Guerra do congelado: JBS e BRF disputam território com lojas próprias
Swift, da JBS, que hoje domina o mercado com mais de 600 pontos de venda em todo o Brasil, vê crescimento da concorrente Mercato Sadia, da BRF
O consumo de alimentos congelados tem crescido exponencialmente nos últimos anos, principalmente devido à versatilidade e à conveniência de conservação dos produtos. Com isso, viu-se uma explosão de lojas especializadas em produtos ultracongelados nas grandes cidades, que oferecem todos os tipos de carnes, legumes, frutas, doces e snacks.
O estudo Consumer Watch Express Shopper, realizado pela Kantar Worldpanel no ano passado, revelou que, na América Latina, 33% das pessoas consomem refeições congeladas. Já no Brasil, essa porcentagem é ainda maior: de 61%.
A previsão global para 2029 é um Compound Annual Growth Rate (GAGR) – em português, taxa de crescimento anual composta – de 5,2%. Isso significa que o setor deve alcançar US$ 408,05 bilhões em seis anos.
E isso não acontece só na América Latina. Em 2020, o American Frozen Food Institute divulgou que o setor teve um aumento de 21% nas vendas sobre 2019 nos Estados Unidos. Já a British Frozen Food Federation divulgou que a alta no Reino Unido foi de 872 milhões de libras para mais de 7 bilhões de libras por ano em 2020.
A pandemia de covid-19 impulsionou e muito a indústria de alimentos congelados, ajudada pelas vendas on-line do setor no período. Há uma preferência por esse tipo de produto pelo público mais jovem devido à praticidade.
Seria o fim dos açougues de bairro, pelo menos nas grandes capitais? Os especialistas avaliam o setor e acreditam que o tradicional comércio de carnes que se via 20 anos atrás está fadado ao fim.
“O que vemos hoje são boutiques de carnes, onde o consumidor pode encontrar cortes especiais ou congelados. Aquela carne fresca na vitrine não é mais comum de se ver nos grandes centros. Além da praticidade do congelado, que otimiza o tempo, o cliente preza pela higiene no ponto de venda, grande variedade, disposição de produtos e proximidade de casa para comprar rápido”, pondera Rodrigo Catani, sócio-diretor da Gouvêa Consulting.
BRIGA DE GIGANTES
Em São Paulo, entre as boutiques de carne é possível encontrar, em cada bairro, pelo menos uma ou duas unidades da Swift, do grupo JBS, que deu início a essa revolução dos congelados com lojas próprias.
A empresa possui mais de 600 pontos de venda em várias cidades do Brasil. Elas estão divididas entre lojas físicas, lojas no varejo e atacado (instaladas dentro de redes supermercadistas), lojas móveis em caminhões que circulam por condomínios e a loja on-line.
A marca nasceu em 1855, nos Estados Unidos, com o objetivo de revolucionar a maneira como a carne era processada, distribuída e comercializada. Só foi em 2007 que a Swift passou a fazer parte da JBS, iniciando uma nova fase na empresa, com a criação de canais de venda próprios, sem a necessidade de intermediários para chegar ao consumidor final e com a produção e comercialização de proteínas congeladas.
Atualmente, a Swift é um varejo multicanal especializado em proteínas congeladas.
Apesar de não divulgar dados sobre abertura de novas lojas, a Swift afirma que continua investindo em uma estratégia multicanal, o que inclui lojas físicas, móveis, on-line e lojas nos principais varejos.
“Queremos garantir que estaremos próximos aos nossos clientes para que eles possam encontrar e comprar os nossos produtos da forma que for mais confortável para eles”, destaca Marcos Carvalho, diretor de Marketing da Swift.
Para ele, o brasileiro definitivamente aderiu ao gosto pelas carnes congeladas. “As pessoas buscam cada vez mais a comodidade e praticidade. O consumidor está mais exigente e não é mais o tipo de cliente de antigamente. Antes, o foco da nossa operação, o foco de contato com os clientes, eram as lojas físicas. Agora, eles querem loja on-line, entrega pelo iFood e Rappi e por aí vai. Também vemos consumidores optando por empresas que tenham responsabilidade com ESG, um dos pilares da Swift”, diz Carvalho.
A Swift viu seu reinado ganhar um novo concorrente de peso em 2020: o Mercato Sadia, da BRF. O grupo usa a força da marca Sadia, o amplo portfólio de marcas BRF e Marfrig e marcas parceiras, como Bassi e Montana, além de produtos como azeites, bebidas, temperos, entre outros.
Apesar de ainda estar muito distante da Swift em termos de pontos de venda, a marca cresce rápido. A Mercato Sadia inaugurou em novembro do ano passado sua 10ª loja própria no Shopping Parque da Cidade, na Zona Sul de São Paulo. A marca também possui um e-commerce, o Mercato em Casa, e vende no conceito store in store, onde o varejista cede um local dentro do seu estabelecimento comercial para a BRF promover uma experiência de compra diferenciada.
A BRF também investiu em tecnologia na loja, que inclui self checkout e QR codes que darão acesso a centenas de receitas. No total, agora são nove unidades em São Paulo e uma em Santa Catarina.
Segundo Marcelo Suarez, diretor de Trade Marketing, Omnichannel e CIEX da BRF, o Mercato Sadia tem uma proposta que une experiência de compra e distribuição de produtos de maneira segmentada por ocasiões de consumo.
“Os clientes conseguem encontrar todos os itens necessários para o preparo de suas refeições, mas também podem experimentar os itens prontos na loja. Além disso, as lojas físicas permitem uma aproximação e entendimento mais aprofundado das necessidades do consumidor para trazer cada vez mais inovação”, afirma o executivo.
A BRF tem planos de expandir seus negócios de um modo geral. A empresa iniciou em 2021 seu plano chamado Visão 2030, uma série de ações para alcançar R$ 100 bilhões de receita até o fim desta década, com dados divulgados em seu relatório aos investidores.
FOCO NO B2C
Catani, da Gouvêa Consulting, vê esses dois gigantes quebrando o paradigma de resistência dos consumidores. “Antigamente, o cliente achava que o congelado não era um produto fresco. Só que hoje, temos uma nova geração consumidora, que entende o conceito Frozen is the New Fresh (congelado é o novo fresco), aprovam a qualidade dos produtos e defendem sua praticidade.”
O consultor é categórico ao afirmar que o B2C (Business to Consumer – ou venda direta do produtor para o consumidor) é um caminho sem volta. “Quem entra, não consegue mais parar porque percebe que é muito vantajoso em diversos aspectos.”
Entre as vantagens, Catani destaca o contato direto com o consumidor. “É a melhor estratégia de relacionamento com o cliente. A companhia pode ter todos os dados dos consumidores e suas tendências de compras a fim de oferecer seus produtos, novidades e promoções. Isso é muito valioso porque ela pode capturar dados dos clientes para fazer o chamado Marketing One to One.
Um bom exemplo é o da Nike, como destaca Catani, que hoje tem 50% de suas vendas mundiais feitas no B2C.
O consultor da Gouvêa acredita que a Swift ainda tem muito espaço para crescer, mesmo já tendo mais de 600 pontos de venda.
“Acredito que eles só não cresceram ainda mais por conta dos desafios logísticos na cadeia, mas é uma questão de tempo. Já a Mercato Sadia surgiu no começo da pandemia e pegou carona na onda e agora tem um cenário muito mais maduro para atuar.”
A Swift e a Mercato Sadia não devem deixar as vendas nos supermercados de lado. “Mas, apesar de ser um excelente ponto de venda, as marcas não conseguem expor todo o seu portfólio de produtos em um supermercado, o que é totalmente possível nas lojas próprias. Por isso, vejo tanto potencial no mercado de congelados neste formato”, avalia Catani.
NETÃO DO BOM BEEF
Mesmo não atuando no ramo de carnes congeladas, mas sim no estilo boutique de cortes, outra empresa que tem feito muito sucesso é a Boom Beef.
Criada em 2014 por Domingos Neto, conhecido como Netão, a rede tem hoje 85 lojas em operação, sendo a maioria franquias, e tem a família de Sabrina Sato como sócia. O foco da empresa são os cortes de carne nobres e especiais, como ancho, picanha argentina e prime rib.
São quatro tipos de franquias, com investimento inicial a partir de R$ 329 mil (Express), com faturamento previsto de R$ 180 mil por mês, até R$ 630 mil (Rotisserie), com faturamento previsto de R$ 400 mil por mês.
Nas redes sociais, Netão dá dicas de como preparar as carnes em churrascos para 1,3 milhão de seguidores no Instagram só no perfil próprio e outros 450 mil no da marca, além de 1,2 milhão de inscritos no YouTube.
“Isso prova como hoje o consumidor é mais exigente, quer um produto diferenciado ou que ofereça praticidade para otimizar o tempo. Quem diria que um dia esse ramo de açougues, seja nas mais diversas formas de atuação, cresceria tanto”, finaliza o diretor da Gouvêa Consulting.
IMAGENS: divulgação