Parceria com indústria revitaliza loja de material elétrico do interior
Multfer abandona venda em balcão, entra em autosserviço, oferta espaços em gôndolas para fornecedores e vê faturamento subir 40% em dois meses
Se pedir para um consumidor imaginar uma loja de material elétrico, muito provavelmente ele vai descrever um local nada muito atraente, pouco iluminado e abarrotado de produtos.
Afinal, este é um tipo de comércio que o cliente só lembra quando está em apuros, isto é, precisa urgentemente trocar uma lâmpada, consertar um chuveiro ou mudar uma fiação.
Com três décadas, a Multfer, distribuidora de material elétrico, de Mogi Guaçu (SP), decidiu dar uma virada no seu negócio, justamente para acabar com este estereótipo.
A loja da Avenida Bandeirantes, que costumava atender os clientes em um balcão, desenhou um modelo de negócio, em parceria com o arquiteto Júlio Takano, que já deu resultado.
Desde janeiro, quando foi reinaugurada, o fluxo de clientes aumentou 50% e o faturamento, 40%, de acordo com Lara Baron Zenari Gerbi, diretora- executiva da Multfer.
A primeira mudança foi a transformação de loja convencional para a de autosserviço. O imóvel de mil metros quadrados, que reservava 80% para o estoque, está agora dedicado ao cliente.
E é neste espaço que a Multfer, com 30 anos, implantou um modelo de negócio, sob o conceito de ecossistema, todo focado em parcerias com fornecedores.
A loja reservou 42 espaços em gôndolas para fornecedores exporem seus produtos. Já estão ali Tramontina, Philips, Weg, Amanco, Schneider e Ledvance.
O tipo de parceria varia de acordo com cada indústria. Em alguns casos, a negociação pode envolver bonificações e ou pagamento por produtos comercializados.
A loja compra um volume de lâmpadas mensalmente, por exemplo, e recebe um pouco a mais como pagamento pela parceria e uso de espaço.
A parceria também pode se restringir a um percentual sobre a venda de produtos.
O que é comum a todos os parceiros é o trabalho conjunto entre as equipes de marketing das marcas e da Multfer, que têm regras para as ações das empresas dentro da loja.
O modelo de negócio da Multfer é semelhante ao utilizado há anos por redes de supermercados, de acordo com Sandro Benelli, consultor de varejo com experiência no setor.
“Nas grandes redes, a contrapartida nas parcerias varia caso a caso, e o pagamento pelo uso do espaço em gôndola pode ser feito em mercadorias ou em dinheiro”, diz.
De acordo com Benelli, essas parcerias podem até estar em contrato, com a previsão de pagamentos mensais na forma de um percentual sobre a venda ou a compra de produtos.
No setor de material de construção e de farmácias, diz ele, grandes redes também já utilizam este modelo de negócio, que agora pode estar se expandindo para os pequenos lojistas.
Com crise econômica, pandemia e revolução nos hábitos de compra nos últimos anos, de acordo com Lara, faz-se necessária a revisão de modelos de negócio no varejo.
“O consumidor é bem diferente daquele de 30 anos atrás, especialmente depois de uma pandemia. Decidimos mudar totalmente o conceito do nosso negócio”, afirma.
Com o modelo pronto, a Multfer correu atrás dos fornecedores, um dos momentos mais desafiadores em todo o processo, diz ela, pois envolve confiança na empresa.
“Montamos a loja pensando na expectativa do cliente, caminhos que ele percorre. A partir daí, posicionamos estrategicamente marcas e produtos. Cada centímetro da loja foi planejado.”
Durante três décadas, diz ela, a Multfer estava focada em pequenas indústrias de materiais pesados. “Era uma loja escura, feia. Hoje, temos até cafeteria.”
Lara prefere não citar valores envolvidos em todo o trabalho de reestruturação do negócio sob o conceito de ecossistema. Prevê que em até um ano e meio o investimento será amortizado.
Diz que outra loja da Multfer, também localizada em Mogi Guaçu, será revitalizada.
Erra quem imagina que toda essa transformação resultou em corte de funcionários.
A equipe de vendas da loja dobrou de 15 para 30 pessoas. O número de clientes no espaço saltou de 2 mil para 3,1 mil por mês.
“A ferramenta deste ecossistema é fazer do local uma experiência para o cliente”, diz.
Além de o espaço de vendas ter aumentado, a loja também criou áreas para treinamento de vendas e eventos. “Estamos conseguindo trazer um novo público.”
No Dia Internacional da Mulher, a Mulfter fez um evento para ensinar a mulher a se maquiar. “Vendo maquiagem? não, mas vendo a iluminação do espaço para a mulher se maquiar.”
A ideia de todo este trabalho, de acordo com Lara, é que o cliente possa se lembrar muito mais da loja, e não somente quando uma lâmpada queima.
STORE IN COMPANY
Além de remodelar a loja que atende o consumidor, a Multfer decidiu revitalizar outro negócio que possuí há cerca de 15 anos, que é o de loja dentro de fábricas (store in company).
O que era apenas um espaço para vender produtos em fábricas de papel, motores e veículos, agora é uma loja que chama a atenção de engenheiros e técnicos para treinamentos e cursos.
A loja da Avenida Bandeirantes passou a ser uma extensão das fábricas. Além de vender material elétrico, a Multfer oferece agora assessoria e cursos de qualificação para indústrias.
Um espaço na loja, chamado de Multfer Pro, foi reservado para atender o canal profissional, no qual são negociados grandes volumes de vendas.
A Multfer possui lojas em fábricas em São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo, com dois centros de distribuição, São Paulo e Espírito Santo.
Num modelo de negócio como este, o quanto se cobra por um espaço numa gôndola, de acordo com Takano, passa a não ser tão importante. O que vale é a construção das marcas.
Modelos de store in store ou de store in company que existiam, baseados em simples locação de espaço, de acordo com Takano, estão sucateados.
As parcerias entre varejo e indústria, diz o arquiteto, possibilitam ganhos para as duas partes, incluindo os consumidores, sobretudo quando envolvem qualificação e treinamento.
IMAGEM: Multfer/divulgação