A confusão e o caos da substituição tributária

O mercado de material de construção permanece paralisado sem saber como precificar as mercadorias por falta de cálculo real do imposto devido por presunção

Roberto Mateus Ordine
19/Fev/2019
Advogado e presidente da ACSP
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Ainda no final da década de setenta e início da década de oitenta, quando surgiam as primeiras discussões sobre a substituição tributária no ICM tive a oportunidade de escrever um trabalho  denominado: “A incompatibilidade  da substituição tributária no ICM, diante da natureza do tributo”.

Nesse trabalho, expunha que instituto da substituição tributária era incompatível com a natureza do imposto de circulação de mercadorias, em razão de sua natureza indireta, prevendo fato gerador plurifásico e  somente ocorrendo a cada saída de mercadoria.

Enquanto que, na hipótese da substituição tributária, o fato gerador, além de ser presumido, passava a ser monofásico, incidindo antecipadamente, na  saída do fabricante.

À época aquela situação parecia ser impossível diante do sistema tributário vigente. A simples antecipação de tributo indireto, retido na fonte pelo fabricante, antes da ocorrência do fato gerador, era impensável.

Isso porque, no caso do ICM (na época não existia o ICMS) o fato gerador era plurifásico, incidindo em cada fase da operação  de saída da mercadoria, até seu destino final.

A cobrança do ICM antes da realização de cada operação de saída afrontava a doutrina e o sistema tributário nacional vigente. Pagar o imposto antecipadamente e ainda com base em fato gerador presumido era inimaginável, para dizer o menos.

O Fisco estadual, no entanto, precisava de uma saída legal para tributar alguns tipos de mercadorias de difícil controle fiscal. Tratava-se de mercadorias produzidas por poucos e grandes fabricantes, de um lado e, na outra ponta, a distribuição pulverizada entre múltiplos tipos de atacado e varejo.

Tratava-se da hipótese de mercadorias do tipo: cigarros, cerveja e refrigerantes, sorvete industrializado, tintas e vernizes -tendo na ponta final do comércio pequenos varejistas e pequenos comerciantes,  bares, charutarias e depósitos de periferia.

A tese fiscal tinha por base a implantação da substituição tributária no ICM, tornando a arrecadação do imposto prática impedindo a sonegação.

Ao reter o imposto na fonte produtora por indústrias de porte em número reduzido tornava fácil o controle fiscal na saída do fabricante.

Já na outra ponta, quando a fiscalização incidia sobre  a distribuição pulverizada, seu controle tornava-se mais difícil, possibilitando a sonegação de imposto no varejo. A base legal para isso estaria no art. 128 do CTN, que permitia atribuir a terceiro vinculado à responsabilidade da retenção do imposto.

Depois de muita discussão e a despeito da incompatibilidade tributária existente, o comércio acabou concordando com a implantação do sistema de tributação do ICM, por substituição tributária, desde que incidisse apenas em poucas e  determinadas mercadorias.

Dos produtos acima mencionados, na área do comércio de material de construção em especial foram enquadradas  nesta situação apenas a distribuição de cimento, tintas e vernizes.

Assim é que, em 1984, surgiu a Portaria CAT nº 06/84,  regulamentando as operações comerciais de cimento, transferindo para as indústrias (poucas e de tradição) a  responsabilidade da retenção do imposto devido na fonte, pela saídas subsequente do varejo.

Não há dúvida que o sistema de tributação atípico do ICM por substituição tributária funcionou bem para o Estado, evitando a sonegação fiscal  e prestigiando o comércio regular organizado de outro lado.

Tudo caminhava bem até que. em 2008, durante o governo de José Serra, o fisco estadual resolveu adicionar ao sistema por substituição tributária vários  produtos,atingindo em cheio o comércio de material de construção.

Desde o início, o comércio do setor protestou contra essa política fiscal, diante das dificuldades para o controle do segmento, já que havia heterogeneidade da categoria de fabricantes e comerciantes.

Apesar dos protestos do setor da indústria e do comércio, pela confusão que esta ampliação do sistema geraria no mercado de material de construção, a substituição tributária do agora ICMS foi implantada em centenas de itens de mercadorias , conforme estabelecido no art.317-Y do RICMS/2000.

Como era esperado, aquela atitude fiscal de implantar a ST/ICMS para quase todas as mercadorias do setor de material de construção acabou  por gerar muitos problemas o segmento em geral.

As alterações periódicas na fixação da margem de lucro (MVA) na indústria e no comércio, através de pesquisas exigidas pelo fisco, acabou por gerar mais confusão do que solução para o problema fiscal.

Assim é que entramos em 2019 com as indústrias do setor sem saber  ao certo como deveriam calcular o ICMS/ST no preço das mercadorias destinadas ao comércio.

E o comércio  permaneceu refém das pesquisas dos institutos, perdendo a liberdade de preço para enfrentar a realidade do mercado.

Justamente agora que o mercado de material de construção poderia  “respirar” melhor diante da esperança de novos tempos, permanece paralisado sem saber como precificar as mercadorias por falta de cálculo real do imposto devido por presunção.

Este é o quadro atual da confusão fiscal gerada pelo instituto da substituição tributária do ICMS, que não deveria existir.  

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