A mobilidade urbana de Bogotá serve para São Paulo?
Em palestra no Secovi, o ex-prefeito de Bogotá defendeu um transporte urbano mais igualitário, com mais espaço para pedestres e bicicletas, e menos carros
Conhecido por propor soluções urbanas ousadas, Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá, defende a restrição de vagas para automóveis no centro das cidades, a construção de parques, ciclovias e calçadas mais espaçosas, maiores investimentos em ônibus de alta velocidade nos moldes dos de Curitiba, e uma série de ações que priorizam os espaços públicos.
Peñalosa se reuniu com Carlos Leite, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Miguel Bucalem, ex-secretário de desenvolvimento urbano, e João Crestana, ex-presidente do Secovi, durante a Convenção Secovi 2015, para discutir formas de melhorar mobilidade urbana e otimizar o uso e ocupação do solo.
Durante sua gestão (1998 e 2001), Peñalosa instalou o TransMilenio – um dos sistemas BRT (Bus Rapid Transit); revitalizou parques e espaços públicos; fez mais de 350 quilômetros de ciclovias protegidas; milhares de metros quadrados de calçadas novas e recuperadas; além de criar políticas de gestão da demanda de viagens, como a restrição ao carro e a remoção de estacionamentos nas ruas.
De acordo com o ex-prefeito, quando uma população prefere passear dentro de um shopping, isso significa que a cidade está doente. “Mas shopping não é o problema, e sim a consequência de uma cidade que não foi feita para as pessoas. O poder público deveria aprender com esses grandes empreendimentos ao planejar a sua cidade, tornando-a segura e limpa, pois fica claro que as pessoas buscam refúgio nos shoppings”, diz.
Se a democracia e a constituição garantem que todos os cidadãos são iguais perante a lei, "um ônibus com 50 passageiros tem o direito a 50 vezes mais espaço na via que um carro com um passageiro”, diz Peñalosa.
Entre as medidas apontadas pelo ex-prefeito para tornar a cidade mais agradável, ele cita a diversidade da rua, seu uso misto e a interação entre público e privado. Para ele, a verticalização se torna inevitável em uma cidade como São Paulo. No entanto, a interação desses edifícios com a população dinamiza a cidade.
“O comércio de rua é um verdadeiro tesouro para a cidade. Não importa a altura do prédio, mas a interação dele com a rua. Se no pavimento térreo há comércio ou de alguma forma o prédio se comunica com a rua, a cidade se torna mais saudável”, diz.
MERCADO IMOBILIÁRIO DISCORDA
Na opinião de Crestana, o PDE (Plano Diretor Estratégico) não contempla as necessidades de São Paulo. “Os resultados que temos conseguido não têm sido exatamente o que a cidade pretendia, e o que os técnicos acham que deveriam ser feito para São Paulo”, diz.
"Esse diálogo está em aberto para a lei de zoneamento, e vários pleitos do setor (imobiliário) foram levados ao executivo e legislativo, e há uma expectativa muito grande para que eles finalmente sejam atendidos.”
Para Leite, as propostas de Peñalosa contribuem para o desenvolvimento da cidade, que na opinião do professor, deve ser orientado pelo transporte. “O nosso PDE apresenta ajustes possíveis e necessários, a partir desse norte (transporte). Isso é muito novo e radical para São Paulo. Acho importante que se chegue ao consenso de que o futuro tem ser pautado pelo transporte. Resta-nos descobrir o truque para vencer a resistência dos governantes”, diz.
De acordo com Peñalosa, engarrafamento não é uma questão da mobilidade urbana. “Mobilidade urbana se resolve com transporte público de qualidade e trânsito se resolve com restrição ao uso do carro, e não construindo vias mais largas.”
*Foto: Thinkstock