Sistema Habilita estimula entrada de pequenos negócios no comex
Pleito antigo da ACSP, Ceciex e outras entidades do comércio e indústria, que foi atendido, simplifica procedimentos da Receita Federal, reduz burocracia e facilita fluxo de mercadorias
A pandemia forçosamente gerou um aumento na atividade das micro e pequenas empresas, fazendo muitas saírem em busca de oportunidades de negócios à distância não só no Brasil, mas no resto do mundo.
Mas, desde dezembro último, ficou mais fácil a atuação de empresas brasileiras no comércio exterior - em especial as pequenas: com a Instrução Normativa 1984/20, da Receita Federal, a habilitação de declarantes de mercadorias para atuar no mercado externo passou a ser emitida de forma automática pelo sistema Habilita.
Outra mudança é a dilatação do prazo de ‘desabilitação’ automática por inatividade, que passou de seis para 12 meses. Ou seja, na prática, um pequeno negócio que exportava um container por ano, ou um pequeno produtor sazonal, deveria entrar com novo processo e pagar os custos novamente para operar.
LEIA MAIS: Confira o passo a passo para sua empresa começar a exportar
Agora, caso a ‘desabilitação’ ocorra, é possível pedir habilitação automaticamente através do sistema.
Essas alterações no sistema de comex da Receita são resultado de um pleito antigo da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), do Conselho Brasileiro das Empresas Comerciais Importadoras e Exportadoras (Ceciex) e de outras entidades do comércio e indústria para melhorar o ambiente de negócios nesse mercado.
A instituição do programa Radar, em 2002, criou procedimentos especiais de controle e investigação de operações de comércio exterior. Mas ao estabelecer modalidades e limites operacionais que dificultavam o crescimento dos negócios de comex, a medida acabou impactando especialmente as pequenas empresas.
Porém, desde idos de 2010, a ACSP, através de seu Comitê de Comércio Exterior coordenado na época por Renato Abucham, interagia de forma intensa com órgãos do governo justamente em questões relativas ao credenciamento dessas empresas para operarem como exportadoras ou importadoras.
"O Radar trouxe grande embaraço para pequenas e médias empresas: não há diferença entre comprar e vender no Brasil ou de um fornecedor de fora, os riscos operacionais são os mesmos", diz Abucham, membro do Conselho Superior da ACSP, que diz que essa é mais uma "jabuticaba brasileira, fruto da burocracia."
A alteração do prazo de validade da habilitação de 18 para seis meses, em 2019, levou até a ACSP e a Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo (Facesp) a enviarem, em agosto daquele ano, um ofício assinado por seu presidente, Alfredo Cotait Neto, ao então secretário da Receita Federal, Marcos Cintra.
Nele, as entidades solicitavam alterações às exigências que "criavam obstáculos ao livre comércio, em especial para empresas de pequeno e médio porte", e contrariavam a recém-aprovada Lei da Liberdade Econômica.
"Depois de muita luta, discussões e idas e vindas para Brasília, o governo foi amolecendo e chegamos a essa melhoria. A habilitação automática e o prazo maior são avanços, e qualquer facilitação para poder trabalhar é bem vinda", destaca Abucham.
Membro atuante dessas discussões, Rita Campagnoli, que hoje integra os Conselhos Deliberativos da ACSP e do Ceciex, destaca a complicação para os pequenos negócios diante do prazo exíguo de seis meses, antes da nova IN 1984/2020 já que, por natureza, os pequenos são receosos em interagir com o mercado externo.
Quando há demanda no mercado externo, do início à conclusão do processo de exportação, que inclui prospecção, negociação e fornecimento, vão quatro, cinco meses, explica Rita. Então, não havia sentido manter esse prazo - um limitador a mais para os pequenos se colocarem no mercado internacional.
"Mas a ACSP e o Ceciex bateram muito nessa tecla, e revertemos uma situação bastante desfavorável."
Roberto Ticoulat, vice-presidente da ACSP responsável pela área de comércio exterior, membro do Conselho do Ceciex e também participante ativo dessas discussões junto à Receita Federal, lembra que, há 20 anos, o arcabouço exigido pelo governo federal para fazer negócios no mercado externo era 'inviável'.
"Entre todas as entidades envolvidas, sempre existiu um consenso de que não há razões para dificultar a entrada de qualquer empresa que esteja regular com a Receita no comércio exterior", afirma.
Portanto, o atendimento a esse pleito antigo, que é um trabalho conjunto da ACSP, do Ceciex e das demais entidades, merece destaque, reforça Ticoulat. Afinal, mesmo que o Brasil seja o 5º país em tamanho, o 6° em população, ainda é o 28° em comércio exterior, com apenas 1% de participação no comércio global.
Mas a mudança, que facilita o ambiente de negócios, sinaliza boas perspectivas. "Se as reformas avançarem, será possível ampliar de 1% para 2% em 10 anos. Imagine o crescimento de emprego, renda, tecnologia e investimento quando nos tornarmos um país realmente competitivo no comércio exterior", acredita.
FOTO: Thinkstock