Franqueado do Dia fecha loja por dívidas e falta de clientes
Supermercado popular, que funcionava há sete anos na zona Leste paulistana, não resiste à crise e à concorrência

A terça-feira, 8 de março, será, muito provavelmente, uma data inesquecível para Gilberto Jordão, 52 anos, que atua há pelo menos 30 anos no setor de supermercados.
Por volta das 10h30, um grupo de funcionários do Sindicato dos Comerciários de São Paulo promoveu um ato barulhento em frente a uma de suas lojas, na Avenida Pires do Rio, 624, em São Miguel Paulista.
O objetivo dos dirigentes sindicais era forçá-lo a quitar dívidas trabalhistas da cerca de R$ 80 mil com 12 funcionários.
Há pouco mais de um mês, Jordão fechou uma de suas três lojas, a que funcionava há sete anos na Praça Giovanni Fiani, no Jardim Ponte Rasa, na zona Leste de São Paulo. Até então, ele não havia acertado as contas com os empregados.
“Não estou entendendo todo esse barulho. As homologações dos funcionários de minha loja que fechou já estavam marcadas”, disse Jordão.
Com música alta ao fundo, dirigentes do sindicato, ligado à UGT (União Geral dos Trabalhadores), chamavam a atenção dos clientes e dos empregados para a necessidade de os comerciantes cumprirem a legislação trabalhista.
Uma faixa com a frase ‘não compre nesta empresa’ chegou a irritar Jordão e os próprios funcionários do supermercado, que temiam a perda de venda, comprometendo ainda mais a situação financeira da empresa.
Depois de algumas horas no local, representantes do sindicato se reuniram com Jordão, que concordou em quitar, no próximo dia 30, a dívida trabalhista. Ele também assumiu o compromisso de pagar os salários e o FGTS atrasados de funcionários de suas duas lojas abertas.
A situação vivida por Jordão é semelhante à de muitos empresários, não apenas do ramo de supermercados, que resolveram expandir o negócio, quando a economia ia bem, e foram pegos de surpresa com a queda abrupta de vendas, além de fatores como a restrição ao crédito.
“Com a demanda crescente e a expansão da classe média, os empresários surfaram na onda e agora vão ter de enfrentar a fase ajuste por conta de uma demanda menor”, diz Gustavo Carrer, consultor do Sebrae/SP.
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Jordão diz que foi um dos primeiros franqueados da rede Dia. Ele era dono de uma mercearia, a Preço Bom, no bairro de São Miguel, que foi transformada, há dez anos, em uma loja do grupo espanhol.
O negócio deu tão certo que decidiu abrir, três anos depois, uma segunda loja (a da Praça Giovanni Fani, que fechou) e uma terceira (na Rua Pires do Rio, alvo do ato do Sindicato dos Comerciários de São Paulo) há três anos.
No final de 2014, o negócio de Jordão deu uma virada. A loja da Praça Giovanni Fani começou a operar com prejuízo. Para colocar dinheiro na loja, o comerciante começou a vender bens pessoais, como um imóvel no valor aproximado de R$ 400 mil e um carro. Não foi suficiente.
Outros dois imóveis que pertencem à família também estão à venda para quitar as dívidas. Até que chegou um momento em que Jordão e os representantes da franquia acharam que o melhor a fazer era fechar o ponto.
“A situação é essa. Decidi cortar o mal pela raiz, pois aquela loja estava comprometendo as finanças dos outros dois pontos”, dizIa ele, um tanto nervoso, enquanto escuta os sindicalistas chamarem a atenção da clientela e dos funcionários do lado de fora da loja.
A queda nas vendas, diz ele, abalou o seu negócio. Mas não foi só isso. Bem pertinho da sua loja da Praça Giovanni Fani abriu um supermercado da rede Negreiro, com uma área de venda maior do que a da sua loja, que acabou pegando parte de sua clientela.
Além disso, a dívida que contraiu para expandir o negócio e para capital de giro não parou de crescer, por conta do aumento das taxas de juros. Hoje a dívida com o banco Safra, revela, ultrapassa R$ 400 mil.
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“As taxas de juros subiram de 1,8% para 4,5% ao mês", afirma. "Em vez de me dar suporte nesta fase, o banco subiu ainda mais os juros.”. Procurada pelo Diário do Comércio, a assessoria de comunicação do banco Safra informou que a instituição não comentaria o caso do cliente.
“A margem de um supermercado já é pequena. Quando a venda diminui e a taxa de juros sobe, a situação financeira da empresa se complica. Mas não vou dar as costas para ninguém. Vou superar tudo isso e continuar no negócio, pois é o que sei fazer”, diz.
Os bancos estão restringindo o crédito não só para o varejo, mas para todos os setores. "O resultado é que muitas empresas menores não conseguem cumprir com as exigências e o custo mais elevado do dinheiro”, afirma Carrer.
Quando Jordão percebeu que a loja já não tinha mais condição de se reerguer, ele iniciou um plano para desligamento dos funcionários a partir de outubro do ano passado.
A loja tinha 24 empregados. Ele conseguiu demitir e acertar as contas com dez deles. Sobraram 14, dos quais 12 formam dispensados e outros dois foram deslocados para a loja da Rua Pires do Rio.
“Não vou criticar a rede Dia porque a empresa segue o modelo de franquia. Imagina se eles forem ajudar os 800 franqueados. Meu problema é financeiro”, diz
Procurada pelo Diário do Comércio, a direção da rede Dia limitou-se a informar, por meio de sua assessoria, que “presta todo o suporte necessário para o melhor funcionamento da operação de seus franqueados.”
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Para Josimar Andrade, diretor de relações sindicais do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, o drama enfrentado pelo comerciante Jordão é semelhante à de muitos lojistas da capital paulista. "Quando a loja começa a atrasar salários, que o negócio já chegou numa situação muito complicada"
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