Como as empreendedoras agora aprendem a criar grandes negócios

Metade das empresas é fundada por mulheres. Mas menos de 5% delas consegue crescer. Saiba como elas podem obter o apoio necessário para mudar este jogo

Inês Godinho
22/Jul/2015
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Como as empreendedoras agora aprendem a criar grandes negócios

Criar e se dedicar a um negócio não é fácil para ninguém. Há, para as mulheres, desafios extras. Antes atribuídos a um espírito de vitimização, constatou-se em  estudos recentes que há ainda um punhado de barreiras que dificultam às mulheres atingir o topo do mundo do trabalho e dos negócios na mesma proporção que os homens.

Mesmo que estejam mais instruídas e disputem o mercado de trabalho e abram empresas na mesma proporção que eles, ficam no meio do caminho.

A diferença é tão grande que, pelas contas do Fórum Econômico Mundial, as mulheres levarão 80 anos para usufruir das vantagens da equidade de gênero se for mantido o ritmo atual de mudanças. Até lá, se perderia o talento tão necessário de três gerações de mulheres.

Lideranças no mundo todo perceberam que a questão não vai se corrigir sozinha. Já houve tempo suficiente, desde o início da emancipação feminina, para que os CEOs assumissem a missão de igualar as oportunidades de gênero -- mas eles não fizeram o que era necessário.

Não são apenas barreiras externas, que possam ser vencidas por leis e regulamentações. Muitas são internas e precisam ser superadas por ações que não costumavam ocupar espaço na agenda de consultorias, instituições públicas e grandes empresas.  

Para a consultora Flávia Padoveze, especializada em aconselhamento a micro e pequenas empresárias, os entraves internos podem ser paralisantes. “Mesmo trabalhando muito, elas se perguntam o tempo todo por que não conseguem ver o dinheiro. Falta desenvolver uma mentalidade de empresária”, diz.

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O PODER DO ACONSELHAMENTO

Seja por consciência ou por constrangimento, muita gente começa a tentar recuperar o tempo perdido. A consultoria Ernst & Young, ou apenas EY, está entre as organizações que buscam respostas.

Para tanto, colocou em prática há sete anos um programa global de fortalecimento de mulheres criadoras de negócios com alto potencial de crescimento e já conta com um número expressivo de participantes e resultados. 

O ponto forte da iniciativa está no formato de aconselhamento e atende uma das reivindicações mais frequentes das empreendedoras, a dificuldade de encontrar mentores ou consultores para ajudar a resolver dilemas de negócios. 

Sócia da EY, Marina Martins adaptou a metodologia do Winning Women ao Brasil, onde coordena o programa, este ano na terceira turma. “Começamos a nos perguntar onde estavam as empresárias”, afirma. “Elas raramente concorriam ao programa global Empreendedor do Ano, organizado por nós há 20 anos com empresas com faturamento acima de R$ 100 milhões.” 

Conduzido em ciclos de um ano, o programa possibilita às 23 empresárias selecionadas até agora terem acompanhamento e aconselhamento de um grupo de empreendedoras e executivas de sucesso, como as empresárias Luiza Trajano e Sônia Hess, a consultora Fátima Zorzato e a executiva Beatriz Galloni, além de gerentes da EY de diversas áreas de especialização. Todas trabalham de forma voluntária. 

Além do acesso a todas as conselheiras, a participante escolhe uma espécie de conselheira madrinha. Na essência, o programa procura romper o isolamento que caracteriza a forma de empreender das mulheres e as desafia a sair da zona de conforto para que haja uma transformação.  

ONDE ESTÁ O NÓ

A experiência internacional da EY permitiu a identificação de cinco pontos que precisam ser atacados para que as empreendedoras cumpram o potencial de crescimento de suas empresas. Questões semelhantes foram apontadas por estudos de outras instituições, como o Gallup Institute e Harvard Business School, como causa do baixo crescimento das empresas. 

LEIA MAIS: O que falta para as mulheres reinarem nos negócios

COMO AJUDAR AS EMPREENDEDORAS

A metodologia idealizada pela EY direciona apoio especializado e ferramentas para fortalecer a atuação das empresárias em cada um desses pontos.

Além de acompanhar as reuniões entre empreendedora e conselheira, as gerentes da EY ligadas ao programa se reúnem a cada dois meses para monitorar o andamento do trabalho e discutir os casos e dilemas apresentados. 

Dois profissionais não envolvidos com o programa são convidados para participar das reuniões, de acordo com a especialização necessária para aquele momento.

Sua principal tarefa é motivar as gerentes a deixar a zona de conforto, questionando e sugerindo novas abordagens para apoiar as participantes. Em outra frente, os profissionais envolvidos colaboram na formulação de novos negócios e na identificação de possíveis fontes de ajuda, que podem ser até clientes.

“Nos encontros, as voluntárias não se limitam a dar conselhos”, explica Marina Martins. Precisam entender a estrutura da empresa e tratar também de aspectos específicos do negócio. Elas ajudam a empreendedora a organizar o raciocínio, a definir prioridades e a descobrir a rentabilidade da própria empresa. 

“Pretendemos chegar a questões tangíveis, como, por exemplo, definir uma meta de crescer 20%”, esclarece a sócia da EY. Além dos desafios de crescimento, as participantes assumem o compromisso de fazer o plano de negócios a partir do que aprendem no programa. 

Conselheira do programa, a consultora de carreira e gestão Fátima Zorzato explica que homens e mulheres empreendedores chegam com os mesmos dilemas – como crescer, como organizar a empresa, como desenvolver o time. A diferença está na postura de cada um para pedir ajuda.

“Eles iniciam a conversa dizendo ‘tenho uma pequena dúvida’, diz Fátima. “E elas falam ‘não sei por onde começar"". A mulher tem mais coragem de admitir que não sabe nada, mas isto tem um preço na imagem que passa a ter.” Aprender a transmitir a postura de business é um dos gaps que precisam ser resolvidos.    

Entre os pontos frágeis mais visados pelas conselheiras, estão a dificuldade de cobrar a equipe e de lidar com processos. De acordo com Marina, a falta de disciplina aparece “no baixo controle do caixa da empresa, que leva ao risco de desvios financeiros”.  

Um dos aspectos de maior alcance do programa está no entendimento da importância do networking para encurtar caminhos. As conselheiras abrem a própria rede de relações, ajudam a dar acesso a canais de investimento e fortalecem a confiança da empreendedora para assumir estas tarefas.

A escolha das conselheiras externas atende a uma necessidade identificada nas pesquisas, a de criar referência de liderança feminina nas quais elas possam se espelhar, como os homens fazem. Comparado à onipresença masculina nas capas das revistas de negócios, há pouquíssimas mulheres usufruindo dos holofotes.

ATALHOS PARA ENCURTAR O CAMINHO    

Um dos caminhos que começam a ser testados para acelerar uma solução é o de garantir cotas para as mulheres nos conselhos de administração, o mais alto órgão de uma companhia.

Já em andamento em alguns países europeus, a medida no Brasil recebeu o apadrinhamento das poucas mulheres que estão no topo do mundo empresarial, como Chieko Aoki e Luíza Trajano, segundo reportagem da revista Exame. 

A lógica por trás da ideia defende que a medida teria um efeito cascata sobre a promoção de mulheres em toda a cadeia de comando das empresas.

Além de dar visibilidade a lideranças femininas, criando modelos em que as profissionais possam se espelhar, seria preciso preparar uma geração inteira para ocupar os postos-chave em empresas para daí chegarem aos conselhos.

Em outra ponta, ressurge o mesmo ideário de 40 anos atrás. O feminismo, palavra demonizada nas últimas décadas, vem sendo abraçado pelas garotas da geração Y. Não se trata de saudosismo, mas a constatação de que as coisas não andaram com a velocidade que poderiam, apesar de toda a paciência que as mulheres procuraram ter. Parece que a paciência acabou.

Foto: Thinkstock

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