Minha casa, minha dívida: como usar bem o crédito com garantia de imóvel
Colocar a casa própria em garantia para obter empréstimo a juros menores exige uma boa avaliação prévia de objetivos e da situação financeira
Crédito de baixo custo é ouro em tempos de recessão econômica. Mas para conseguir uma oferta vantajosa não há segredo: é preciso apresentar uma boa garantia, o que leva a fazer uma boa avaliação sobre como obter uma boa relação custo/benefício.
Assim deveria ser com quem toma recursos de uma linha chamada crédito com garantia de imóvel, em alguns bancos conhecida pelo jargão em inglês home equity.
Essa linha de crédito funciona como uma modalidade que nos Estados Unidos é conhecida como a segunda hipoteca –pela qual as famílias obtêm empréstimo e colocam o imóvel já quitado, muitas vezes usado como residência, em garantia de um empréstimo.
No Brasil, o crédito com garantia de imóvel é recente e passou a ser oferecido por bancos pequenos e grandes durante a crise, já que outras linhas de financiamento se tornaram mais arriscadas e, por isso, escassas. O cenário ainda não mudou muito.
Segundo dados do Banco Central, houve redução de 2,2% no volume de novas concessões de crédito total (todas as linhas) para empresas e consumidores no acumulado deste ano até abril na comparação com igual período de 2016.
Nesse contexto, os bancos têm se esforçado em oferecer a linha de crédito com garantia de imóvel.
O motivo é muito simples: em tempos de desemprego ainda elevado e incerteza, o melhor para as instituições financeiras é emprestar tendo posse de garantias reais e certas, caso sejam alvo de calotes.
No discurso dos bancos, essa linha de financiamento é ideal para a realização de projetos -como fazer um sabático, MBA ou mesmo abrir o próprio negócio.
Outra boa razão para contratar, segundo as instituições, é a utilização do recurso para consolidar dívidas de custo pesado – como as de cheque especial, cartão de crédito e até crédito pessoal.
A taxa de juros dessa linha também costuma ser inferior, por causa das garantias. No Banco Paulista, por exemplo, é de 1,20% a 1,50% ao mês mais a variação da inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
"O percentual é nove vezes menor que o cobrado no cartão de crédito e seis vezes inferior ao do cheque especial e crédito pessoal", diz Alexandre Gomide, diretor de Home Equity do Banco Paulista.
No Itaú Unibanco, a taxa aplicada é de 22% ao ano, menor do que a de linhas como cheque especial e cartão de crédito, de acordo com a instituição.
QUER PEGAR EMPRÉSTIMO? PRESTE ATENÇÃO
Voltada para pessoas físicas, o crédito com garantia de imóvel também tem sido acessado por empresários, que buscam recurso para o negócio. Nesse caso, a ideia geralmente é tomar o recurso investir ou para usar como capital de giro.
Em casos como esses, consultores financeiros lembram que é preciso planejar bem a tomada de crédito com garantia de imóvel.
O ideal é ter todas as informações sobre a própria situação financeira e a da empresa organizadas para saber se as prestações poderão ser pagas e, assim, afastar o risco de perder um bem tão prezado quanto um imóvel.
Justamente essa ligação emocional com o bem faz com que essa linha de crédito não seja ainda tão popular, na opinião de Cristiane Magalhães, diretora do Itaú Unibanco.
Talvez por isso não seja ainda tão representativa na comparação com o financiamento imobiliário. O volume de crédito com garantia de imóvel é de R$ 185 milhões na comparação com uma carteira de crédito imobiliário que soma R$ 37,5 bilhões.
A recomendação de consultores financeiros é que o empresário verifique se vale a pena colocar o imóvel (que pode ser da família ou da empresa) em garantia de um empréstimo para salvar um negócio. Dependendo da situação pode ser muito interessante para consolidar dívidas que ele tem na pessoa física, segundo consultores.
"O empresário precisa saber antes o que levou a empresa a acumular aquela dívida ou a enfrentar dificuldade financeira. Geralmente a dívida não é problema. O problema é o que fez ela aparecer e crescer", diz André Massaro, consultor e educador financeiro.
Na pior das hipóteses, entrar em uma linha de crédito dessa para pagar dívidas de uma empresa pode não ser a solução e, ao longo de um ou dois anos, a empresa pode voltar para a mesma situação - caso o problema não tenha sido diagnosticado corretamente.
Antes de recorrer ao empréstimo, é preciso saber por que razão a empresa ficou no vermelho –se por fatores mercadológicos pontuais ou definitivos ou por problemas de gestão, por exemplo. E se tais dificuldades podem se repetir com a nova injeção de recursos.
Cristiane conta que pesquisas internas realizadas no banco identificaram que clientes do segmento Personalitté utilizam o recurso dessa linha para o negócio.
No Banco Paulista, por exemplo, 60% dos tomadores dessa linha de crédito tinham empresas e utilizaram os recursos no próprio negócio.
Cristiane afirma que o Itaú Unibanco não estimula exatamente a utilização do recurso, que é liberado na pessoa física, na pessoa jurídica. O fato é que o cliente não precisa dizer o que fará com o dinheiro.
Mas se na pessoa física ele estiver pagando taxas de juros elevadas em outros débitos - como no cheque especial ou no rotativo do cartão de crédito – automaticamente elas são quitadas com os recursos dessa linha de crédito.
Há também a possibilidade de ter troco, ou seja, o cliente toma um recurso maior do que precisa para quitar dívidas e realizar outro projeto. Nesse caso, pagará também Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Segundo Cristiane, nessa linha o valor do empréstimo oscila de R$ 40 mil a R$ 600 mil, com prazo de pagamento de até dez anos e o valor tem de corresponder a 50% do valor do imóvel.
No Banco Paulista, essa relação pode chegar a 60% e o pagamento pode ser feito em até 20 anos.
Para quem é empresário, Wagner Paludetto, consultor financeiro do Sebrae-SP (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), diz que antes de pedir o empréstimo é necessário verificar se há fôlego para pagar as parcelas da dívida.
“É preciso saber se o negócio vai para a frente ou não com esse recurso, pois o risco é perder a empresa e a casa. Muitas vezes é o caso de verificar se tem acesso a linhas para pequenas empresas que sejam vinculadas ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social)”, afirma.
COMO FUNCIONA?
De forma geral, os bancos exigem que o imóvel residencial ou comercial que será dado em garantia de um empréstimo esteja quitado e analisam o valor venal dele para definir quanto será liberado.
Depois é realizada toda a avaliação de documentos e certidões do imóvel. O processo de avaliação pode levar um mês, segundo Gomide do Banco Paulista.
Em caso de calote, o banco retoma o imóvel em 180 dias, mas o prazo varia de acordo com a região do país.
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