Surge uma nova Angola
Luanda é das cidades mais caras do mundo, a crise social é grande, as manifestações começam a acontecer na capital e nas principais cidades do interior
Quando João Lourenço assumiu a Presidência de Angola, sucedendo o histórico presidente José Eduardo dos Santos, de quase 40 anos no poder, muitos pensavam que a corrupção que minava o país iria diminuir, mas permaneceu, dado o envolvimento de políticos e militares na exploração das empresas estatais, em especial do petróleo.
Ocorre que João Lourenço vem surpreendendo pela ação e pela habilidade. Lá, não tem Lava-Jato, mas o Estado vai tomando as centenas de milhões de dólares acumulados ao longo dos anos pelos poderosos do regime comunista e seus filhos.
O caso mais conhecido é o de Isabel dos Santos, considerada a mulher mais rica da África e na lista dos dez mais de Portugal. Tem tido participações confiscadas e algum dinheiro devolvido em ações judiciais. Hoje, ela vive em Dubai e parece que perdeu toda e qualquer influência em Luanda, onde não pode ir sob risco de prisão.
Já o neto do fundador do MPLA, Agostinho Neto, movimento comunista que assumiu o poder quando da retirada de Portugal, já teve mais de um bilhão de dólares confiscados, a maior parte na Suíça. O projeto de João Lourenço é ir recuperando o que foi desviado para resolver os graves problemas internos.
Luanda é das cidades mais caras do mundo, a crise social é grande, as manifestações começam a acontecer na capital e nas principais cidades do interior. É preciso gerar empregos.
Agora, João Lourenço começa a vender as estatais, que são quase 200, que, sem dívidas, são atrativas para o capital externo. As primeiras ainda este ano serão do ramo têxtil. Mas o leque é grande.
O advogado português Jorge Santiago Neves, especialista em economia africana em geral, considera que o governo angolano já conquistou credibilidade suficiente para despertar interesse em empresas e fundos internacionais. O país vive um esforço para sair da dependência quase que exclusiva do petróleo. Na mira do governo, para o próximo ano, é o agronegócio, destruído após a independência – embora Angola possua as melhores terras da África para café, fruticultura e cana. Uma usina de álcool é a primeira do setor agrícola a ser vendida.
A orientação de reaver ativos e não processar os corruptos é uma política para manter no país, com o que conseguiram esconder, elementos que poderiam criar problemas internos. Desta maneira, estão sob controle.
João Lourenço está mais preocupado em fazer um governo com desenvolvimento e melhor distribuição de riqueza do que uma caça às bruxas, que pode perturbar a ordem pública, fundamental para a atração de capitais externos.
Curioso é que nos editais de privatização cabe um ingrediente subjetivo que permite preferência a investimento de Portugal, Brasil, Canadá e Alemanha, países com afinidades comerciais históricas.
Enfim, este pode ser o caminho para uma maior integração com o novo país, cujo povo se confunde com o nosso, pela presença forte da vida de angolanos desde sempre.
**As opiniões expressas em artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores e não coincidem, necessariamente, com as do Diário do Comércio