BRF tenta reverter perda de quase R$ 1 bi
No cardápio de medidas estão redução de custos, contratação de novos executivos e o lançamento de uma terceira marca para atrair o consumidor de classe C
Afundada numa crise de gestão, que levará a companhia a ter seu quarto presidente em cinco anos, a BRF - maior exportadora mundial de frango -tenta acelerar mudanças para recuperar o espaço perdido por Sadia e Perdigão e reverter o enorme prejuízo acumulado nos últimos trimestres -de outubro de 2016 até junho deste ano, o rombo beirou R$ 1 bilhão.
No cardápio de medidas estão redução de custos, contratação de novos executivos e o lançamento de uma terceira marca para atrair o consumidor de classe C.
Especialistas e fontes próximas à empresa receiam, porém, que os esforços sejam insuficientes para levar a empresa de volta ao azul em 2017. No primeiro semestre, as perdas foram de R$ 448 milhões.
Nas contas de Bradesco e Santander, por exemplo, mesmo se os resultados do terceiro e do quarto trimestre forem positivos, a BRF poderá ter prejuízo no fim do ano - ainda que muito menor que o de R$ 372 milhões apresentado em 2016.
A seu favor, a BRF tem o fim da "tempestade perfeita" que se abateu sobre a empresa no início do ano, diz Gabriel Vaz de Lima, analista do Bradesco BBI.
A Operação Carne Fraca, que apurou esquema de pagamento de propina a fiscais sanitários, lançou dúvidas inicialmente sobre a qualidade dos produtos da empresa. Com embargos à carne brasileira e clientes temerosos, a BRF teve queda na demanda e viu dispararem gastos com transporte e armazenamento de produtos.
A empresa também convivia com pressão nos custos causada pela alta do preço do milho, usado na alimentação dos frangos de Sadia e Perdigão, em 2016.
Esses efeitos agora começam a se dissipar com a gradativa melhora nas exportações e estrutura de custos mais equilibrada na cadeia de produção.
"Conjunturalmente, o cenário está muito favorável à empresa", afirma Ronaldo Kasinsky, analista do Santander. "Mas há dúvida sobre a capacidade execução. Vai acertar na gestão ou seguirá no processo de tentativa e erro?".
PRESSÃO
O temor de que problemas de gestão minem a recuperação da companhia, manifestado por analistas como Kasinsky, é compartilhado pelos fundos de pensão Petros (dos funcionários da Petrobrás) e Previ (Banco do Brasil), que são os principais acionistas da BRF, com 22% da companhia.
O anúncio de que o atual presidente, Pedro Faria, ficará até o fim do ano no cargo foi apenas a última de uma longa lista de trocas no alto comando da BRF.
Desde 2013, quando a gestão do fundo de private equity Tarpon e do empresário Abilio Diniz teve início, foram cerca de 20 mudanças de executivos apenas nas vice-presidências da empresa - a conta é muito maior se consideradas diretorias e gerências.
Na área financeira, por exemplo, foram cinco diretores em quatro anos - o último, Lorival Nogueira Luz Junior assumiu em setembro. Há outras áreas críticas como marketing e RH, ambas em seu quarto executivo desde então.
Descontentes com os resultados, os fundos têm pressionado por mudanças. Na administração, além de ajudarem a forçar a queda de Faria, contribuíram para a demissão do vice-presidente de integridade, José Roberto Pernomian, que tem condenações na Justiça. Ambos tinham apoio e eram alinhados ao empresário Abilio Diniz, presidente do conselho de administração da BRF.
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A criação de uma terceira marca voltada para a classe C é uma das estratégias de curto prazo que a BRF, dona da Sadia e Perdigão, pretende adotar para tentar elevar as vendas. O Estado apurou que um dos nomes em análise para essa nova linha de produtos é Kideli.
Como Sadia e Perdigão hoje disputam juntas o mercado das classes A e B, a ideia é que a nova marca bata de frente com nomes regionais e com a Seara, do grupo JBS, que se tornou a principal algoz da BRF no País.
Por um lado, o movimento é uma tentativa da empresa de estancar a sangria no mercado interno. Em meio a uma crise de gestão e de resultados, a empresa viu concorrentes avançarem.
Há três anos, Sadia e Perdigão tinham, juntas, 59,1% do mercado de congelados. Hoje, detém 48,4% do segmento, uma queda de quase 11 pontos porcentuais, segundo dados de junho da Nielsen obtidos pela reportagem.
O lançamento da marca popular é encarado também como um atalho para reduzir a alta capacidade ociosa nas fábricas da empresa.
"Criar uma marca de combate pode ser uma saída para recuperar sua capacidade produtiva, que sempre girou de 90% a 95% e hoje está entre 70% e 75%", afirma Gabriel Vaz de Lima, analista do Bradesco BBI.
Fontes próximas à empresa, porém, indicam preocupação sobre como será a execução dessa estratégia, que demandará investimentos de uma empresa com endividamento alto e que ainda luta para retomar o espaço perdido pela Sadia.
A última medição da Nielsen indicou que, em congelados, Sadia e Perdigão ganharam juntas mais de 2 pontos porcentuais no mercado terreno, terminando o mês de julho com 32,6% e 15,8%, respectivamente. Uma boa notícia para a empresa que, ao fim de maio, alcançara a pior participação no segmento em muitos anos.
O desempenho, porém, inspira cautela, segundo fontes próximas à companhia. Ambas as marcas ainda estão longe de recuperar o espaço que já tiveram. Merece atenção ainda, diz um executivo, a dificuldade da BRF de parar a Seara, da JBS.
Apesar de sua controladora enfrentar forte crise de reputação, com os irmãos Joesley e Wesley Batista presos, a concorrente também ampliou sua fatia em congelados nessa última medição da Nielsen.
No setor de industrializados, Seara segurou sua posição em agosto, enquanto a Sadia seguiu perdendo espaço - está agora com 20,6% do segmento no qual já teve quase 40%. A queda recente da marca foi tão intensa que a Perdigão tornou-se líder no segmento pela primeira vez.