'É uma recuperação extremamente lenta'
Para o economista Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central, além da Previdência o país precisa de reformas para melhorar a eficiência e a produtividade
Para o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore, os números do Produto Interno Bruto (PIB) de 2017 reforçam que o Brasil está numa trajetória de recuperação extremamente lenta. Na avaliação do economista, o resultado não trouxe surpresa. Uma aceleração do crescimento, segundo ele, vai ocorrer apenas se a agenda econômica abranger mais do que a questão previdenciária. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como o sr. avalia o crescimento de 1% no ano passado?
O resultado está dentro do que se esperava, mas no fundo quem projetava um crescimento de 3,5%, 3,8% para este ano vai ter uma frustração. Eu acho inatingível um crescimento acima de 3%.
Se der um pouco menos do que 3%, também é possível. Eu espero 3%. Estamos numa trajetória de recuperação extremamente lenta. Em todas as outras recessões, houve uma recuperação relativamente rápida. Essa recessão deixou uma carga pesada.
Por que a recuperação tem sido lenta?
Está andando devagar porque o Brasil precisa fazer muito ajuste, precisa de muita reforma. Tem de ir além da reforma da Previdência. Tem de tocar a agenda de reformas microeconômicas, melhorar a eficiência e a produtividade.
Tem de colocar a economia de pé de novo. Nós estamos nos recuperando, não tem nada de misterioso. Não foi frustrante esse resultado. Eu só enfatizo que é uma recuperação muito lenta em relação a qualquer outra recuperação que o Brasil já teve.
A reforma da Previdência não deve ser aprovada neste governo. Quais são, então, as consequências para a economia?
O Brasil precisa de uma reforma da Previdência. Sem ela, a equação fiscal não fecha. O próximo governo vai ter de pegar esse peão na unha e vai ter de encontrar uma forma política de fazer uma reforma bem feita.
No mercado há uma confiança de que a agenda reformista vai seguir no próximo governo. O sr. acredita nisso?
O CDS (Credit Default Swap, espécie de seguro contra o risco de calote) brasileiro está escolhendo, mas o de todos os países está encolhendo. O câmbio no Brasil valorizou, mas o câmbio de todos os países da América Latina também valorizou.
Esse movimento reflete um mercado internacional extremamente favorável. Não é um voto de confiança no Brasil. É pura e simplesmente uma leniência dos investidores externos que estão sequiosos de obter retornos em países emergentes porque não estão conseguindo retornos nos países desenvolvidos.
É possível prever quando esse ciclo vai acabar?
O PIB potencial dos Estados Unidos está crescendo 2% ao ano e o PIB de fato está avançando a 3%. O hiato do PIB, que era negativo lá atrás, no período da recessão, é positivo hoje.
Os EUA aceleraram o crescimento econômico. O presidente Donald Trump fez aprovar no Congresso uma lei que reduz o imposto para empresas. Isso estimula um crescimento mais rápido e já há um estímulo monetário que está gerando um crescimento acima do potencial. Com o estímulo fiscal, todo esse negócio deve aparecer lentamente na inflação.
Os juros podem subir mais rápido nos EUA, então?
Há alguns meses o mercado olhava e dizia que, talvez, o Fed (Federal Reserve, banco central norte-americano) suba duas vezes o juro em 25 (pontos-base), agora são três ou quatro altas de 25.
Quando for olhar lá na frente, daqui a pouco, vai aparecer uma quinta de 25 pontos. A tendência nos Estados Unidos é de ir lentamente para juros mais altos.
Esse negócio vai mudando o quadro. Isso é muito bom porque o mundo está crescendo mais depressa, mas tem o efeito de subida de juros lá dentro que muda um pouco esse quadro de leniência dos investidores externos com relação a ativos de países emergentes.
O impacto para a economia brasileira vai depender se a agenda de reformas for adiante?
Se for eleito um presidente que continue essa agenda de reformas, com uma equipe econômica boa, com o mesmo Banco Central, com gente desse tipo, eu acho que o problema externo é superado. Agora, se não tiver agenda de reformas, o risco percebido é mais alto.
FOTO: Sebastião Moreira/Estadão Conteúdo