Caindo a ficha do cidadão brasileiro

Nossos representantes estão no governo e nos parlamentos para representar na verdade seus próprios interesses e das empresas e corporações que lhes financiam

Jorge Maranhão
02/Jun/2017
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Nesta semana foi ao ar uma matéria e um vídeo do site Spotniks sobre o custo dos políticos brasileiros. No momento em que o país atravessa uma avassaladora recessão econômica, tensão social e desemprego em massa, parece nitroglicerina pura.

Revoltante saber que nosso Congresso é o segundo mais caro do mundo, perdendo apenas para o americano. Mas em qualquer outro quesito como PIB, IDH, distribuição de renda, educação, saúde e outros, não há comparação cabível entre EUA e Brasil. Perdemos à larga!

Para não representarem o interesse público dos cidadãos eleitores e pagadores de impostos, nossos representantes estão no governo e nos parlamentos para representar na verdade seus próprios interesses e das empresas e corporações que lhes financiam.

Uma vez eleitos, danem-se os cidadãos eleitores!

E assim, seguimos mais de 200 milhões de otários a sustentar um bando de parasitas privilegiados. Otários trabalhadores de carteira assinada e desempregados, trabalhadores por conta própria e pequenos empreendedores que vivem do mercado e não de fornecer ao poder público.

E menos de 5%, a casta de privilegiados políticos, altos burocratas e toda sorte de corporações e empresas dependentes de boquinhas e bocões do Estado, fazendo a festa.

Mas a mídia aberta, de massa ou pelas redes sociais, que quase sempre incita os cidadãos com tantos desaforos e desmandos, sobretudo da classe política, pouco ou nada apresenta como possíveis saídas para a mudança dessa cultura geral de injustiça, iniquidade e impunidade.

Quando o maior gargalo para a afirmação de uma cultura de cidadania política é exatamente a dispersão dos cidadãos de bem, alienados da política pela faina diária de ganhar a vida.

A esperança é que a parte  crítica de uma elite de cidadãos politizados vem aumentando em face dos idiotas generalizados pela mídia de massa como a causa de nossa catástrofe civilizatória.

Aliás, o best seller "O mínimo que você precisa saber para não ser um idiota", de Olavo de Carvalho, com mais de 250 mil exemplares vendidos, é a prova de que estamos formando uma elite consistente e interessada nas questões de interesse público.

Para não falar de alguns milhões de seguidores de sites independentes de informação política, cada vez mais  identificados com um espectro ideológico anti-esquerdista e anti-demagógico, que vai de centro a centro-direita e a própria direita, de social-liberais, a liberais clássicos e conservadores. Sem falar nos reacionários e intervencionistas que já não nutrem pejo de botar a cara a tapa nos espaços públicos.
 
Não é por acaso que voltam a circular com intensidade os flashes nostálgicos do tipo “eu era feliz e não sabia” comparando períodos do regime militar com a roubalheira civil generalizada da natimorta Nova República.

Neste sentido, e até onde podemos ver, o verdadeiro embate político brasileiro não se dá entre forças do espectro ideológico-doutrinário, e tampouco por um corte estritamente político, do tipo direita x esquerda, ou conservadores x progressistas.

Ao contrário, se dá entre forças restauradoras da moralidade pública e forças comprometidas com toda sorte de privilégios, impunidade e corrupção, não apenas de recursos financeiros do Erário Público, mas,  sobretudo de recursos morais de nossa tradição conservadora.

Na verdade, insisto nesta ideia de que, para além de uma minoria de cidadãos com renda de Bélgica e a maioria com renda de Índia, somos  divididos entre impunes e penitentes, como denunciei num artigo para O Globo em 1992, e depois editado em livro pela Editora Contracapa em 2004, hoje somos tão simplesmente divididos entre céticos x cínicos, ou indignados moralistas x legalistas imoralistas.

Aqueles que justificam seu ceticismo terceirizando sua responsabilidade política para as calendas coloniais de nossa formação ético-cultural e os que justificam seu cinismo terceirizando a delinquência da classe política profissional pela má educação do povo eleitor que troca voto por  qualquer benefício fisiológico concedido pelos mesmos políticos que sucateiam os serviços públicos.

Não é à-toa que batem recordes de visualizações nas redes sociais exemplares destas categorias, como os supremos embates entre os ministros Gilmar Mendes x Joaquim Barbosa nas memoráveis transmissões do julgamento do mensalão.

Veja o eleitor este que é um dos que mais viralizam nas redes sociais. Comprovando como sempre a teoria da cultura brasileira como "dura lex, ma non troppo", ou "tudo pela legalidade, a despeito da moralidade", ou "cumpra-se a lei, mas nem tanto", ou "para os amigos, tudo, para os inimigos, a lei".

Enfim, a cultura do relativismo moral, da lassidão moral, pois "nesta terra, em se plantando, a tudo se dá... um jeitinho". Como nos casos mais célebres de Lewandowski no julgamento do impeachment de Dilma, que perdeu o mandato, mas conservou os direitos políticos.

Ou no caso do réu Renan Calheiros que foi mantido na presidência do Senado, mas saído da linha de sucessão. E agora, a repercussão geral do julgamento do caso do governador de Minas que será o primeiro réu a governar o digno povo mineiro que não merecia tal opróbrio.

Para não falar no que será o clímax do Supremo Jeitinho em decidir se o temeroso Temer pode justificar sua conduta imoral pela torção exegética do Art. 4 da Lei 1079, que tipifica os crimes de responsabilidade da presidência da República, com seus mimimis legalistas, formalistas e ocos de substância moral. A própria reencarnação do santo-de-pau-oco!

É o que chamo do ápice da providencial torção barroca de nossa cultura tropical, criada pelos colonos mineiros das terras do sobe-desce montanhas, para se suportar a desilusão do paraíso perdido transmudado em inferno pelos colonizadores.

De atenuante ao injusto e revoltante padecimento dos estupradores naturais, acabamos torcendo o sentido da lei pela lei do ressentido. Contorcendo a verso pelo reverso, distorcendo a paródia pelo pastiche, o côncavo pelo convexo, o efetivo da linha de marcação pela nebulosa zona do agrião!

Perdemos o sentido do pão-pão, queijo-queijo e celebramos a sedução maldita do pão-de-queijo!

Para além de compartilhar este momento célebre em que o Gilmar  pontífice do garantismo afronta o senso comum dos mortais cidadãos que lhe pagam os bem providos proventos, temos de nos reunir os defensores da Operação Lava Jato como uma das maiores conquistas civilizatórias que já experimentamos!

Como os verdadeiros nobres brasilienses que cercaram D Pedro I para fundar o Primeiro Império, decisivo, independente e contra os portugueses brasileiros que desejavam perpetuar a depredação geral do povo, território e nação.

Para refundar a República corroída pela corrupção sistêmica, quiçá a Monarquia Parlamentarista do longevo e saudoso Segundo Império, como querem alguns, temos de nos unir e reunir em torno do entendimento dos valores morais básicos da tradição judaico-cristã ocidental, como lei e legalidade, liberdade e responsabilidade, vida e dignidade, propriedade e segurança, federalismo e cleptocracia.

Enfim, da ficha que está a cair da depravação da democracia em demagogia.

E atenção: não somos poucos os que têm se manifestado nas ruas por estes valores morais.

A questão é reunir os líderes, os melhores de nós que atendam verdadeiramente ao chamado das elites, os que assumem a responsabilidade política de pactuar uma estratégia de argumentação que nos assegure o caminho certo para a merecida prosperidade, e que chamo simplesmente de fertilizadores de consciência política da cidadania, ou Agentes de Cidadania.

Nota: estou lançando no site de nosso Instituto o curso de cidadania política e o grupo de estudos dos problemas brasileiros a quem aceitar este desafio de reunião, mesmo que de poucos, mas sob um alinhamento básico sobre os sentidos destes valores morais de que está desfalcada nossa cultura política. Vejam aqui e grato pelo acesso.

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