Por que produtividade é a bola da vez nas empresas
Varejistas como a rede Covabra de supermercados (foto) conduzem programas para corrigir ou implementar novos processos, a fim de ganhar eficiência e enfrentar as armadilhas da recessão
Uma das ações mais usadas pelas empresas para enfrentar a grave recessão tem sido a redução do quadro de pessoal. Prova disso é que já passa de 11 milhões o número desempregados no país, podendo chegar a 14 milhões até dezembro.
Para não afetar a qualidade do atendimento ou por mera questão de sobrevivência, grande número de executivos, sobretudo de pequenas e médias empresas está sendo compelido e olhar de frente para um tema praticamente ignorado no Brasil por décadas: a questão da produtividade.
“O varejo brasileiro está engatinhando quando o assunto é produtividade dos funcionários. O país vive sob um modelo de gestão de operações de lojas baseado mais em experiência do que em conceitos e ferramentas”, diz Alexandre Horta, consultor especializado em varejo.
Entenda que isso não se refere exclusivamente ao varejo. Em geral, a produtividade no trabalho no Brasil está praticamente estabilizada --ou seja, não avançou-- desde 1980, de acordo com Fernando Veloso, pesquisador do Ibre/FVG, com base em levantamento da Conference Board.
Em 1980, um brasileiro produzia o equivalente a US$ 28.205 por ano, em média. Em 2015, US$ 29.583. Os números estão corrigidos pelo dólar de 2015.
Como base de comparação, nos Estados Unidos, a produção anual por trabalhador atinge atualmente US$ 118.826. Na Coréia, US$ 71.287 e, na China, US$ 25.198.
O auge da produtividade no Brasil ocorreu entre 1950 e 1980, quando houve a transição da atividade agrícola para a industrial. Naquele período, a produtividade subia 4% ao ano, em média.
Depois disso, de acordo com Veloso, só voltou a crescer a partir de 2003, quando a produção anual por trabalhador atingiu US$ 26.716, chegando a US$ 31.259 em 2013.
Nos últimos dois anos, porém, a produtividade voltou a cair – ,3% em 2014 e 4,1% em 2015, ainda de acordo com a Conference Board.
“Acho muito difícil o país voltar a apresentar uma taxa de crescimento de cerca de 4% ao ano. Mas dá para aumentar a produtividade de 2% a 3% ao ano, se o país voltar a investir em inovação e aumentar a produção.”
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Estudos apontam que aperfeiçoamento em gestão é também fator importante para elevar a produtividade das empresas.
“A crise tem o seu lado bom. É quando os empresários olham com mais atenção para os gastos, os processos da empresa e começam a fazer ajustes, a buscar eficiência. É o nosso caso”, diz Ronaldo Santos, diretor-geral da rede de supermercados Covabra.
Com faturamento estimado em R$ 850 milhões neste ano, a Covabra, que ocupa a 15ª posição no ranking paulista da Abras (Associação Brasileira de Supermercados) de 2015, está com um olhar mais atento à operação.
Com 14 lojas espalhadas em um raio de 100 km, a partir de Campinas (SP), a rede cresceu fortemente nos últimos. Recentemente, inaugurou uma loja em Jundiaí (SP), onde, em breve, deve inaugurar outra unidade.
“Num processo de expansão, num primeiro momento, há perdas de eficiência. Estamos agora numa fase de trabalhar para aumentar a produtividade”, afirma Ronaldo.
Com uma história que começa em 1955, em Limeira (SP), a rede Covabra foi buscar apoio nos profissionais da Falconi, uma das maiores consultorias brasileiras especializadas em gestão.
O método escolhido foi o de comparar o desempenho de cada seção das 14 lojas e achar o benchmarking interno. Se a seção de frutas, legumes e verduras tem uma produtividade maior por funcionário em uma determinada loja, será exemplo a ser seguido pela mesma seção de outras unidades.
Veja como isso funciona: Imagine um funcionário do setor de frutas, legumes e verduras que consegue descarregar um caminhão que chega ao supermercado em 2 horas. Outro, em 1h40m e um terceiro em três horas.
“Há um desvio entre eles. Ou um é mais eficiente do que os demais, ou falta treinamento ou simplesmente o empregado mais lento não tem aptidão para desempenhar aquela função”, diz Adriano Gomes, sócio-diretor da Méthode, consultoria especializada em gestão.
O que as empresas precisam agora, mais do que nunca, segundo Gomes, é mapear os processos internos para identificar os fatores que emperram a produtividade. E, a partir daí, estabelecer metas, com base em comparações.
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É exatamente isso o que a rede Covabra, com cerca de 2.300 funcionários, está fazendo. Em dois anos, a empresa conseguiu reduzir as despesas entre 5% e 7%, de acordo com Santos.
Obter ganhos de 5% a 7% pode parecer fácil, mas não é, de acordo com Gomes, da Méthode. Ocorre que funcionários não gostam de ser controlados e submetidos a testes de comparação.
“Esse trabalho, que será concluído no final do ano, já fez uma grande diferença no nosso negócio. E a tendência, em 2017, continua a de usar benchmark interno para ganhos de produtividade”, afirma Santos, da Covabra.
O CUSTO DA MÁ GESTÃO
O corte simples de custos, sem uma contrapartida de aumento de produtividade do quadro de pessoal, pode afetar negativamente a qualidade do serviço prestado.
No caso de um supermercado, por exemplo, pode ter impaco na organização de espaços, manutenção, limpeza, atendimento, com reflexo negativo nas vendas, de acordo com o consultor Horta.
Em geral, os supermercadistas, segundo afirma, não analisam as perdas de oportunidades por conta da má gestão da força de trabalho, por erros na fixação de preços dos produtos, exposição nas gôndolas e má gestão de funcionamento de caixas, que, muitas vezes, resultam em longas filas de clientes.
“Tudo isso resulta em retrabalho e erosão de imagem. Simples assim”, diz.
Além de voltar o foco para ganhos de produtividade, a rede Covabra está mais atenta ao mix de produtos e às promoções. Com a crise, o consumidor quer produto com qualidade e preço justo. “Intensificamos as negociações com os fornecedores para dar mais vantagens para os clientes”, afirma Santos.
A atual recessão, de acordo com Horta, de fato, tem exigido das redes de varejo uma maior atenção à granularidade nas decisões, particularmente na questão de sortimento e preço.
“Em época de vento à favor, tais ‘imperfeições’ na administração acabavam sendo acobertadas. Excesso de itens em uma loja e, parte deles, com vendas ruins resulta em maior custo de capital (estoque e giro). Esse ajuste fino exige cada vez mais ferramental analítico e gente qualificada para lidar com o novo universo de gestão”, diz Horta.
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