O que aconteceu com as empreendedoras na pandemia
A crise do coronavírus reduziu a participação feminina no ambiente de negócios e evidencia as fragilidades e dificuldades que o gênero enfrenta no país para suas empresas deslancharem
A afirmação de que as mulheres empreendedoras foram as que mais sofreram com os impactos econômicos da pandemia de coronavírus no Brasil pode não ser uma unanimidade, mas está fundamentada em diversos números e pesquisas.
A mais recente, divulgada pelo banco Goldman Sachs, chamada de "WomenNomics: O impacto da Covid-19 em 10 mil mulheres e 10 mil pequenos negócios", indica que a receita das empresas lideradas por mulheres teve queda de 66% no último ano.
Os principais motivos foram a jornada dupla de trabalho e as tarefas domésticas, bem como níveis mais baixos de adaptação às ferramentas digitais para aumentar o potencial de seus negócios. Há ainda um viés negativo de gênero para o acesso à capital, que afeta as mulheres nos negócios.
Aprofundando um pouco mais esse cenário, o material mostra também que a pandemia foi pior para as empreendedoras brasileiras do que para aquelas de outros países analisados. Por aqui, 12% das mulheres relataram que tiveram de fechar seus negócios permanentemente por conta da pandemia. No mundo, a taxa ficou em 3%.
Para Paula Moreira, diretora gerente do Goldman Sachs, há muito a ser feito. Garantir o acesso de mulheres a programas de investidores e de governos, promover treinamento e acesso às ferramentas digitais para ajudá-las a converter seus negócios em algo mais on-line, e ampliar o acesso à educação, com melhoria nas creches e volta às aulas ou outros auxílios e programas que possam ser oferecidos às crianças.
No Brasil, as mulheres apontaram como principais problemas para seus negócios fatores como a queda de vendas e contratos (62%), saúde mental e física (47%), equilíbrio entre vida pessoal e profissional (45%), entender e implementar as legislações governamentais (29%) e demitir funcionários (29%).
Outra pesquisa realizada pelo Sebrae mostra que a pandemia reduziu a proporção de mulheres no empreendedorismo. De acordo com o levantamento, no terceiro trimestre de 2020 havia cerca de 8,6 milhões de donas de negócio (33,6%) no Brasil.
Em 2019, a presença feminina correspondia a 34,5% do total de empreendedores, o que representou perda de 1,3 milhão de mulheres à frente de um negócio entre um ano e outro.
Com as crianças fora das escolas e os idosos demandando mais cuidados por serem grupo de risco, e por motivos culturais, essas tarefas domésticas recaem muito mais sobre a mulher. E o que era precário ficou pior, segundo Renata Malheiros, coordenadora nacional do Projeto Sebrae Delas, que fortalece o empreendedorismo feminino.
Outros destaques da pesquisa do Sebrae:
- Do total de empreendedoras atingidas pela pandemia, 75% delas registraram perda de faturamento mensal.
- O tempo que as mulheres dedicam às empresas é, em média, 17% menor do que os homens.
- Apesar de as mulheres serem 16% mais escolarizadas do que os homens, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as empresas lideradas por mulheres faturam, em média, menos do que empresas lideradas por homens.
- Empreendedoras trabalham menos horas por semana. 59% delas trabalham menos de 40 horas semanais.
Outro dado que aparece nas duas pesquisas é o fato de que as mulheres costumam empreender em setores como alimentos, bebidas, moda e beleza - segmentos de menor valor agregado na produção e de baixa inovação. Habituadas a empreender por necessidade, muitas delas não têm tempo disponível para investir em inovação.
Em 2019, o número de mulheres correspondia a apenas 13,3% das matrículas nos cursos presenciais de graduação na área de tecnologia da informação, de acordo com o IBGE. Com base nesse cenário, a B2Mamy capacita e conecta mães ao ecossistema de inovação e tecnologia.
Desde 2016, a empresa apoia o desenvolvimento de negócios inovadores fundados e liderados por mães. Mais de 30 mil mulheres já participaram dos programas de educação, movimentando mais de R$ 6 milhões dentro da rede.
Com o início da pandemia, a startup precisou transferir todos os cursos para o ambiente on-line. Por meio de uma comunidade multiplataforma especialista na jornada da maternidade, a empresa abre caminhos para o protagonismo e a liderança feminina.
Além da capacitação, essas empresas e redes especializadas vêm se tornando uma alternativa para aquelas que buscam soluções e apoio para seus negócios.
De acordo com dados de uma pesquisa realizada pelo Instituto Rede Mulher Empreendedora feita com empreendedoras entre setembro e outubro do último ano, as palavras mais citadas pelas mulheres sobre como se sentem nos últimos meses foram ansiosa (66%), confiante (60%) e cansada (52%).
Nessa enxurrada de sentimentos que impactam toda a gestão da empresa, essas redes de apoio se tornam também espaços fundamentais de troca. Apesar das adversidades, as empreendedoras tentaram encontrar maneiras de continuar seus negócios durante a pandemia.
Ainda é alta a proporção de mulheres na informalidade, sem os benefícios do estado e que encontram mais dificuldades para conseguir crédito.
Para estimular empreendedorismo, o grupo L´Óreal Paris, que comanda toda a produção da Colorama, criou um curso para formar manicures em parceria com a plataforma Eduk.
A iniciativa partiu dos números do desemprego feminino durante a pandemia. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) mostraram que a proporção de mulheres no mercado de trabalho, no primeiro trimestre de 2020, caiu para 45,8%. Este valor foi considerado o mais baixo desde 1990.
O direcionamento do curso oferecido pela marca foi pensando estrategicamente para essas mulheres, já que para atuar como manicure, os materiais necessários são de baixo custo, além do fato do serviço ser prestado tanto em suas próprias residências quanto a domicílio. Além de trabalhar por conta própria, também é possível buscar oportunidades em salões de beleza.
Com aulas que abordam desde técnicas de esmaltação até conteúdo sobre empoderamento feminino, o curso reforça a importância da capacitação financeira e digitalização.
Mais de um ano depois da chegada do coronavírus ao Brasil e ainda com a performance profissional comprometida, a pandemia deixou claro que seus impactos são sentidos de forma diferente entre homens e mulheres.
Ainda assim, a participação das mulheres na economia brasileira aumenta consideravelmente a cada ano. Cada vez mais elas buscam uma atividade rentável que possa ser construída de forma autônoma e independente - seja para superar o desemprego ou para ter uma renda extra.
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