Entenda como a pandemia impulsionou o atacado da construção

Consumo represado, home office e pequenas reformas puxaram a alta de 9,2% desde o início da crise. Novo olhar sobre a casa, que exige reposição rápida no pequeno varejo, deve ajudar a manter esse quadro

Karina Lignelli
25/Ago/2020
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Reforma se adia, mas tem de fazer. A frase, de Cláudio Conz, presidente do Sincomaco-SP, resume as mudanças de hábito que têm influenciado positivamente o atacado da construção na pandemia. 

Os inúmeros vídeos e postagens nas redes sociais de pessoas comuns pintando a casa ou aprendendo bricolagem on-line para fazer pequenas reformas dão uma ideia até divertida disso.

Mas são mais uma confirmação de que o setor tem apresentado desempenho diferente dos demais desde que os problemas causados pela covid-19 começaram. 

Dados do estudo "Impacto da Covid-19 no Varejo Brasileiro", da Cielo, divulgados no último dia 17 de agosto, apontam que, desde a primeira semana de maio, a construção civil tem apresentado 15 semanas seguidas de crescimento, com alta acumulada de 9,2%. Só entre os dias 9 e 15 de agosto, a alta foi de 36,1%.  

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A necessidade de reposição rápida dessas pequenas lojas de material de construção, para atender o consumo represado das primeiras semanas de crise, a nova realidade do home office e o olhar mais intenso do consumidor aos "probleminhas da casa", segundo Conz, dão uma ideia melhor desse desempenho.  

Que o digam as 6 mil atacadistas da base do Sincomaco, que atendem 40 mil lojistas em todo o estado de São Paulo, sendo que a grande maioria desses varejistas, 98%, são de pequeno e médio porte. 

"A indústria tem preferido quantidades fechadas e maiores, e o pequeno quer comprar hoje o que vendeu ontem. Em função da logística eficiente, o atacado vem fazendo esse trabalho com excelentes perspectivas."   

A pesquisa do comércio do IBGE também confirmou as estimativas de desempenho positivo no primeiro semestre, com estabilidade de -0,1% ante igual período de 2019. Já os dados mensais apresentam outro cenário: alta de 16,6% em julho ante junho, e de crescimento ainda maior ante julho do ano passado: 23,9%. 

Mas será que esse novo perfil de compra deve continuar e garantir bons resultados? Para o presidente do Sincomaco, deve se estender um pouco mais. "Há dez anos era mais importante ter um carro novo do que pintar a casa", afirma. "Mas é uma mudança muito forte, o que estamos vendo é uma valorização dos espaços em que os consumidores estão abrigados e, com isso, vivendo um crescimento significativo deste mercado."   

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A seguir, Conz, que também é diretor da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) e tem mais de 40 anos de experiência no varejo da construção civil, faz um panorama do segmento nos próximos meses: 

Como ficou o comportamento do consumidor com a pandemia? 

Primeiro, para entender o consumo, você tem de pensar que ninguém come duas pizzas hoje para compensar a que não comeu ontem. A reforma você adia, mas tem de fazer. O que aconteceu em março, abril e maio foi uma quase parada: ninguém ia colocar pintor dentro de casa pelas questões que já sabemos. 

Então, houve um represamento de consumo que já vinha crescendo 3%, 3,5% desde o ano passado e freou. Mas criou demanda para depois, o que foi uma ajuda grande, pois ampliou o olhar para a reforma da casa.  

Detalhe melhor, por favor. 

A falência dos equipamentos, que geralmente era de um ano, ano e meio, se deu em trinta dias pois a pessoa passou a conviver 24 horas com eles. O que se detestava antes ao olhar a própria casa ficou mais evidente. 

CONZ: UM NOVO OLHAR PARA A CASA

Ninguém tinha um cantinho preparado para trabalhar em casa, e agora há uma remodelação de espaços para transformá-los em home office, uma adequação para criar espaço de trabalho do marido e da mulher.

É um conjunto de coisas. O desgaste maior dos materiais, o olhar mais intenso sobre probleminhas da casa se juntaram ao represamento do consumo. E chegamos a esse desempenho extraordinário, que são 15 semanas seguidas de crescimento a partir de 1º de março, desde que começou o que a gente chama de 'pandemia'. 

Qual o diferencial do atacado da construção para se destacar nesse cenário?  

A diferença básica é que o segmento atacadista vem crescendo muito nos últimos anos, tanto pela agilidade logística como pelo seu fracionamento.

Cada vez mais a indústria prefere quantidades fechadas e maiores, e o pequeno e médio varejo querem comprar hoje o que venderam ontem.

É uma reposição mais rápida de quantidades menores, e o atacado vem fazendo esse trabalho. E com excelentes perspectivas, em função da logística eficiente.   

Esse varejo foi um dos que acabou autorizado a funcionar nesse período. Mas e enquanto as lojas ficaram fechadas, não houve impacto? 

Ficamos uma semana parados (as lojas foram autorizadas a reabrir a partir de 30 de março). Daí em diante, todo mundo começou a arrumar a casa, a arrumar hospital (de campanha), leitos... Mas como ia construir se não tinha quem vendesse material elétrico, tubo de PVC? Era uma insanidade ficar fechado. Conversamos com o poder municipal para demonstrar a essencialidade do setor, e os decretos deixaram isso claro.  

Depois vimos questões pontuais, da abertura por quatro horas, e a adaptação a essa nova estratégia de atender a um número exclusivo de clientes dentro dos protocolos do varejo.

Tivemos impactos nos dois primeiros meses. Mas eles trouxeram esse resultado: 10% do movimento foram dos hospitais, e o resto para reforma e ampliação, já que o varejo não fornece para construtoras nem grandes obras. Perdemos uma semana, mas voltamos a atuar logo e foi o que contribuiu para o bom desempenho.  

E esse novo perfil de compra, deve continuar?  

Esse período vai se estender um pouco mais, pois trouxe um novo olhar para o ambiente. Há dez anos, era mais importante ter um carro novo do que pintar a casa. Hoje, há cada vez mais construtoras readaptando projetos a espaços maiores, com um novo olhar para dentro desse ambiente interno. 

É uma mudança muito forte, o que estamos vendo é uma valorização dos espaços em que os consumidores estão abrigados e, por isso, vivendo um crescimento significativo deste mercado. 

As perspectivas são boas, então. 

Muito positivas. Os números do varejo ampliado do IBGE trazem esses números já no primeiro semestre de 2020, que ficou praticamente igual a 2019, mas cresceu na comparação mensal. E não prevemos perdas: devemos fechar o ano com alta entre 4,5% e 5% sobre o ano passado. Mesmo com todos esses problemas.   

FOTOS: Reprodução do site e divulgação

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