No Brás e no Bom Retiro, vendas caem pela metade em dois dias
Medidas preventivas da população para evitar contágio já fazem comércio sentir os impactos do coronavírus. Só no último fim de semana, vendas gerais caíram 16,3%, segundo levantamento da ACSP com base em dados nacionais da Boa Vista
Com menos pessoas circulando em ambientes públicos, como shoppings, por conta dos cuidados relativos à epidemia de coronavírus, as consultas no SCPC para vendas a prazo e às vistas nas lojas tiveram queda de 16,3% só no último fim de semana comparado ao fim de semana anterior. Em comparação a igual período do 2019, a queda foi maior, de 16,7%.
O levantamento, do Instituto de Economia Gastão Vidigal, da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) com base em dados nacionais da Boa Vista, já refletem a atual realidade: de que o consumidor já está se retraindo, e mudando seus hábitos de consumo aos poucos por conta da epidemia, segundo Marcel Solimeo, economista da ACSP.
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O cenário mudou do dia para a noite: até o último fim de semana, fim da primeira quinzena de março, as vendas no comércio paulistano tiveram alta média de 5,3%, ainda sob os efeitos do Carnaval, no fim de fevereiro, e da movimentação pós-evento.
Os tradicionais polos de compra que semanalmente recebem grandes fluxos de pessoas, como o Brás e o Bom Retiro, já dão uma ideia disso: o movimento, que começou a ficar mais devagar na última semana, caiu pela metade somente nesta segunda (16/03) e terça-feira (17/03), segundo representantes dos lojistas da região.
Nos shoppings, as recomendações para evitar aglomeração também levaram a uma queda no fluxo de consumidores e no movimento nas lojas estimado em 30% no último fim de semana, segundo a Associação de Lojistas de Shopping (Alshop). A partir desta quarta-feira (18/03), a entidade recomenda que os lojistas abram do meio dia às 20h, até tudo se normalizar.
Mas, se de um lado as pessoas têm evitado sair para comprar itens como vestuário, por exemplo, por outro, com o aumento dos casos de quarentena, parte da população continua a comprar, porém, com mais frequência, itens como alimentos e itens de higiene e limpeza - uma atitude que deve ser bem avaliada, segundo Solimeo, para evitar desabastecimento.
"Essa queda é um primeiro reflexo, não quer dizer que vai continuar a piorar", afirma. "Quando a ambiente é de incerteza, como o de agora, não há como fazer projeções: o ideal é evitar o pânico."
EM COMPASSO DE ESPERA
O movimento mais devagar no Bom Retiro na primeira quinzena de março, algo bastante comum depois do Carnaval, acentou-se bastante de semana passada até estra terça-feira, levando a uma queda nas vendas de mais de 50% em dois dias, segundo Nelson Tranquez, vice-presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas do Bom Retiro.
"Embora os lojistas tenham acabado de lançar a coleção outono-inverno, o movimento ficou anormalmente calmo, e bem abaixo do normal desde o último sábado (14/03)", afirma.
Mesmo com as lojas tomando as precauções necessárias de limpeza e higiene dos ambientes, assim como de revezamento de funcionários e alteração de horários de funcionamento há pelo menos quatro semanas, parece que só agora os consumidores começaram a se preocupar de verdade, diz Tranquez.
"Além de orientar os lojistas para ficarem atentos aos comunicados das autoridades, também estamos incentivando as vendas à distância (site e redes sociais) para tentar repor pelo menos um pouco essa queda no movimento", afirma.
O Brás vive uma situação bem semelhante, já que o decréscimo nas vendas que supera os 50%, também se intensificou a partir do último sábado, de acordo com Jean Makdissi Jr., conselheiro da Alobrás (Associação de Lojistas do Brás).
Ele e o pai, Jean Makdissi, que são proprietários de três lojas da marca Intima Store na região, perceberam que, para uma terça-feira normal, o impacto da queda por conta do coronavírus foi bastante pesado. "Já passamos por várias crises (o pai está há 54 anos na região), mas nunca vimos algo desse tipo", afirma ele.
Assim como no Bom Retiro, a orientação no Brás é usar outros canais de venda, além de ficar atento a quaisquer novas medidas do governo que possam beneficiá-los, já que todos têm seguido os protocolos de higiene recomendados.
"Mas esperamos medidas compensatórias, como a prorrogação de pagamento de impostos, já que o comércio tem custos muito altos referentes a funcionários, aluguel e mercadorias", afirma. "Estamos à disposição dos clientes, mas também cientes que, em algum momento dessa crise, não vai compensar abrir a loja", sinaliza.
Com a exceção de bares e restaurantes, que provavelmente não conseguirão repor a demanda perdida nesse primeiro momento, o demais lojistas devem aproveitar uma possível ociosidade para fazer ajustes e melhorias internas, pois quando as coisas voltarem ao normal, os consumidores também voltarão a comprar, diz Marcel Solimeo, da ACSP.
"Mas também procurar manter a cautela, seguindo as orientações do Ministério da Saúde, e adotar medidas de precaução para proteger funcionários e clientes", afirma. "Não há uma receita para enfrentar a situação, pois não sabemos o que vai acontecer. É adaptar o seu negócio à medida que as coisas evoluírem", orienta o economista.
FOTO: Karina Lignelli