Marcelo Tangioni, da Mastercard: Galípolo continuará o trabalho de Campos Neto
O CEO da gigante do setor financeiro diz ainda que pretende aumentar a presença da bandeira entre pequenos e médios comerciantes
A gigante Mastercard está de olho nos pequenos e médios comércios brasileiros. É por essa avenida que a companhia, líder no mercado de cartões no país, pretende trilhar para avançar na participação de mercado. Segundo dados do Banco Central, a companhia tem 52,2% do volume de transações nessa modalidade no país (55,9% no crédito e 45,3% no débito e pré-pago). E, para crescer, pretende quebrar a barreira do desconhecimento por parte desses empreendedores, que pouco usam as ferramentas dos meios de pagamentos digitais em seus negócios.
Em entrevista exclusiva à Agência DC NEWS, Marcelo Tangioni, presidente da Mastercard Brasil, detalhou como a empresa pretende aumentar sua presença entre pequenos e médios comerciantes, que hoje gira em torno de 20%. “Hoje o pequeno e médio empreendedor até usa o cartão, mas usa o de pessoa física. Não é o ideal. Há benefícios para o comércio que ele acaba não usufruindo.”
Tangioni revelou também que a companhia tem atuado numa segunda frente, para ampliar as transações feitas no comércio eletrônico por cartões de débito, segmento que, segundo ele, “ficou no piloto automático”, principalmente após a consolidação do Pix entre os brasileiros. Nos próximos meses, a empresa vai apresentar mais ferramentas para ampliar essa presença. As iniciativas que já foram realizadas até aqui, segundo o presidente, contribuíram para aumentar em 400% as compras com débito nos sites em comparação ao período pré-pandemia.
O executivo da Mastercard também falou sobre taxa de juros, os caminhos para evitar a volta da inflação e a perspectiva sobre a gestão de Gabriel Galípolo no Banco Central a partir de 2025. “Temos uma expectativa de continuidade do trabalho realizado por Roberto Campos Neto.”
A seguir, os principais trechos da entrevista:
DC NEWS – Na liderança no segmento de cartões no Brasil, qual é o caminho para a Mastercard crescer ainda mais?
Marcelo Tangioni – Os cartões, de uma forma geral, penetram em 57% do consumo dos brasileiros. É uma marca extremamente alta, que coloca o Brasil como um dos mercados mais maduros do mundo. Quando colocamos Pix nessa conta, o número aumenta significativamente.
Num mercado amadurecido, por onde crescer?
Há muito espaço para crescer no mercado privado. E quando a gente olha para pequenas e médias empresas, o nível de penetração é muito baixo. Hoje o pequeno e médio empreendedor às vezes até usa o cartão, mas usa o de pessoa física. Não é o ideal. Há benefícios para o comércio que ele acaba não usufruindo, como os da nossa plataforma chamada Surpreenda Empresas, com descontos em materiais de escritório, passagens aéreas, serviços de gestão que ele pode utilizar. Em alguns casos, ele usa o cartão errado.
Qual a penetração dos cartões em pequenas e médias empresas?
Muitas vezes, a presença nesses comércios não passa de 20%. Existe ali uma possibilidade muito grande de trazer toda essa facilidade de meios de pagamento eletrônico também para esses empreendedores. Oferecendo não só a segurança e a conveniência, mas toda a parte de controle, gestão de gastos, de pagamentos, que é importante para fazer o gerenciamento de seu negócio.
Esse perfil de empreendedor não usa as funcionalidades de um cartão como pessoa jurídica?
Isso. Não me refiro sobre aceitar em seus estabelecimentos. Hoje em dia a grande maioria já aceita cartão. Ele aceita para o cliente dele, mas não usa da forma como deveria. A oportunidade está em começar a distribuir o cartão Mastercard para os donos e seus funcionários. O dono da loja precisa comprar mercadoria, material de escritório, insumos de uma forma geral. E tudo isso pode ser feito por meio de cartão.
E com os funcionários?
A gente enxerga que o dono do pequeno negócio não se sente seguro em distribuir cartões do comércio dele para os funcionários. Em muitos casos, ele desconhece que pode controlar não só o limite desse cartão, mas também a forma de uso. Por exemplo, um funcionário que trabalha em um departamento: é possível fazer com que esse cartão só possa ser usado com fornecedores desse departamento. Para outra coisa, ele estará bloqueado. Também é possível colocar horários. São muitas ferramentas de controle.
Como mudar essa mentalidade?
A gente já começou a fazer um trabalho junto a nossos clientes emissores, que são bancos e fintechs e que detêm essa relação. Temos acordos e incentivos, ações de marketing, de comunicação, de educação. Há um lado educacional e promocional muito forte para começar a quebrar essas barreiras.
Com essa enorme avenida de crescimento, dá para ter uma ideia qual pode ser o índice de avanço nos pequenos e médios comércios?
O céu é o limite. É muito difícil precisar qual é esse horizonte, mas há alguns dados que dão uma ideia. Hoje os cartões crescem 2 pontos porcentuais ao ano no consumo privado. É lógico que estamos em uma base madura, mas olhando 15 ou 20 anos atrás, a gente estava falando de 15% a 20%. Então, como no segmento de pequenas e médias empresas a penetração ainda está muito baixa, é possível que a gente comece a ver uma aceleração grande, e daqui a dez anos a gente possa chegar nos níveis que temos hoje no consumo das famílias. É difícil prever. Fato é que queremos chegar no índice mais alto possível.
Uma aposta total no pequeno e médio negócio?
Sim. Vou usar a expressão norte-americana low-hanging fruit (a fruta que está mais fácil de pegar), que a gente utiliza na empresa, falando do ponto de vista de oportunidades. Crescer nesse segmento é uma delas. É um setor muito importante para a nossa economia, para o Produto Interno Bruto (PIB) do País, e está em um momento muito interessante.
No caso de pessoa física, qual é o desafio para a companhia?
A indústria de cartões deve fechar este ano com índice de 10% a 11% de crescimento. E a Mastercard vai seguir crescendo no market share. No varejo, o horizonte é muito positivo. Mas é óbvio que a nossa indústria de meios de pagamentos tem desafios pela frente, no ponto de vista macroeconômico, como a questão da taxa de juros.
E qual a visão da indústria sobre a taxa de juros no Brasil?
A gente entende que ela precisa estar onde está, porque ninguém quer a inflação de volta no país. Os números da projeção, inclusive, vieram um pouco acima da meta. Nós, como país, que conseguimos depois de muito tempo controlar a inflação e ter uma moeda forte, precisamos entender o quanto é importante esse comprometimento no controle da inflação.
Então, a taxa está num patamar necessário?
Sabemos que para isso há, infelizmente, um remédio chamado taxa de juros.
E o caminho para derrubá-la?
A partir do momento em que a gente tiver um controle melhor de gastos, colocando menos pressão sobre a inflação, aí a gente começa a ver taxa de juros um pouco mais baixa, que é ótima para todo mundo. Bom para o comércio, bom para o consumo.
Vocês estão mais para otimistas ou pessimistas quanto a esse desafio?
Mesmo com esse desafio, o cenário é positivo, porque a gente tem visto salários em bons índices, desemprego em níveis baixos. Tirando essa pressão inflacionária, a gente tem assistido a uma economia crescendo.
Qual sua perspectiva para a gestão de Gabriel Galípolo à frente do Banco Central a partir de janeiro do ano que vem?
Em relação à gestão de Gabriel Galípolo, temos uma expectativa de continuidade do trabalho realizado por Roberto Campos Neto. A gente conversa bastante com o Banco Central, que é o nosso regulador. É um parceiro para uma série de coisas. A gente troca muita informação. A expectativa é pela continuidade de uma austeridade forte na política monetária, buscando conter a inflação, nem que seja por meio de um remédio amargo. E com uma agenda bastante comprometida do ponto de vista de inclusão financeira, de digitalização da economia, o que é muito bom para todo mundo.
Com a consolidação do Pix no Brasil, esse modelo de pagamento é visto pela Mastercard como aliado ou concorrente?
Os dois. Ele concorre com a Mastercard, assim como a Visa, o Elo, e o próprio dinheiro.
E como aliado?
Ele também é muito importante porque ajudou em algo que já vínhamos fazendo, que é acelerar a inclusão financeira. E é um produto de entrada. O consumidor começa usando o Pix, e depois passa para o cartão. Para fazer um Pix, ele precisa de uma conta. Ao abrir essa conta, ele recebe um cartão de débito. Depois recebe um limite e começa a usar o crédito. A gente acredita em opções, em multitrilho. Então, a gente compete e colabora.
Nesse cenário de crescimento do Pix, de certa forma o cartão de débito não ficou um pouco de lado?
A indústria tem feito essa mea-culpa sobre o débito. Todos nós, as bandeiras, os emissores, as credenciadoras, colocamos o débito no piloto automático. Mas vem coisa boa por aí. Ainda não podemos adiantar, mas estamos trabalhando no fortalecimento do produto. Já fizemos algumas ações importantes. No e-commerce, o débito praticamente não tinha transações e agora vem crescendo muito. Se comparar o que tinha antes da pandemia, a utilização do cartão de débito nas compras online cresceu 400%, contra 200% do uso do cartão de crédito. Estamos criando condições para que isso aconteça e o próprio comércio começa a se interessar mais por esse produto. Vamos ter mais ações para aumentar a presença do débito. Imagino que em dois ou três meses teremos essas novidades.
IMAGEM: divulgação