Há 70 anos no Centro, Ravil é a 'mina de ouro' dos aficionados por canetas

Fundada em 1954, loja especializada em artigos para escrita permanece no mesmo ponto da Avenida São João e é referência no ramo. Helena Vieira (foto) é a segunda geração à frente do empreendimento

Rebeca Ribeiro
18/Set/2024
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Há 70 anos no Centro, Ravil é a 'mina de ouro' dos aficionados por canetas

Ao descer a Avenida São João, anexa ao edifício Martinelli, um dos mais históricos de São Paulo, a pequena loja não passa despercebida por quem passa pela região. A Ravil, comércio especializado em canetas e lapiseiras, presente no mesmo endereço há 70 anos, é referência para quem precisa comprar canetas de todos os tipos, ou até mesmo um tinteiro.

Fundada por três sócios em 1954, a loja foi o local do primeiro emprego de Sebastião Martins Vieira, aos 13 anos, como office boy. Foi também o local em que ele adquiriu sua paixão por canetas. Sempre atento ao conserto desses artigos, Sebastião sabia reconhecer uma caneta apenas ao olhar. Assim, quando o casal formado pelos dois sócios restantes resolveu se aposentar, ele comprou a Ravil, administrando o empreendimento por 67 anos.

A loja, que hoje é comandada por Helena Vieira, filha de Sebastião, que desde os 14 anos ajudava o seu pai a cuidar do negócio, chega a faturar R$ 50 mil por mês. Com um movimento constante de clientes em busca de consertos para canetas, ou novos produtos, a Ravil é o destino de muitos clientes fiéis que passam na loja toda semana em busca de uma carga nova e para relembrar a memória de Sebastião.

“São clientes antigos que frequentam a loja desde que eu sou pequena. Alguns, há uns 50 anos”, diz Helena.

Apaixonado pelo Centro de São Paulo, Sebastião sempre adorou passear pela região. Criado em uma época em que era necessário usar gravata para entrar no cinema, ele fazia questão de atender seus clientes sempre muito bem arrumado. Nunca abandonava sua camisa, gravata e suspensório.

A vestimenta padrão foi usada inclusive em suas visitas às fábricas de canetas - Aurora, Compactor, Lany, Montblanc, Parker, Pelikan, Sheaffer, Visconti e Montegrappa. Visitas inesquecíveis para Sebastião, segundo a filha, que sempre adorou conhecer mais sobre o ramo de canetas e levar esse conhecimento - e novos modelos - para a Ravil.

“O diretor de exportação da Montblanc chegou a dizer que meu pai tinha tinta nas veias, ao invés de sangue”, diverte-se Helena, que considerava Sebastião uma "bíblia" das canetas.

Com tanto conhecimento, era conhecido e admirado por todos da região central. Entretanto, afirma, ele era um homem muito intenso no que fazia, por isso, não tinha o costume de ensinar tudo para as filhas.

“Aprendi bastante vendo ele consertar canetas, mas ele não tinha costume de nos ensinar sobre o ramo”, relembra ela, que passava a maior parte do tempo do período das férias na loja.

Para a empresária, além do conhecimento especializado da Ravil por canetas, sempre foi muito importante para os clientes o cuidado que Sebastião tinha com cada uma delas. “Uma vez, um cliente de Minas Gerais trouxe para o meu pai consertar uma caneta que recebeu de herança do avô e estava com a pena quebrada”, conta. Apesar de difícil, Sebastião conseguiu consertar e renovar aquele objeto que tinha um significado sentimental para aquele cliente.

Canetas para todos os gostos (e bolsos): portfólio tem modelos de R$ 2,50 a R$ 20 mil


'SUA ESCRITA É A NOSSA HISTÓRIA'

Fazendo jus ao slogan da Ravil, o cuidado com cada produto trazido à loja para conserto é um dos motivos para que, mesmo durante a pandemia, a clientela implorasse para que Helena os atendesse. No entanto, devido às regras sanitárias da época, não foi possível. Foi um período difícil para a Ravil, conta ela, que logo depois sofreu com a perda do pai, em 2022.

Após 70 anos de história, Helena acredita que o segmento em que atua ainda possui muito espaço no mercado, e não se sente intimidada pelos avanços tecnológicos. “As pessoas estão voltando a escrever, principalmente para desenvolver a área cognitiva, que o celular não consegue desenvolver”, destaca a empresária, que recebe muita procura por pessoas de diferentes idades. 

Com um portfólio diverso, a Ravil possui desde uma simples caneta que custa R$2,50, até modelos que chegam a custar R$20 mil. Assim, a loja atrai diferentes clientes como colecionadores, desenhistas, e pessoas que buscam canetas específicas para aperfeiçoar a caligrafia.

Além disso, Helena relembra que, por muitos anos, as canetas eram um grande símbolo de presente em formaturas, casamentos, ao entrar na escola, e principalmente entre juízes e médicos que faziam questão de ter uma bela caneta com seu nome para assinar um documento. Tradição que ainda acontece nos tempos de hoje, se tornando um diferencial para a Ravil.

“Se um cliente diz que precisa de um presente, entendemos as possibilidades, oferecemos um produto e encaixamos no valor que ele quer”, explica.

Presente na história de muitos clientes, a Ravil não possui apenas um vasto repertório de canetas, mas é também um local em que muitos guardam memórias, diz Helena. Clientes que compraram suas canetas muito tempo atrás e hoje visitam a loja com frequência para cuidar delas, pois fizeram parte de sua trajetória.

Um deles frequenta a loja desde quando cursava a faculdade de Direito da USP, e ainda hoje continua a marcar presença na Ravil. Até o diretor da icônica Biblioteca Mário de Andrade, Jurandy Valença, já declarou ser 'aficionado' e cliente assíduo. 

“A Ravil, em uma palavra, é ‘paixão’, diz Helena, emocionada ao relembrar do significado da loja na sua família, e em sua vida, e esse carinho pelo empreendimento que compartilharam com seu pai. Para o futuro, a filha do seu Sebastião espera que os seus filhos continuem tocando a empresa familiar, e mantenham essa tradição pelas próximas gerações. 

FOTOS: Rebeca Ribeiro

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