Depois do Carnaval
Não se pode aceitar passivamente que a economia continue se deteriorando, a situação social se agravando, a incerteza travando os investimentos e os políticos continuem discutindo apenas seus interesses
Costuma-se dizer que o Brasil somente começa a funcionar depois do Carnaval o que, evidentemente, é um exagero, pois muitos setores, especialmente no setor privado, não interrompem suas atividades com a passagem do ano, ou à espera do fim do período carnavalesco.
O Congresso, contudo, apesar da volta do recesso, ainda não reiniciou seus trabalhos, o que deve ocorrer a partir da próxima semana.
O governo federal não descansou nesse período, pois emitiu diversas medidas provisórias e, inclusive, aumentou impostos sobre diversos produtos, sem considerar o possível impacto negativo para os setores afetados, que, regra geral, já se deparam com as dificuldades inerentes a uma economia em recessão.
Definições ou medidas que sinalizem perspectivas para o setor privado, empresários e trabalhadores, contudo, foram adiadas.
Se boa parte da população brasileira parece ter esquecido os problemas e as incertezas da situação do país, e aproveitado os dias de Carnaval para se divertir ou viajar, outra parte bastante relevante continuou enfrentado as dificuldades da saúde, agravadas pelo aumento do número de afetados pelas picadas do “aedes aegipti”, que transmitem a dengue, a chikungunya e o zika virus, cujas consequências ainda não são totalmente conhecidas, mas que já se transformou em uma calamidade por sua relação com os caso de microcefalia.
O que se pode esperar para o pós-Carnaval ?
O Executivo promete encaminhar ao Congresso propostas de regras para a política fiscal, para a reforma da Previdência e para aumentar a arrecadação pela criação da CPMF e do aumento do PIS/COFINS sobre o setor serviços.
Mais uma vez, contudo, o governo adiou a apresentação de sua proposta de ajuste estrutural das contas públicas, reiterando apenas sua intenção de aumentar impostos e recriar a CPMF. Mesmo na hipótese absurda de aprovação de mais tributação, o que o governo sinaliza até o momento não assegura o equilíbrio fiscal.
Parece que para compensar a falta do programa de ajuste, o governo procura mostrar que se mantém “governando” ao declarar guerra ao “aedes aegipti”, convocando inclusive o exército para a batalha que, por enquanto, tem sido mais midiática do que efetiva, pois as ações pontuais anunciadas não são suficientes para resolver o grave problema, que depende não apenas da participação da população, como de obras de saneamento e verbas para pesquisa.
Com relação ao Legislativo, por sua vez, com um grande número de MPs para examinar, CPIs em andamento e com a Câmara aguardando definições do STF para reiniciar o processo de “impeachment”, não se vislumbra nenhuma iniciativa que pareça indicar urgência por parte do Congresso, para que se defina um projeto de governabilidade e de medidas capazes de restabelecer a confiança da sociedade e que propicie condições para o início da recuperação da economia.
Parece que tanto para o governo como para o Parlamento o tempo para a tomada de decisões que reduzam a incerteza é irrelevante, sendo o mais importante para cada um dos protagonistas, a defesa de seus interesses pessoais ou partidários, e não os da população.
Se com relação ao combate ao terrível pernilongo, cabe à população engajar-se, não para atender ao apelo atender dos governantes, nem de forma episódica, mas com um esforço permanente, porque é do interesse de cada cidadão, isso não basta.
É preciso, também, se mobilizar com a mesma ênfase, para pressionar a classe política, pois a aparente inércia do executivo e do legislativo não condiz com a urgência de uma solução para a grave da crise de governabilidade que o país vive.
Não se pode aceitar passivamente que a economia continue se deteriorando, a situação social se agravando, a incerteza travando os investimentos e os políticos continuem discutindo apenas seus interesses.
É fundamental que a sociedade exija dos governantes, executivo e legislativo, a busca de uma solução urgente para a crise política que, respeitando as instituições, assegure condições para um acordo que permita promover as reformas e restabelecer a confiança de empresários e consumidores, para a volta dos investimentos e do consumo das famílias.