Os negócios da quebrada - Entrevista com Marcus Vinícius Faustini
Autor dos livros Guia Afetivo da Periferia e O Novo Carioca. Criou a Agência de Redes para Juventude que ajuda a transformar ideias de jovens das favelas cariocas em projetos de empreendedorismo ou organizações para melhorar as comunidades em que vivem.
Quais são as principais dificuldades que jovens das comunidades enfrentam ao empreender?
O maior empecilho é a falta de incentivo, principalmente o financeiro. Poucas pessoas apostam nos jovens empreendedores das comunidades. A Agência de Redes para Juventude atende jovens de 15 a 29 anos das favelas do Rio de Janeiro que tenham alguma ideia – que pode ser um negócio ou uma ONG.
Nosso trabalho é desenvolver esses projetos. Eles recebem R$ 10 mil para tirar a ideia do papel e todo o apoio. Tivemos diversos resultados positivos, como um menino que fundou um jornal na Rocinha com uma tiragem de 4 mil exemplares. A metodologia que desenvolvemos está sendo aplicada em vários lugares do mundo com outros jovens carentes, como Manchester e Londres.
Além disso, acabamos de firmar uma parceria com a Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. A principal diferença entre empreender dentro e fora da favela é o incentivo da família e o apoio financeiro.
Um jovem de classe média que quer empreender tem geralmente o estímulo da família e, nos primeiros meses em que a empresa não lucrar, ele consegue se manter com uma reserva ou com a ajuda dos parentes. Dentro das comunidades o empreendedorismo não tem esse suporte. As pessoas precisam montar a empresa e se sustentarem ao mesmo tempo.
Como é envolvimento entre o empreendedor e a comunidade?
Existe uma parceira entre empreendedores dentro da favela. Podemos dizer que há uma rede de apoio para quem quer empreender. Pode ser a igreja que disponibiliza um espaço para servir de lojinha ou alguém que empresta alguma ferramenta.
Essa cooperação facilita o trabalho e reduz gastos. Isso também ajuda a manter esses jovens empreendendo. É lógico que existem as gambiarras e os improvisos, mas isso só mostra o tamanho da vontade dessas pessoas em empreender.
Existe uma mudança no discurso sobre as favelas e seus moradores?
Os primeiros passos para mudar a opinião ainda estão sendo dados. Contudo, os jovens das favelas ainda são vistos como um ameaça e não como uma potência.
O que motiva esses jovens a empreenderem?
É a necessidade. Existe uma falta de interesse dos jovens tanto pelo estudo como pelo trabalho, por isso o empreendorismo é uma saída. Precisamos dar a oportunidade para que esses jovens façam algo a partir dos seus próprios desejos e de suas paixões. Só nas favelas do Bairro de Santa Cruz, no Rio de janeiro, são 18 mil jovens que nem estudam nem trabalham. Precisamos incentivar esses jovens a fazerem algo.
Esses jovens empreendedores pensam em sair das comunidades?
Algumas gerações atrás, as pessoas que ganhavam dinheiro deixavam as favelas. Esses jovens querem permanecer em suas comunidades. Alguns deles viajam o mundo, mas voltam para as favelas com novas ideias e visões.