas às telas dos celulares. Quando recebemos estudantes aqui, muitas vezes notamos que eles não têm nem familiaridade com a busca por um livro. É uma situação desafiadora, e embora existam exceções, é preocupante que a maioria esteja se afastando da leitura.

 

DCN – Quais são suas expectativas para o futuro da livraria e do mercado?

Wojdyslawski – O mercado de livros é altamente imprevisível. Mas nossas expectativas são positivas. Estamos planejando abrir um site para expandir a presença online e facilitar o acesso aos nossos livros. Em relação ao mercado, acredito que algumas livrarias independentes enfrentarão dificuldades. No entanto, aquelas que mantêm uma identidade forte e uma curadoria eficaz têm boas chances de prosperar.

 

LIVRARIA EIFFEL

Endereço: Praça da República, 183, Sao Paulo (SP)

Horário: Segunda a sábado, das 11h às 19h.

Instagram: https://www.instagram.com/livrariaeiffel/reels/

 

IMAGEM: Arthur Duarte

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