Metas de saneamento ainda estão distantes no Brasil
Todos os dias são despejadas 5,3 mil piscinas olímpicas de esgoto não tratado na natureza
Todos os dias, um volume de esgoto equivalente a 5,3 mil piscinas olímpicas é despejado na natureza sem qualquer tratamento no país. Ao mesmo tempo em que a tecnologia 5G está prestes a ser inaugurada nas grandes cidades, 35 milhões de pessoas ainda não têm acesso a água potável de qualidade e cem milhões sequer possuem o esgoto coletado em suas residências.
Os números fazem parte da 14ª edição do Ranking do Saneamento, divulgado esta semana pelo Instituto Trata Brasil. O estudo, que analisou a situação de cem municípios localizados em todas as regiões a partir de informações do governo federal, indica que o Brasil melhorou discretamente nos últimos anos em relação ao saneamento, mas ainda há muito a avançar para atingir a universalização do atendimento.
De acordo com o Novo Marco do Saneamento, aprovado em 2020, 99% da população deve ter acesso à água e 90% dos domicílios brasileiros devem contar com coleta de esgoto até 2033. Em 2020, de acordo com o Trata Brasil, foram investidos R$ 13,7 bilhões no setor, valor considerado insuficiente para atingir as metas estabelecidas pelo Novo Marco.
“Em 2020, foi sancionado o Novo Marco Legal do Saneamento Básico, um importante passo no sentido de promover investimentos no setor, e, consequentemente, direcionar o país à universalização”, diz Gesner Oliveira, sócio da GO Associados, que participou do levantamento. “Contudo, 2020 também foi o primeiro ano da pandemia de covid-19, fato que escancarou a lentidão com que avançam os principais indicadores de saneamento básico”, completa Oliveira.
Em relação à rede de água potável, 84,1% da população brasileira, em média, tem água na torneira em suas casas. Os municípios mais bem colocados são o Rio de Janeiro (RJ), Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Campo Grande (MS) e São Bernardo do Campo (SP). Todos eles fornecem água a 100% de seus habitantes.
Na outra ponta, os piores colocados são Porto Velho (RO), com apenas 32,8% da população atendida com rede de água consolidada; Ananindeua, no Pará, com 33,8%; Macapá (AP), com 37,5% do total de população atendida; e Santarém, no Pará, com 50,9%.
Em relação ao esgoto, 54,9% da população, em média, conta com coleta de esgoto. Apenas dois municípios analisados, Piracicaba e Bauru, ambas no interior de São Paulo, atendem 100% da população com coleta de esgoto e 34 cidades têm coleta superior a 90% dos habitantes.
Em Santarém, o índice de coleta de esgoto chega a apenas 4,1% dos habitantes, o menor índice do país. Em Porto Velho (RO), o índice é de 5,8% e, em Macapá, 10,7%.
“Os resultados desse ranking mostram uma realidade já conhecida: de maneira geral, os estados das regiões Sudeste e Sul têm maior cobertura e melhor prestação de serviços de saneamento. Já nas cidades com pior desempenho verifica-se uma predominância de municípios no Norte e Nordeste, ainda que tenhamos algumas cidades de outras regiões”, diz Gustavo Gusmão, diretor-executivo da EY para o setor de Governo e Infraestrutura.
Segundo Gusmão, existem diversos efeitos positivos dos investimentos em saneamento, tanto para a população atendida como para o desenvolvimento do país. Na saúde, explica o consultor, há redução relevante nos números de mortalidade infantil de internações hospitalares, bem como a redução de doenças advindas da ausência de condições sanitárias adequadas.
“Nesse sentido, há uma redução de gastos públicos com saúde, recursos que podem ser destinados a outras áreas sociais prioritárias”, diz Gusmão.
No aspecto econômico, ele afirma que investimentos em saneamento básico, em especial na atual realidade brasileira, representa forte impacto na geração de emprego e renda. “Temos ainda uma relação direta dos investimentos de saneamento na valorização dos imóveis beneficiados com a acesso a água e esgoto.”
Gusmão também explica que, sob o aspecto ambiental, investimentos no setor promovem melhoria da qualidade da água, reduzindo a poluição de rios e preservando o ecossistema que depende desses recursos hídricos.
“Investir em saneamento está muito alinhado com a agenda de ESG (Ambiental, Social e Governança), que ganha cada vez mais relevância no mundo corporativo e na gestão pública.”
IMAGEM: Paulo Pampolin/DC