Proposta de revisão do Zoneamento de SP é encaminhada à Câmara
Necessário para operacionalizar o Plano Diretor, o Zoneamento fixa o que pode ou não ser construído na cidade, define a altura dos edifícios, os tipos de construções comerciais, entre outros pontos
Na segunda-feira (2/10), a Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL), promoveu a última audiência pública devolutiva para apresentar à população o Projeto de Lei elaborado pelo Executivo para a Revisão Parcial da Lei de Zoneamento. Agora, a proposta será encaminhada à Câmara Municipal.
Entre as ideias apresentadas, estão a inclusão de um mapa detalhado para entender onde ocorrem as mudanças das zonas eixo (quadras próximas ao transporte público que poderão receber prédios mais altos) e, também, uma trava para os apartamentos feitos para locação temporária, que se popularizaram com plataformas como Airbnb e Booking. O texto, na íntegra, está disponível para consulta no site Gestão Urbana.
A fim de discutir o tema, o Conselho de Política Urbana (CPU) e do Núcleo de Estudos Urbanos (NEU) da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) receberam os urbanistas Viviane Manzione Rubio, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, e Daniel Montandon, da Uninove. O encontro foi conduzido pelo coordenador executivo do NEU, Valter Caldana, e Alessandro Azzoni, membro do Conselho Deliberativo da ACSP e coordenador adjunto do CPU.
Complementar ao Plano Diretor, o Zoneamento fixa o que pode ou não ser construído na cidade, bem como define a altura dos edifícios, os tipos de construções comerciais, residenciais e industriais que podem existir em cada área, os locais de preservação ambiental e os níveis de emissão de barulho.
FACHADA ATIVA
A proposta traz uma mudança em relação ao conceito de fachada ativa. Pela legislação atual, a fachada ativa só pode ficar no térreo, mas o texto proposto pela Prefeitura possibilita que esse comércio fique no subsolo ou no primeiro andar, desde que haja acesso direto pelo pavimento térreo, como através de rampas que garantam acessibilidade.
"Precisamos de mais aprendizado nesse tema. Muitos negócios ainda pensam suas fachadas de forma envelopada, sem nenhum tipo de interação com a rua", diz Montandon.
Atualmente, esse tipo de empreendimento tem incentivos municipais. Por lei, os prédios que constroem fachada ativa têm benefícios financeiros: a área é considerada como “não computável”, ou seja, não é considerada no cálculo de área construída e não tem custo para as construtoras.
Além disso, o projeto retira a obrigação de empreendimentos com mais de 10 mil metros quadrados implementarem a fachada ativa nas entradas voltadas para ruas sem saída, vilas, vielas sanitárias, viadutos, passarelas e vias de pedestre.
LOCAÇÃO FLEXÍVEL
Outro ponto relevante é o que prevê reduzir os benefícios para os apartamentos feitos para locação flexível ou temporária — disponibilizados em plataformas como Airbnb e Booking —, que tiveram um crescimento expressivo na cidade nos últimos anos.
Incentivado pelo Plano Diretor de 2014 e pela Lei de Zoneamento de 2016, esse modelo recebe benefícios quando envolve prédios que misturam unidades residenciais e não residenciais. Um dos tipos de unidades não residenciais são os "serviços de hospedagem ou moradia", classificadas oficialmente como "NR1-12".
Hoje, esse tipo de unidade ganha 20% de área extra para construir, sem ter de desembolsar uma taxa extra de outorga onerosa, que é um valor que as construtoras pagam à Prefeitura para erguer seus prédios acima do limite básico oferecido para toda a cidade.
A novidade é que daqui para frente essa categoria de unidades não ganhará mais o benefício de construir uma área adicional sem taxa extra.
AMPLIAÇÃO DO EIXOS
O texto prevê a ampliação dos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana, as ZEUs - algo já previsto na revisão do Plano Diretor, mas somente a Lei de Zoneamento poderia especificar em quais locais essas áreas serão ampliadas.
Nessas áreas no entorno de estações de metrô e trem e corredores de ônibus é permitido construir até quatro vezes o tamanho do terreno, possibilitando prédios mais altos em diversos pontos da cidade, como a região de Moema e Campo Belo, na Zona Sul, e Vila Prudente e Vila Formosa, na Zona Leste.
Com a definição de critérios ambientais, urbanísticos, históricos e culturais para a modificação dessas zonas, a sugestão do Executivo municipal é incluir algumas quadras que hoje não estão contempladas como eixos. O mapa também prevê o contrário. Algumas áreas que estavam previstas para virar eixos, não serão mais - proibindo, por exemplo, que áreas demarcadas como de interesse cultural e histórico sejam verticalizadas.
Viviane explica que a inclusão do mapa é essencial porque mostra com maior transparência as mudanças que serão feitas nos Eixos de Estruturação da Transformação Urbana. As outras zonas da cidade, pela proposta, não devem sofrer alterações nas regras construtivas.
Para além desses assuntos, Montandon aponta que o material em questão ainda apresenta inconsistências pontuais ao repensar a cidade atual. Entre os exemplos, ele cita a necessidade de previsão de uma estrutura de apoio ao serviço de delivery - com número de vagas mínimas de motocicletas conforme uso e porte, em espaço coberto e totalmente dentro do lote.
Na opinião do urbanista, a regra deveria incidir para edificações novas e reformas de incremento de área construída superior a 50%.
Outra melhoria proposta por Montandon seria prever condicionantes específicas para parcelamento, uso e ocupação do solo, tais como a proibição de subsolo, soluções de engenharia e dimensionamento de reservatório de retenção em áreas de ocorrência de processos hidrológicos com grande potencial de destruição.
Por fim, Montandon também apontou um item importante para o comércio: uma possível previsão de dispensa de licença de funcionamento para atividades de baixo risco, desde que seja mantido o atual conceito do que é baixo risco.
Ele também sugere que seja exigido do responsável a comunicação à subprefeitura da instalação da atividade, algo que poderia ser feito informado o responsável técnico pelo funcionamento da atividade e pela edificação, ou criando um banco de dados digital com informações sobre os responsáveis técnicos, e que seja atualizado o regulamento para emissão da licença de funcionamento.
Ao comentar a revisão, Caldana destacou que o Plano Diretor é um grande pacto para a cidade e o Zoneamento é a operacionalização desse pacto. Na avaliação do coordenador do NEU, a cidade de São Paulo tem em mãos um PDE que evoluiu ao passo que a Lei de Zoneamento permanece sendo a mesma de 1972, que se tornou uma lei mercantilista e que não consegue enxergar a cidade atual.
"Os grandes processos urbanísticos do PDE não são contemplados pelo Zoneamento. Há uma diferença entre a revisão e o fazer de novo. Essa revisão passou de conjuntural para algo estrutural, ainda que pontualmente traga pequenas soluções", diz.
IMAGEM: Rovena Rosa/Agência Brasil