Como ele enfrentou gigantes da beleza nas farmácias
Murilo Reggiani (na foto) fundou a Vult Cosmética há 14 anos. Mesmo disputando espaço com grandes marcas faturou R$ 200 milhões em 2015
Duas décadas de trabalho no ramo de cosméticos garantiram a Murilo Reggiani, sócio-fundador da Vult Cosmética, muito mais que do que independência financeira.
O empresário construiu uma marca de maquiagem que faturou R$ 200 milhões em 2015 - fruto de um bom faro para o potencial de vendas dos produtos em farmácias quando isso não era tão comum, mais de uma década atrás.
Para disputar um mercado dominado por gigantes -entre eles Natura, Boticário e L'Oréal - a estratégia da Vult foi investir em um público até então pouco assediado pelas grandes empresas.
Reggiani apostou em produtos mais baratos, que pudessem ser acessíveis ao bolso de consumidores das classes C, D e E.
Além disso, conforme seu portfólio ganhava relevância em participação das vendas totais das farmácias, negociou espaços privilegiados para expor os cosméticos e criou uma área na empresa só dedicada a essa atividade.
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Tudo começou em 2004, quando Reggiani se converteu de empregado a dono do seu próprio negócio, e percebeu que precisava de ajuda.
O desejo de erguer a Vult em sua cidade, Mogi das Cruzes, a 60 quilômetros de São Paulo, se realizou em sociedade com uma amiga de infância, Daniela Cruz, arquiteta, que também queria ser empreendedora.
Ao fundar a Vult, eles se juntaram a outras 2,5 mil empresas que disputam consumidores no mercado de produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos no país, segundo a Abihpec, a associação do setor.
Desse contingente, apenas 20 companhias são de grande porte e somam faturamento líquido acima de R$ 100 milhões.
A dupla contratou um químico para assinar as fórmulas e terceirizou a primeira produção de batons, base, pó, blush, sombra, gloss e máscara para cílios.
"Brinco que tudo começou em uma grande indústria de dois quartos, sala e cozinha", diz Reggiani.
Com o primeiro lote de produtos em mãos, ele distribuiu as novidades em perfumarias de sua cidade, e também na capital paulista, onde já possuía uma rede de contatos.
O negócio caminhava bem, os pedidos eram recorrentes e, aos poucos, a distribuição dos produtos ganhava o país.
Mesmo satisfeito com os primeiros passos, Reggiani sabia que precisava de maior alcance para chegar até onde queria.
No terceiro ano de vida da empresa, conforme a Vult aumentava sua presença nas perfumarias, ele também percebia que o alcance desse canal de vendas era um tanto limitado.
"Observava que em São Paulo era muito comum, mas em outras capitais, as perfumarias se localizavam exclusivamente em grandes centros urbanos. Não em toda esquina, como era o caso das farmácias", diz..
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Foi então, que ele deu início a um projeto para encaixar a marca nas prateleiras farmacêuticas.
Na época, esse tipo de venda ainda era considerada incomum. Apesar disso, hoje, é um produto nada desprezível nesse tipo de estabelecimento.
No primeiro semestre de 2016, o setor de beleza movimentou R$ 6,35 bilhões em vendas dentro de farmácias, de acordo com estatísticas da Abrafarma (Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias). Neste ano houve ainda um avanço de 11,95% sobre os seis primeiros meses de 2015.
Para ter uma ideia, nas vendas porta a porta o desempenho não se repetiu. Dados da Abevd (Associação Brasileira de Empresas de Vendas Diretas) mostram que os itens de beleza por catálogo, modalidade da chamada de venda direta, apresentaram um recuo de 0,8% nessa mesma base de comparação.
Quando decidiu que queria o produto nas prateleiras das farmácias, a primeira atitude de Reggiani foi procurar as pequenas redes independentes ou associativistas da própria região de Mogi das Cruzes.
Não foi fácil. Há dez anos não havia a tradição de farmácias comercializarem produtos de beleza e, portanto, em negociar com os fabricantes.
Mesmo munido de pesquisas do mercado norte-americano e europeu sobre a tendência e relevância de se vender maquiagem no varejo farmacêutico, poucos aceitaram revender o produto.
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O máximo que Reggiani conseguiu foi espaço para exibir sombras e batons, em algumas bandejas nos balcões de pequenas farmácias.
Naquela época, apenas 15% do que era produzido pela Vult tinha as farmácias como destino. A vantagem era que, nessas lojas, a marca ainda aparecia como a única opção de maquiagem, longe das líderes de mercado, que naquela época começavam a despontar nas grandes redes farmacêuticas.
A aposta deu certo, e em pouco tempo, o empresário provou aos donos das farmácias que vender maquiagem era um bom negócio. "Foi um processo difícil, porém rápido porque as vendas surpreenderam", diz.
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Com um volume de produção mais representativo, Reggiani mapeou um roteiro com as pequenas farmácias que existiam na distância entre Mogi das Cruzes e a cidade de São Paulo.
Em menos de um ano, a Vult entrou em todas elas, e chegou também a outros estados. Para o empresário, era hora de se aproximar das quatro grandes redes farmacêuticas que, hoje, controlam 25% do mercado nacional - Raia Drogasil, Pague Menos, Pacheco e Drogaria São Paulo.
DE BANDEJA A MOVELARIA ESPECIALIZADA
Preparado para encontrar ainda mais resistência, Reggiani se surpreendeu. Como a venda de produtos de beleza de marcas como Revlon, Maybelline e tantas outras já eram responsáveis por um incremento significativo no faturamento dessas varejistas, as portas para novas negociações estavam abertas.
Uma regulamentação da Anvisa também colaborou para a presença desse setor dentro das farmácias, ao colocar os medicamentos atrás do balcão, liberando mais espaço para os produtos de higiene e beleza.
Hoje, os não-medicamentos - como produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumaria - já representam 35% do total de vendas das grandes redes farmacêuticas, podendo chegar a 50% até 2018, de acordo com a Abrafarma.
Reggiani explica que, para essas farmácias, trabalhar com produtos Vult significava a possibilidade de aumentar o consumo de clientes de uma outra faixa de renda, que estavam a procura de itens mais baratos.
"Começamos da mesma forma que nas pequenas, com bandejas, e as vendas foram nos garantindo mais espaço, até chegarmos a móveis de 2,40 de largura, por exemplo".
Mas oferecer o melhor preço ainda não era o suficiente para crescer nesse mercado. Satisfeito com a qualidade, embalagem e custo-benefício de seus produtos, o empresário sabia que perdia em apresentação.
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Reggiani direcionou, então, 6% do faturamento total da marca em investimentos em ponto-de-venda, onde os produtos são armazenados e apresentados nas lojas - uma prática muito comum dentro da indústria de beleza, segundo o empresário.
Ele explica que o tamanho e tipo de cada móvel expositor é acordado entre a administração de cada loja e o fabricante.
"Normalmente, a loja estabelece a medida para cada fornecedor, de acordo com o que cada marca tem a oferecer. Não compro espaço", diz.
Com a primeira grande rede conquistada (Drogaria São Paulo), foi questão de tempo até a marca chegar a outros grandes nomes, como Raia Drogasil e Pague Menos.
Estão atualmente em 35 mil pontos de vendas. E foi nas farmácias que a Vult encontrou o seu maior pilar de sustentação: é hoje o canal responsável por 70% do faturamento da marca.
Com 200 funcionários, uma produção de 4 milhões de esmaltes e 500 mil batons por mês, além de três centros de distribuição (Mogi das Cruzes, Cuiabá (MT) e Aracajú) somados a mais de 30 distribuidores regionais com estoque local em todo o país, a Vult deve ganhar uma nova unidade nos próximos meses.
Em fase de acabamento, um novo galpão em Itaquaquecetuba, será dedicado exclusivamente à fabricação de maquiagens.
"Tudo está sendo feito dentro do nosso fluxo, sem pressa e com capital próprio. Somos uma empresa enxuta e sem endividamento, e assim pretendemos continuar”.