Empresários refazem projeções após frustração com retomada econômica
Apesar dos avanços na vacinação e a reabertura das atividades, inflação, juros e desemprego elevados frustraram as expectativas de participantes do Comitê de Conjuntura da ACSP
A expectativa era de uma recuperação mais forte da economia com o avanço da vacinação e a reabertura total das atividades. Mas o cenário que se desenha para 2022, ano eleitoral, se mostra complexo e cheio de incertezas. Essa é a percepção dos empresários e economistas presentes à reunião de Avaliação de Conjuntura da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), realizada na última quinta-feira (25/11).
No caso do varejo, há desaceleração nas projeções de crescimento já em 2021, de 5% para 3,8%, por conta do aumento da inflação e o encarecimento do crédito. O que impede uma queda maior, segundo economistas presentes à reunião, é o aumento da ocupação formal e informal e os índices de confiança do consumidor que, em clima de fim de ano, mostram melhora quanto às expectativas futuras.
A pedido da ACSP, os nomes dos participantes dessa reunião não são divulgados.
O recorte por segmentação dá uma ideia dessa desaceleração das vendas do comércio e da economia como um todo. Um empresário do varejo de material de construção disse que, além da falta de produtos, a alta nos preços afastou o "consumidor-formiguinha", que destinava parte do orçamento para reformas e pequenos reparos. Segundo ele, o comércio perdeu um pouco, pois era um consumo significativo e de compras constantes.
Apesar da retomada do setor de turismo, um empresário do setor bancário destacou que, a princípio, ela não representa aumento das receitas, mas sim a demanda reprimida de pessoas que compraram pacotes, não conseguiram viajar na pandemia, e estão fazendo isso antes que o prazo de validade expire.
Na construção civil, lembrou, praticamente não há obras públicas em andamento, e no setor imobiliário há uma devolução grande de unidades vendidas em tempos de inflação estacionária. Agora, com prestações proibitivas, esses mutuários optam por devolver, "causando problemas para o setor financeiro", disse.
Nessa toada, destacou a elevação da inadimplência - o que faz os bancos aumentarem as provisões para devedores duvidosos neste final de ano, já que as expectativas com o 13º não devem se concretizar.
Com a antecipação das parcelas para aposentados e pensionistas do INSS, segundo o empresário do setor bancário, não haverá recursos nessa época, e evidentemente esse quadro preocupa o conjunto da economia.
Além do repasse para os salários, o representante dos bancos apontou que a inflação também já atingiu serviços como mensalidades escolares, "prenunciando um mês de janeiro bastante nebuloso."
CAMINHANDO DE LADO
Um ambiente de falta de previsibilidade, devido à falta de produtos e matérias-primas, aumento nos preços e nos juros, além do alto nível de desemprego e renda corroída dão uma ideia do cenário para final de 2021 e início de 2022.
Na indústria de transformação, a situação continua bastante desfavorável, e com queda na margem de produção em setembro em níveis abaixo de 2020 e 2019, destacou um representante do setor.
Nos últimos quatro meses, o setor registra queda de 2,6%. Em relação a setembro de 2020, o recuo foi de 3,9%. A única notícia que dá algum alento aos fabricantes é a ligeira melhora na oferta mundial de componentes.
Mesmo assim, olhando para a frente, não há expectativa positiva no curto prazo. Em sua avaliação, a indústria caminha de lado, com ligeira tendência de queda e pressões para o ano que vem - como o preço da energia, que, pelas projeções da Enel, corroboradas pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), deve subir de 20% a 25%
Uma representante da indústria de eletroeletrônicos lembrou que, no momento, não há uma dificuldade das empresas do segmento em encontrar componentes, mas sim em absorver a elevação dos preços.
Porém, ela reforçou que este é um problema com o qual será preciso conviver nem 2022 e, junto aos gargalos logísticos, preço do frete e dificuldades na reserva de contêineres, prejudicam a previsão para o próximo ano.
Há 15 meses a confiança do segmento está acima dos 50 pontos, mas ela vem caindo a cada mês, principalmente de setembro para cá. "A falta de previsibilidade e a incerteza política sinalizam um cenário desafiador", disse.
E O PIB?
Dentro desse cenário, as opiniões divergiram quanto ao crescimento da economia. Um dos economistas presentes à reunião destacou uma certa estagnação, e que em 2021 o PIB deve fechar em 4,6% sobre a base fraca de 2020.
A desaceleração deve ser maior no ano que vem, de acordo com indicadores de confiança empresarial e, ainda que Itaú já preveja queda em 2022, até o momento a previsão é de crescimento fraco, de 0,4%, 0,5%, disse.
Há quem acredite em recuperação a partir de 2023, tendo como pressuposto a efetivação das reformas, afirmou um economista da área acadêmica que também avaliou a conjuntura. Porém, em sua percepção, isso não tem garantia nenhuma de que vai acontecer, já que o cenário eleitoral aponta para dois extremos. "Alguns preveem redução de atividade, mas o crescimento em 2022 será pífio, próximo de zero."
Outro economista presente à reunião da ACSP, por sua vez, foi mais taxativo. Ele acredita que o PIB do 3º trimestre, a ser anunciado pelo IBGE na próxima semana, já deve registrar uma recessão técnica, e destacou previsões da FGV e do Monitor do PIB, que preveem subida de 0,1 e queda de 0,1 do indicador, respectivamente.
"Há um problema sério, que remonta a 1980. A economia cresce abaixo do seu potencial e está em depressão desde 2014", disse.
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