Stephanes: Plano Nacional de Fertilizantes carece de órgão gestor
O ex-ministro da Agricultura (ao centro) esteve na ACSP para debater a dependência brasileira por fertilizantes importados
Por Ronaldo Luiz e Karina Lignelli
A garantia do abastecimento de fertilizantes no mercado interno passa, neste momento, pela ampliação do leque de fornecedores internacionais, já que o incremento da produção nacional de adubos, com base nas premissas do novo Plano Nacional de Fertilizantes, não é para agora, e sim para médio e longo prazos.
O Brasil é altamente dependente da importação de matérias-primas para fabricação de fertilizantes - sobretudo dos três principais ingredientes: potássio, fósforo e nitrogênio, o NPK. Dados da Embrapa apontam que de 2010 a 2020 a produção nacional desses insumos diminuiu 30%, enquanto a demanda aumentou 66%.
Com a pandemia, gargalos logísticos já vinham prejudicando o mercado global de adubos ao obstruírem o fluxo comercial de diversas cadeias de produção - como a dos fertilizantes. A guerra no Leste Europeu, naturalmente, agravou a situação, por conta de bloqueios marítimos locais e de sanções econômicas a dois grandes fornecedores mundiais localizados na região: Rússia e Belarus.
Do total de 85% dos fertilizantes importados pelo Brasil, a Rússia responde por 23%.
Além do risco de que não haja volume de fertilizantes disponível para o próximo ciclo de grãos, há o temor de desabastecimento mundial. A conjuntura já sinaliza alta nos preços, o que deve acarretar em uma maior pressão inflacionária, já que o aumento do custo de produção agrícola acaba, inevitavelmente, refletindo nos preços dos alimentos no atacado e varejo.
Este foi o cenário apresentado na última segunda-feira (21/03), durante reunião do Conselho do Agronegócio da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), que contou com a participação do ex-ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, e do pesquisador da Embrapa Solos, José Carlos Polidoro.
O encontro, liderado pelo coordenador do Conselho, Cesário Ramalho, também contou com a presença do deputado federal Arnaldo Jardim, membro da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
Autor da obra, lançada em 2014, intitulada “Fertilizantes – marco regulatório e diretrizes para uma política autossuficiente”, Stephanes disse que, além das inerentes questões geopolíticas, outro desafio do setor é que, em termos comerciais, há uma concentração no mercado mundial de fertilizantes, com poucas empresas multinacionais controlando produção, operação e negociações.
No que diz respeito ao estímulo à produção doméstica, o ex-ministro fez uma explanação na qual destacou que existem jazidas em território nacional, em particular de fósforo e potássio, mas que a exploração destas áreas envolve o endereçamento de questões ambientais e fundiárias.
Em relação ao Plano Nacional de Fertilizantes, Stephanes acentuou que é preciso um órgão gestor para administrar o tema, caso contrário será difícil a entrega de resultados, conforme o estipulado. Outro ponto crucial, que precisa de uma resolução, é que o produto importado tem vantagens tributárias sobre o nacional, o que inibe investimentos.
Por sua vez, Polidoro, da Embrapa, mostrou isso em números ao apontar que o consumo brasileiro de fertilizantes cresceu 450% nos últimos 20 anos, enquanto que a produção nacional caiu 30% no mesmo período.
Em sua fala, o pesquisador discorreu sobre a necessidade e ao mesmo tempo oportunidades que o momento traz para o desenvolvimento de novas tecnologias em fertilização, como bioinsumos, adubos organominerais, remineralizadores etc. "Não resolve a questão, porque não seremos autossuficientes, mas a expansão destas alternativas pode ajudar, contribuir para diminuir nossa dependência das importações", afirmou.
IMAGEM: Alan Silva