O novo momento do varejo de moda, segundo Flávio Rocha

Em reunião na ACSP, o empresário do Grupo Guararapes falou sobre o futuro das grandes varejistas de fast fashion, as inovações tecnológicas voltadas ao setor e relembrou de suas origens no comércio

Mariana Missiaggia
24/Jun/2022
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O novo momento do varejo de moda, segundo Flávio Rocha

Em meio a um novo movimento - o real time fashion – o empresário Flávio Rocha, principal executivo do Grupo Guararapes, dono da Riachuelo, lembra de quando optou por seguir o fast fashion, o modelo da espanhola Inditex (dona da Zara), e que explodiu na primeira metade dos anos 2000.

Foi a partir de um estudo de caso sobre a Zara que ficou famoso em Harvard que Rocha implantou o fast fashion na Riachuelo, em 2006, e assim transformou a antiga fábrica da Guararapes Confecções, no Rio Grande do Norte, na marca mais valiosa do vestuário brasileiro em 2013.

Desde então, o empresário diz ser obcecado por mudanças. Um de seus maiores desafios nessa jornada foi organizar a chamada cadeia integrada na companhia e unir três setores que funcionavam separadamente: a confecção, a logística e as finanças.

Depois de 40 anos trabalhando cada área de forma isolada, era fundamental que os setores ganhassem velocidade para ter um ritmo que garantisse maior volume de produção e o abastecimento diário de milhões de peças.

Na época, a inexistência de softwares para gerenciar estoques foi uma das dificuldades. A saída foi adaptar programas de grandes redes de livrarias para que registrassem as informações dos códigos de barras das lojas e assim soubesse para onde enviar cada peça.

Na última terça-feira (21), Rocha compartilhou sua trajetória com os integrantes do Fórum de Jovens Empreendedores (FJE) da Associação Comercial de São Paulo (ACSP). O encontro foi acompanhado por Alfredo Cotait, presidente da ACSP, Wilson Victorio Rodrigues, coordenador do FJE, Roberto Macedo, diretor acadêmico da FAC-SP, e Roberto Mateus Ordine, vice-presidente da ACSP.

Flávio relembrou inovações no varejo brasileiros implementadas por seu pai, Nevaldo Rocha, fundador do grupo e falecido em 2020. Uma delas foi a decisão de retirar os balcões das lojas, rompendo a tradição da época. Depois de ter visitado uma loja nos Estados Unidos, a National Shirt Shop, Nevaldo voltou ao Brasil convencido de que aquele era um modelo inovador.

“Tirar os balcões de nossas lojas foi uma inovação enorme porque rompeu barreiras entre a loja e o consumidor, que tinha o balcão como um obstáculo que o impedia de tocar e sentir o que quisesse”, disse.

Aos 14 anos, Flávio já ajudava na distribuição de camisetas da empresa do pai – a rede de lojas Super G, que mais tarde passaria a se chamar Grupo Guararapes, e que operava num modelo diferente da concorrência distribuindo peças para lojistas de todo o Brasil. “Sem que soubéssemos, a Super G foi uma das primeiras franquias do país.”

O empresário recordou que, naquela época, a cadeia tradicional produzia grandes quantidades de roupas do mesmo modelo e as enviavam às lojas. Os caminhões saíam lotados com dezenas de unidades de uma mesma peça e aquele lote servia para uma estação inteira, mesmo sem sucesso nas vendas.

Além dos encalhes que eram enormes, segundo Rocha, as lojas de confecção precisavam se instalar em verdadeiros galpões para ter um depósito - tudo muito diferente do momento atual, em que caminhões chegam às lojas com apenas quatro unidades por item e sendo uma de cada tamanho (P, M, G e GG).

Nesse sentido, atualmente Rocha trabalha para que a companhia deixe o fast fashion para trás e seja cada vez mais vista como uma marca de real time fashion - modelo de vendas baseado em um ciclo muito curto entre a produção e a fase de varejo.

Hoje, a Riachuelo tem um ciclo completo de produção de dez dias – e é uma das poucas fast fashion do mundo que tem controle sobre toda a cadeia produtiva, pois produz até o fio, a partir de algodão cru cultivado em um polo têxtil no Rio Grande do Norte.

A ERA DIGITAL

Rocha disse que todo o avanço rumo ao digital representou uma oportunidade de escalar o negócio exponencialmente. E citou também a revolução causada pelos aplicativos. O investimento nesse tipo de tecnologia por parte das grandes varejistas de moda se intensificou nos últimos anos, e 55% das transações on-line já são feitas via celular, segundo relatório da E-bit/Nielsen.

O objetivo, segundo o empresário, é conquistar espaço no smartphone do consumidor, que só terá lugar para um ou dois aplicativos - “ganha o que tiver mais recorrência e mais relevância”, disse o empresário.

No caso da Riachuelo, seu aplicativo inclui não só vestuário, mas também beleza, cama, mesa e banho, decoração, eletrônicos, itens para pets, entre outros. Um mix que, na visão de Rocha, está totalmente alinhado para ser o negócio do futuro em um super app de moda.

“Comprar moda num marketplace generalista é tão desestimulante quanto ir à farmácia. Estamos preparando um ambiente digital que vai muito além da moda em termos de volume e conteúdo – e isso se chama lifestyle”.

Como conselheiro do Grupo Guararapes, que inclui, além das Lojas Riachuelo, a financeira Midway e o Midway Shopping Center, Rocha lembrou que a oferta de serviços financeiros no portfólio do grupo contribui para o amadurecimento do negócio.

Se antes os vendedores das lojas físicas ofereciam o “cartão Riachuelo”, agora os clientes podem ter uma conta digital pela instituição financeira do grupo. E é nessa interação que Rocha diz também estar o futuro do varejo, especialmente no que diz respeito à fidelização do cliente.

Confiante em um futuro do varejo de moda baseado na integração entre as lojas e as novas tecnologias, Rocha mencionou a realidade virtual como uma tendência promissora para esse movimento.

O uso de óculos inteligentes, como o Apple Glass, permite ao cliente navegar numa loja física, sentir a textura de um tecido, experimentar peças no provador e ir muito além do espaço limitante da loja física, que confina mais de três mil produtos em apenas 700 metros quadrados, como é o caso da Casa Riachuelo.

Imerso no mundo digital, o empresário também falou sobre seu empenho para combater a sonegação de impostos no país ante o aumento das vendas on-line.

De acordo com Rocha, o atual momento tem impulsionado lojas digitais a seguirem o mesmo caminho dos camelôs das ruas, aumentando os focos de informalidade do varejo brasileiro. “São grandes camelódromos digitais que tiram proveito do nosso sistema tributário arcaico”.

A estimativa é de que o Brasil tenha deixado de arrecadar até R$ 600 bilhões em tributos em 2020, dos quais R$ 100 bilhões foram sonegados pelo varejo.

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