Fim de acordos com Argentina e Uruguai facilitará navegação de cabotagem

Brasil precisa agora resolver o aspecto doméstico da legislação que obriga as empresas do país a terem embarcações próprias

Michel Abdo Alaby
01/Out/2021
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Fim de acordos com Argentina e Uruguai facilitará navegação de cabotagem

O Brasil tinha, desde o século passado, acordos marítimos com o Uruguai (Decreto 78.671, de 25/10/1976) e a Argentina (Decreto 99.040, de 06/03/1990) que regulavam a navegação entre os portos dos três países, permitindo que somente embarcações que tivessem a bandeira brasileira, argentina ou uruguaia pudessem transportar mercadorias oriundas dos portos dos países contratantes, e a eles destinadas.

Esses acordos foram feitos em um momento histórico em que a mentalidade predominante em muitos países da América do Sul, inclusive nesses três, que viriam a se tornar sócios do Mercosul, era de protecionismo, com o objetivo de fomentar indústrias nacionais.

A experiência mostrou, entretanto, que barreiras protecionistas, inclusive a mais explícita de todas, a reserva de mercado, têm efeitos perversos sobre as economias dos países que as adotam, pois, as indústrias beneficiadas em um primeiro momento, acabam estagnadas, perdendo competitividade.

Outro efeito nocivo é a formação de verdadeiros cartéis, que recorrem a artifícios como fixação de tarifas e cotas de mercado, que aumentam preços e prejudicam não somente os consumidores finais, mas os próprios países em si, que ficam com economias menos competitivas.

Por isso é mais do que bem-vindo o Decreto 10.786, de 6 de setembro de 2021, que revoga esses acordos marítimos e permite que navios de qualquer bandeira façam o transporte de mercadorias do Brasil para o Uruguai e a Argentina.

O governo argentino foi comunicado sobre a não renovação do acordo em 3 de fevereiro de 2021, sendo as novas regras válidas a partir de 5 de fevereiro de 2022. O comunicado ao governo do Uruguai foi feito na mesma data, mas as novas regras entram em vigor ainda esse ano, em 7 de outubro de 2021.

Se a questão já foi encaminhada com nossos vizinhos parceiros no Mercosul, ainda falta fazermos, literalmente, o dever de casa, e resolvermos o aspecto doméstico da legislação que regula a cabotagem no Brasil, que atualmente, entre outras restrições, obriga as empresas brasileiras de navegação a terem embarcações próprias, não podendo afretar, ou seja, alugar navios de outras empresas para a realização de um determinado serviço de transporte.

Isso torna o investimento muito maior e, na prática, promove uma barreira de entrada nesse mercado, inflacionando os preços e desestimulando a adoção em larga escala da navegação de cabotagem, aumentando custos com logística e o famigerado “Custo Brasil”.

E bastaria uma olhada rápida no mapa do Brasil para entender que temos muito a ganhar aumentando o uso da navegação de cabotagem para transportar matérias-primas, produtos semi-industrializados, prontos, ou qualquer outra mercadoria.

Um total de 17, dos 26 estados do Brasil, estão no litoral, sendo que as regiões metropolitanas de suas capitais, ou maiores cidades, onde geralmente se localizam as fábricas e também os grandes mercados consumidores, estão no próprio litoral, ou a uma distância relativamente pequena, em torno de 100 quilômetros. Além disso, a ligação entre elas e os portos pode ser feita por ferrovias ou rodovias de razoável qualidade.

Entre as capitais, apenas Teresina está mais longe do mar, a 330 quilômetros da costa. E Belém, Macapá e Porto Alegre têm ainda a vantagem de estarem próximas de rios navegáveis.

Por isso, fazemos votos para que seja aprovada com a maior velocidade possível a chamada BR do Mar, que está em discussão no Senado, e prevê, entre outras melhorias na legislação, que as empresas fretem navios por tempo ou a casco nu (vazios) para uso na navegação de cabotagem.

Entre as grandes economias do mundo, especialmente de países com dimensões continentais, semelhantes às do Brasil, como Estados Unidos ou China, é raríssimo que vejamos o transporte de grandes volumes de carga em distâncias superiores a 500 quilômetros feitas em caminhões, como acontece no Brasil, pela simples razão de ser antieconômico.

E convenhamos que simplesmente não faz sentido que mercadorias produzidas nas regiões Sul e Sudeste do Brasil sejam enviadas para as regiões Norte e Nordeste, e vice-versa, em viagens de caminhão de milhares de quilômetros, muito mais expostas aos riscos de roubos, acidentes, e outros percalços a que estão submetidas as cargas e as pessoas que as transportam, se o percurso poderia ser feito em navios de cabotagem.

O Custo Brasil não é criado somente por meio de um sistema tributário incompreensível, ou um Estado inchado. Ele também nasce dos custos com logística, que todos nós pagamos. 

 

IMAGEM: Thinkstock

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