O coronavírus e a economia brasileira
Com o 1º caso confirmado no último dia 28 pelo ministro Luiz Henrique Mandetta (acima), choque negativo internacional não deveria impedir a recuperação da atividade no país, mas pode reduzir sua intensidade, alertam os economistas do Instituto Gastão Vidigal, da ACSP.
Quando as incertezas em relação à guerra comercial Estados Unidos-China desanuviaram, com o início de um acordo entre as duas nações, esta última passou a enfrentar uma nova ameaça: o coronavírus, que já provocou mortes e infectou milhares de chineses, havendo, inclusive, o risco de que se converta em pandemia mundial.
Frente a esse novo choque negativo internacional, cabe perguntar quais seriam as consequências econômicas para o Brasil. Em primeiro lugar, é importante recordar que a China é nosso maior sócio comercial, e o principal mercado para as exportações de minério de ferro, petróleo e produtos alimentares.
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Evidentemente, o impacto do coronavírus sobre o Produto Interno Bruto (PIB) chinês será, de todo modo, negativo, variando sua intensidade de acordo com a capacidade de controle da epidemia por parte do Governo de Pequim. A redução do PIB chinês, por sua vez, afetará negativamente a atividade econômica mundial, que já vinha desacelerando.
Assim, as exportações brasileiras deverão sofrer diminuição mais intensa do que se esperava anteriormente, diretamente pelas menores compras da China, e, pela consequente redução dos preços internacionais das matérias primas envolvidas e, indiretamente, pela redução das vendas para outros mercados que o Brasil atende.
O desempenho mais fraco do setor exportador deverá complicar ainda mais a difícil recuperação do setor industrial, além de subtrair alguns pontos de crescimento da produção agropecuária. Outro efeito que decorreria dos menores embarques ao exterior seria uma maior deterioração das contas externas, elevando sua necessidade de financiamento.
Como essa necessidade tem sido coberta com bastante folga pela entrada de capitais financeiros internacionais de longo prazo, e dada a expressiva liquidez dos mercados financeiros internacionais, a solvência externa provavelmente não se veria afetada. Porém, a menor oferta de dólares decorrente da redução das exportações deverá pressionar a taxa de câmbio.
No contexto atual de elevada ociosidade, dificilmente as maiores taxas de câmbio, que aumentariam os custos relativos aos insumos importados, se transmitirão na mesma intensidade para os preços finais, elevando a inflação e impedindo a manutenção da taxa de juros básica (SELIC) em patamares reduzidos.
Ou seja, a atual distensão monetária seria preservada, contribuindo para elevar o consumo das famílias, que seguiria sendo o principal motor de recuperação pelo lado do gasto, e o investimento produtivo.
Pelo lado da produção, excetuando o segmento do transporte de cargas, a perspectiva de recuperação dos serviços, principal setor pelo lado da produção, também se manteria, uma vez que sua evolução depende fundamentalmente da renda e do emprego, que continuariam a exibir retomada gradual.
Em outras palavras, o surgimento do coronavírus não deveria impedir a recuperação da atividade brasileira no presente ano, porém poderia reduzir sua intensidade. Nesse sentido, seria fundamental manter a coerência atual das políticas econômicas e avançar nas reformas estruturais, para aumentar a resiliência de nossa economia, frente a esse novo choque externo e a outros que porventura possam ocorrer.
ANÁLISE DA CONJUNTURA
1. Juros, Crédito e Inflação - IPCA de dezembro apresentou forte alta, pressionado pelos aumentos de preços de carnes, combustíveis e loteria, fechando 2019 levemente acima da meta perseguida pelo Banco Central;
- Crédito à pessoa física mostrou aceleração, em dezembro, na comparação anual;
- Taxa de juros média do crédito concedido à pessoa física leve queda na comparação com dezembro do ano passado, enquanto a inadimplência cresceu levemente.
2. Atividade Econômica e Emprego - Em novembro, a atividade industrial registrou recuo em relação ao mesmo mês de 2018, devido à fraqueza das demandas interna e externa. Em termos anuais, a contração do setor manteve a intensidade;
- No mesmo mês, O desemprego diminuiu levemente, em relação a 2018, com recuperação da renda total (massa de rendimentos);
- Vendas do varejo cresceram, refletindo aumento do crédito e recuperação da renda e emprego, porém em termos anuais houve desaceleração;
- Setor serviços também cresceu em novembro, impulsionado pelos mesmos fatores, corroborando cenário de expansão anual em 2019;
- Refletindo as trajetórias do varejo, dos serviços e da indústria, indicador de atividade do Banco Central (IBC-BR) novamente mostrou elevação, na comparação com o mesmo mês de 2018, sinalizando, porém, menor crescimento da atividade durante o ano passado.
3. Finanças Públicas - Governo Consolidado (União, Estados, Municípios e empresas estatais), apresentou déficit fiscal primário (excesso de despesas não financeiras sobre receitas), em novembro, abaixo do observado em 2018;
- Principal causa dessa melhora foram as reduções dos saldos negativos dos estados e municípios, explicados pelo crescimento da arrecadação, decorrente da recuperação da economia, frente à piora do resultado do Governo Central (Tesouro Nacional + INSS + Banco Central).;
- Despesas financeiras cresceram quando comparadas com novembro de 2018, devido às “perdas” do Banco Central com as operações de swap cambial, em função da elevação da taxa de câmbio;
- Somando-se essas despesas ao resultado primário, em novembro, o déficit total gerado (déficit nominal – excesso de despesas totais em relação às receitas) superou aquele observado no mesmo mês de 2018;
- A maior necessidade de financiamento decorrente do resultado anterior provocou elevação do grau de endividamento público em relação ao mês.
4. Setor Externo - Em 2019, superávit da balança comercial (excesso de exportações sobre importações de mercadorias) mostrou forte diminuição, causada fundamentalmente pelo recuo das exportações, devido à desaceleração global e à crise argentina;
- Menor saldo da balança comercial foi o principal responsável pelo maior déficit em conta corrente (excesso de importações sobre exportações de bens e serviços), em relação a 2018;
- Entrada de capitais financeiros de longo prazo (Investimento Direto no País – IDP), durante o ano passado, foi ligeiramente superior à observada em 2018;
- Situação externa continua robusta, com entradas de capitais de longo prazo mais do que suficientes para cobrir o déficit da conta corrente.
5. Síntese da Conjuntura Econômica - Atividade econômica em novembro frustrou as expectativas, mostrando “perda de fôlego”, e colocando em dúvida o ritmo da retomada, que parece abaixo do esperado, reforçando crescimento anual em 2019 próximo ao observado nos dois anos anteriores;
- Inflação (IPCA), apesar da aceleração circunstancial em dezembro, deve seguir abaixo da meta perseguida pelo Banco Central;
- Resultados fiscais mostraram piora em novembro. Porém, no ano como um todo, sinalizam cumprimento da meta fiscal com alguma margem;
- Apesar da deterioração da balança comercial, contas externas continuam solventes, com entrada de capitais financeiros de longo prazo mais do que suficientes para financiar o maior déficit em conta corrente.
FOTO: Marcelo Camargo/Agência Brasil