Rolim, a nova casa (do terror) de Facundo Guerra no Centro de SP

O prédio de 1928 ficou décadas abandonado e foi palco de vários crimes. Agora ele será reaberto, em 31 de outubro, Dia das Bruxas, como um negócio que mistura experiências teatrais, jogos de fuga e um bar exclusivo

Mariana Missiaggia
11/Out/2024
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Rolim, a nova casa (do terror) de Facundo Guerra no Centro de SP

Abandonado por décadas, o Edifício Rolim, no número 87 da Praça da Sé, se prepara para ser reaberto no próximo dia 31 de outubro, quando se comemora o Dia das Bruxas. A data não foi escolhida por acaso. Inaugurado em 1928 e assinado pelo arquiteto Hipólito Gustavo Pujol (responsável também pelo prédio do Centro Cultural Banco do Brasil - CCBB), o Rolim ocupa o terreno de uma antiga igreja e foi palco de vários crimes ao longo do tempo. O edifício tem fama de mal-assombrado.

"Melhor impossível", diz Facundo Guerra, um dos empresários responsáveis pela recuperação do Rolim, que se transformou em uma espécie de "casa do terror" onde se pretende misturar experiências teatrais, jogos de fuga (ou escape rooms), enigmas, história e o acesso a um bar exclusivo.

Algo diferenciado na região, mas alinhado com o movimento de revitalização de prédios históricos do Centro, na tentativa de deixar essa área nobre da cidade mais atraente para o público. 

Facundo é dono de negócios icônicos que resgataram a história cultural da cidade, como o Riviera Bar, o Mirante da Nove de Julho e o Bar dos Arcos, no subsolo do Theatro Municipal

 

Figura conhecida no Centro, Facundo é dono de negócios icônicos que resgataram a história cultural da cidade, como, por exemplo, o Riviera Bar, o Mirante da Nove de Julho e o Bar dos Arcos, no subsolo do Theatro Municipal. Parceiro da Fábrica de Bares em outros negócios, Facundo foi um dos primeiros a saber quando Cairê Aoas, sócio da Fábrica, comprou o Edifício Rolim, que está bem ao lado do Caixa Cultural.

Sempre de olho na disponibilidade de construções históricas e especialista em recuperar pontos tradicionais da noite paulistana, Cairê diz ter sido atraído pelo preço de R$ 3 milhões pelo prédio todo - o mesmo que, segundo ele, se pagaria em um único apartamento na região do centro expandido.

Quem observa o Rolim de longe não deixa de notar uma espécie de farol em sua cúpula, que torna o prédio único. Na época em que foi lançado como edifício de escritórios, com comércio no térreo, se destacava em uma Praça da Sé que ainda não era tão verticalizada.

Tombado como patrimônio cultural de São Paulo desde 2015, em conjunto com outras construções do entorno do Pateo do Collegio, não há previsão, por ora, de restauro da fachada, que seguirá coberta por uma tela. "É um exemplar do Pujol, cheio de história. Não tinha como deixar passar", diz Cairê.

A recepção do Rolim recebeu papel de parede e peças de decoração inspiradas nas décadas de 1950, 1960 e 1970, inclusive com cenografia que imita animais empalhados

 

PARA OS FORTES

Mesmo sem ter algo planejado e considerando a oportunidade como única, a dupla pensou inicialmente em transformar o Rolim em um hotel, mas logo desistiram. O ponto, segundo eles, estava marcado. Tinha a questão do abandono e era muito associado à Praça da Sé, considerada perigosa naquele momento. De acordo com os sócios da nova experiência de horror, o prédio estava praticamente vazio nos pavimentos acima do térreo.

Sem outras ideias, Facundo contratou uma historiadora, Paula Febbe, para destrinchar o lugar. Assim, descobriram que ali, onde funcionou o primeiro apart-hotel de São Paulo, entre 1928 e 1950, ocorreram dois suicídios e 19 assassinatos — a maioria feminicídios.

"Pesado demais", pensou o empresário, que não demorou muito para fazer uma associação entre a história do lugar e o que era reproduzido em espaços de terror, como há na Coreia do Sul, Japão e nos Estados Unidos, onde ele visitou mais de 30 casas para se inspirar. No Brasil, o mais próximo que Facundo diz ter visto é o Abadom, em Santo Amaro, que ele já havia visitado com a filha e que chegou a ter quase dez mil pessoas na fila de espera.

A partir disso tudo, a dupla resolveu recriar uma experiência de terror, inédita para a cidade, com um apelo teatral, passando ao público a impressão de se estar dentro de um jogo por meio de uma cenografia tão especial que beira o real. A temática fez com que Cadu Dib e Rafael Bechara, ambos da Abadom - Experiências de Horror, também entrassem na gestão do negócio.

Com ingressos vendidos a partir de R$ 99 (e os primeiros deles já esgotados), a proposta é que grupos de no máximo dez pessoas disponham de 45 minutos para seguir pistas, decifrar enigmas, subir os andares e chegar a um cofre forte usado por ourives que trabalharam por lá no passado.

O percurso é todo costurado por uma narrativa e passa por mais de 20 ambientes, desde uma sala de chá com ares de abandono até um quarto invertido, com cama e demais móveis presos ao teto.

Tudo isso acontece enquanto o prédio está infestado de zumbis - são 25 atores espalhados por lá -, em cenários que reproduzem cenas de horror, com direito a cheiros, iluminação, macas vindas do IML de verdade, correntes, manequins, quadros virados ao contrário, paredes rabiscadas, móveis antigos e caixas de som por toda parte reproduzindo muitos gritos.

Quando a experiência termina, os participantes são convidados a tomar um drinque no Grito Bar, no 7º andar. O espaço também servirá pizzas. Outros pavimentos incluirão escape games (jogo imersivo de escape, em um ambiente único), um desafio (com prêmio de R$ 2,5 mil) e espaços para eventos, como festas e lançamentos (o que inclui o terraço, com vista para a Catedral e o Farol Santander).

A remodelação dos espaços manteve a estética original do prédio e teve intensificada a atmosfera de decadência, com efeitos de teto descascado, mofo e paredes quebradas. Macas originais do IML compõem o ambiente

 

REINVENTANDO PRÉDIOS ABANDONADOS 

Sem ter passado por qualquer reforma estrutural, no início deste ano, o prédio começou a ser adaptado para o projeto, segundo Facundo. A remodelação incluiu intervenções elétricas, um novo elevador, que mantém a estética do anterior, além da intensificação da atmosfera de decadência, com efeitos de teto descascado, mofo e paredes quebradas. 

Um dos primeiros pavimentos foi adaptado para ser a recepção, como se fosse uma grande sala de estar, com móveis, papel de parede e peças de decoração inspiradas nas décadas de 1950, 1960 e 1970, inclusive com cenografia que imita animais empalhados.

Dali, o público é direcionado para um cômodo decorado como se fosse um museu da história do Edifício Rolim. "A intenção nesse momento é mostrar por que o prédio precisa ser reinserido e resgatado pela comunidade", diz Facundo.

Após esse momento, o grupo de visitantes passa a ser perseguido por zumbis, dando início à fuga por seis andares. Alguns cômodos tiveram o pé-direito reduzido, para aumentar a sensação de claustrofobia e a proximidade com o cenário e os atores, embora as 90 salas dos antigos escritórios já fossem pequenas. Na cenografia, objetos e móveis foram garimpados em brechós e a decoração inclui até a reprodução de cadáveres pelo caminho.

Sem saber o que esperar e como o negócio irá repercutir, Facundo diz não existir uma receita para ter sucesso nessa missão de identificar pontos históricos abandonados da região central, reunir investidores e levantar um novo empreendimento na área de entretenimento, sempre mantendo uma ligação com os áureos tempos do lugar.

Hoje, ele também prepara a abertura do bar Formosa, em um espaço abaixo do Viaduto do Chá, também no Centro. "É muito difícil trabalhar com prédio histórico, os órgãos públicos não têm a perspectiva do empresário e os incentivos atuais são bem pouco significativos. Ainda assim, digo que o Centro não precisa de argamassa para viver, precisa de gente", disse.

 

IMAGENS: divulgação 

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