Sem investimento público, não teremos crescimento econômico
Para o economista Fernando Rezende, país entrou na armadilha fiscal do baixo crescimento. Sair dela exigirá uma ampla reforma do estado e do processo orçamentário
As projeções de desempenho da economia começam a mostrar o tamanho do buraco que o país terá de escalar para voltar a crescer. O PIB deve cair mais de 6% este ano, segundo o Banco Central, podendo recuar mais de 10% na visão de analistas de mercado.
Se as previsões se confirmarem, e o ritmo de crescimento da economia no pós-crise do coronavírus continuar igual ao dos últimos três anos - pouco superior a 1% ao ano -, a recuperação será demorada, virá depois de 2025.
Segundo o economista Fernando Rezende, acelerar esse processo só será possível por meio do investimento público, o que, por sua vez, exigiria uma mudança na direção da política econômica do governo, que é centrada na contenção de gastos para chegar ao equilíbrio fiscal.
“Sem investimento público não teremos crescimento porque o setor privado está descapitalizado”, disse Rezende durante reunião do Conselho de Altos Estudos de Finanças e Tributação (Caeft), da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), que aconteceu dia 8/06.
O economista afirmou que serão necessários recursos do setor público para melhorar a infraestrutura de escoamento da produção agrícola, desenvolver os polos turísticos do Nordeste e tornar a Zona Franca de Manaus um polo tecnológico, entre outros pontos que considera necessários.
“As prioridades estão paradas há mais de 30 anos”, disse Rezende. Hoje, a taxa de investimento público equivale a 2,5% do PIB. Com esse baixo nível de aporte, a capacidade produtiva é prejudicada.
Para Rezende, os investimentos do governo serviriam também como indutores dos recursos privados, que apareceriam de maneira complementar.
Segundo o economista, seria possível ao governo aumentar os investimentos na economia sem piorar a situação fiscal. Mas para isso, já deveria estar em andamento uma “reforma do estado”, que abriria espaço para a “reforma do processo orçamentário”.
Reformar o estado envolveria a redistribuição das competências entre os entes federativos, permitindo equilíbrio entre as obrigações de cada um deles e os recursos disponíveis para exercê-las. “Destruímos o regime de federalismo fiscal implantado com a Constituição de 1967, o que eliminou a cooperação intergovernamental”, disse Rezende.
Segundo ele, sem tratar do federalismo fiscal, não há como fazer uma reforma tributária, que, por sua vez, daria mais segurança ao processo de reforma orçamentária.
Com relação às mudanças orçamentárias, Rezende disse que seria necessário planejamento estratégico que considere o contexto atual da economia mundial, que sinaliza para possível “reversão do processo de globalização”.
“O pós-covid tem de ser uma oportunidade de mudança. Não podemos começar pelo fim, apresentando uma Proposta de Emenda Constitucional. Vamos fazer como foi feito em 1963, quando primeiro se montou uma comissão de alto nível para fazer os diagnósticos”, disse o economista durante a reunião do Caeft.
ORIGEM DO PROBLEMA
Rezende explicou que hoje faltam recursos públicos para investir porque, entre outros problemas, o orçamento foi engessado pelas despesas obrigatórias, como salários de servidores, auxílios e previdência, por exemplo.
Hoje, as despesas obrigatórias representam mais de 90% dos gastos totais do governo federal. “Estamos na armadilha fiscal do baixo crescimento porque não corrigimos impropriedades da Constituição de 1988. Despesas com assistências e com previdência cresceram muito”, disse o economista.
De acordo com ele, a partir de 2015 o problema ganha nova dimensão quando o orçamento da seguridade se torna deficitário.
“Quando acabou a receita para manter os gastos com a seguridade, venderam o patrimônio e outras fontes de receita. Foram criados impostos que comprometeram a competitividade. Então, quando se tentou estimular o crescimento, as importações é que ganharam espaço”, disse.
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