ACSP 130 anos - Amato: 'Somos jovens o suficiente para sempre pensar no futuro'

Para o ex-presidente da ACSP, que coordena o Conselho Superior da entidade, mudança geracional é oportunidade de transformação e voto distrital será a nova bandeira

Vitor Nuzzi - DC News
06/Dez/2024
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ACSP 130 anos - Amato: 'Somos jovens o suficiente para sempre pensar no futuro'

Gestão empresarial, liberalismo econômico e Centro de São Paulo formam a base do pensamento e da vivência de Rogério Pinto Coelho Amato, 76 anos, atual presidente do Conselho Superior da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) e ex-presidente da entidade por dois mandatos, de 2011 a 2015. Seu escritório fica a poucos metros da ACSP – e o vínculo com a região vem de pequeno, desde os tempos de estudante do Colégio São Bento. A família tem DNA de empreendedorismo: seu pai foi o empresário Mario Amato (1918-2016), que comandou a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI). “Era um agregador”, disse Rogério Amato nesta entrevista sobre os 130 anos da Associação Comercial, a serem completados no sábado (7).

Amato entrou na entidade pelas mãos de Guilherme Afif Domingos, “no primeiro mandato dele”, e participou de várias outras entidades, como Eletros, Abinee e Abia, além de ter sido secretário estadual de Assistência e Desenvolvimento Social, entre 2006 e 2009. Ele lembra que a ACSP historicamente participa dos movimentos que exigem urgência. E igualmente se preocupa em pensar no futuro, pensar adiante, em São Paulo e no Brasil. “Isso sempre permeou nossas lideranças. Sou fruto dessa escola.” Caso do Simples, por exemplo, uma bandeira do empreendedorismo que se tornou referência e modelo empresarial. Agora, Amato afirma que a luta pelo voto distrital deve ser a “próxima grande causa” da entidade. Entre outras transformações que ele considera necessárias em um país “disfuncional”.

Nesse contexto ele enxerga o papel crucial da Associação Comercial: visão econômica e também de cidadania. O associativismo, o movimento organizado onde há uma atividade econômica. “Aprendi desde cedo que essa é a grande representação do mundo do trabalho. As grandes empresas se organizaram em sindicatos, e a nossa missão acabou sendo olhar pelo pequeno”, disse, para logo emendar: “Olhar, não. São os nossos patrões. Quem manda na Associação é a pequena empresa, a média empresa, sem tirar a necessidade de ter as grandes também”. A seguir, a entrevista de Amato.

 

AGÊNCIA DC NEWS – Nestes 130 anos, qual teria sido o grande momento histórico da ACSP?

Rogério Amato – É difícil marcar um momento, porque a Associação faz parte da história de São Paulo e do Brasil. As pessoas às vezes esquecem que a Associação Comercial durante muitos anos foi a única representação do setor mercantil. Tem gente que está chegando agora e acha que é só comércio. É um erro crasso. E nós temos obrigação de reverter essa ideia. A associação existe onde existe uma atividade econômica, seja qual for. Depois de 32…

 

…do movimento constitucionalista.

A associação foi a intendência da Revolução de 32. Era aqui que se reuniam todas as lideranças do mundo que estava emergindo ali, do mundo industrial, comercial. Foi aqui que aconteceu.

 

Houve uma consequência militar, em 32. Mas qual a consequência civil que mais impactou as empresas, a economia?

A partir dela, Getulio [Vargas] importou a Carta del Lavoro [documento da Itália de Benito Mussolini que teria inspirado a CLT brasileira]. Que melhorou muito depois da Reforma Trabalhista, de 2017, mas que está acabando agora.

 

Mas não são apenas as causas grandes…

Não. Por exemplo, aqui em São Paulo, quando tem alguma mudança no trânsito, tem uma Distrital da ACSP que vai lá e mexe no trânsito. Esse problema de segurança, tem uma área da Associação Comercial que lida com isso. Essa é a nossa rotina. É participar das coisas em que estamos inseridos. E aí é curto prazo, pode ser médio. Já esteve muito envolvida em Plano Diretor… Essas coisas são e vão ser sempre prioritárias. O dia a dia da cidade é nossa obrigação, e sempre foi, faz 130 anos.

 

Sempre estar vigilante?

Ela nasce onde há uma atividade econômica. Eu aprendi desde cedo que essa é a grande representação do mundo do trabalho. As grandes empresas se organizaram em sindicatos, e a nossa missão acabou sendo olhar pelo pequeno. Olhar, não! São os nossos patrões. Quem manda na Associação Comercial é a pequena empresa, a média empresa, sem tirar a necessidade de ter as grandes também. Mas as grandes se viram, sabem como fazer seus direitos.

 

Por isso a luta pelas pequenas e médias?

Todos os períodos aqui são desafiadores. O meu [mandato] aconteceu numa situação única, a do SCPC (Serviço Central de Proteção ao Crédito). Durante anos foi sendo elaborado. Lá atrás, pouca gente sabe, a Associação Comercial foi o local onde o varejo emergente – estavam se formando as primeiras redes, redes regionais – confiou para colocar a sua informação, até que se tornou o SCPC.

 

Sempre desafios de longa jornada…

Depois houve a desmutualização do SCPC [processo de transformação de empresa privada em empresa de capital aberto, no caso a Boa Vista Serviços], no meu mandato. Eu assumi com isso já dado. Os antecessores fizeram muito bem em fazer isso. Mas criou um trauma muito grande na entidade. Aí conseguimos atrair a Equifax para nos ajudar a trabalhar nisso [a aquisição foi concluída em 2023], e hoje a ACSP tem esse grande benefício. Nunca dependemos de ninguém para nos manter. Isso nos dá independência.

 

Uma batalha centenária, mas igualmente dia após dia?

Todos os trabalhos da Associação Comercial não são de uma só gestão. A história do Simples demorou 20 anos. O Cadastro Positivo também é fruto do trabalho de várias gerações. Nossa capacidade de entrar com ações de descumprimento de preceito fundamental (ADPFs), porque as associações não eram consideradas representantes, só os sindicatos. Por isso são projetos que ultrapassam as gestões da ACSP. Considero que temos uma obrigação moral hoje de fazer com que essa transformação seja feita.

 

Uma obrigação cidadã?

É obrigação. Temos dever de fazer isso. A nossa geração, que ainda hoje está nos Conselhos, tem a obrigação, o dever, de fazer com que isso aconteça. As entidades que sobreviveram foram aquelas que tiveram pensamento mais pra frente. Caso contrário você começa a virar uma coisa restrita, entendeu? Vira futrica. Não temos tempo, temos urgência de fazer.

 

O que torna ainda mais decisivo e estratégico o papel do Conselho Superior da entidade, que o senhor preside.

Temos um Conselho Superior, que se você analisar bem é um Conselho de Administração. Fazem parte todos os ex-presidentes e alguns indicados, em algumas circunstâncias, que prestaram serviços relevantes à entidade. Há uma série de obrigações, previstas no estatuto, como aprovar orçamento e outras. Mas estamos no momento de pensar a respeito disso. Num momento importante, de pensar uma série de definições.

 

Quais?

Não quero me antever a coisas que vão acontecer, mas o momento é importante de fazer um aggiornamento [expressão italiana para “atualização”] da entidade, em todos os sentidos. Temos de pensar seriamente em sucessão, mas não no sentido de sucessão do presidente, de um nome. Você tem de atrair as melhores pessoas possíveis. Temos Conselhos dentro da entidade, e você vê o nível das pessoas que estão lá, é nível de ex-ministro, gente do mais alto gabarito. Temos de fazer um aggiornamento para atrair uma população mais jovem que hoje está muito voltada para o resultado imediato.

 

Uma visão de longo prazo?

O problema de curto prazo, quem diz isso muito é o Guilherme [Afif], é o problema de longo prazo que não foi enfrentado.

 

E estamos, como sociedade, neste momento repetindo esse comportamento de curto prazo?

Estamos vivendo em um mundo muito imediatista, todo mundo quer resolver seu trimestre, quer resolver o seu bônus. Quem é que está pensando no Brasil? Quem está pensando em São Paulo daqui a dez anos? Esse pensamento sempre permeou as lideranças da Associação Comercial. Então, eu sou fruto dessa escola.

 

É preciso pensar o modelo de país?

A ACSP é uma fonte inesgotável de informação. Os dirigentes que estão ali são todos voluntários, e nós temos missões importantíssimas. E agora temos uma situação em que o Brasil está disfuncional. E, por estar disfuncional, estamos todos pagando uma conta muito cara.

 

Por meio dos impostos?

Não só em termos do que nos é tomado na forma de impostos, não imposto, como também na forma de desorganização social. Você tem deputados com uma verba que não presta contas para ninguém. Tem uma judicialização que é do tamanho de um PIB. E a Associação Comercial sente isso na base. Somos 2,2 mil associações em todo o Brasil. É um grupo que, quando mobilizado, quando compra uma ideia, toca pra frente. Porque não estamos aqui para lidar aqui com fulano, sicrano, oposição, situação, direita, esquerda, essa tolice toda que está nos embriagando.

 

E neste momento tem a regulamentação da Reforma Tributária e, especificamente, a defesa do Simples, não?

Isso é absolutamente necessário, indispensável, inadiável. Mas o que estou insistindo é o seguinte: a Associação Comercial sempre vai ter de resolver algum problema.

 

E qual o grande novo problema?

A necessidade de falar sobre o voto distrital. Nossa próxima grande causa. Eu quero saber em quem eu voto, o que esse cara está fazendo. E isso que é o bacana dessa história. Com 130 anos, somos jovens o suficiente para estar pensando no futuro. E temos de pensar no que se vai fazer com este país. Nós temos uma oportunidade, na minha opinião, como nunca tivemos. E o momento é extremamente apropriado.

 

Por quê?

Estamos numa mudança geracional. Temos uma mudança muito rápida. E ao mesmo tempo você tem uma população envelhecendo. A nossa missão, da Associação Comercial, é pensar nisso. Temos de lidar com a questão sobre onde o Brasil vai, o Estado vai. É uma oportunidade única, a de fazer com que a representatividade volte a existir. E eu acredito que o voto distrital pode transformar para melhor o país.

 

Daí a importância que o senhor citou de atrair outras mentes, de passar pelo aggiornamento (a atualização)?

Temos de fazer um aggiornamento para atrair uma população mais jovem que hoje está muito voltada para o resultado imediato. E eu entendo o porquê. Eles estão sendo pressionados para isso. Não estão nem tendo tempo de pensar no país.

 

Como atrair esses talentos?

Você só atrai esses talentos se você tiver talentos que o cara olhe e pense: “Eu quero estar junto dessa turma”. Sou um suspeito para falar da Associação. Eu vejo a Associação como último bastião de um pensamento liberal verdadeiro, no sentido da palavra liberal. Às vezes as pessoas confundem.

 

O conceito…

Ficou deturpado. Liberal não é contra o governo. Liberal é um cara que quer progredir, quer fazer o máximo possível, quer uma lei, uma lei igual para todos, que seja cumprida. Eu acredito nisso. É o nosso último bastião. Acho que estamos caminhando para isso, mas temos trabalho pela frente. Trabalho grande.

 

O senhor tem um DNA de gestão. O que herdou de seu pai, do pensamento ou da forma como ele lidava com a gestão?

Meu pai representou uma mudança de momento [político no Brasil], assim como outros de outras entidades. Ele tinha uma característica de falar com o entrevistador como se estivesse no clube tomando café. E era um agregador. Tinha um espírito esportivo, e ele adorava fazer aquilo. Para ele, Fiesp/Ciesp foi a consagração da vida dele, foi de uma importância total. Convivi com isso tudo o suficiente para saber que essa história que o pessoal chama de poder é uma coisa tão…

 

Ilusória?

Ilusória.

 

O que é o poder?

Poder é a capacidade de fazer coisas. Tem um amigo que diz, depois de um tempo [no poder] você não põe mais a mão na maçaneta achando que a porta abre sozinha. Na hora que não tem mais essa história você bate com a cara na porta. Quem não tiver a noção desse ridículo dá com a cara na porta. Acredito que meu pai passou bem por isso, de uma forma esportiva, e contribuiu.

 

IMAGEM: Luiz Prado/DC

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