Ele vende 10 mil camisetas por mês. Só pela internet
Bruno Imbrizi, conta como ele e os seus funcionários conseguiram, em cinco anos, elevar em 225% a receita da Chico Rei
No dia 24 de maio, uma quarta-feira, o empreendedor Bruno Imbrizi, 30 anos, convocou duas estagiárias, um diretor e um designer para uma reunião na sede de sua confecção de camisetas, baseada em Juiz de Fora (MG).
Não havia exatamente uma pauta. O encontro tinha como objetivo ouvir os funcionários.
No meio da conversa, uma das estagiárias lançou a ideia de uma ação online, com participação de uma drag queen, para promover a linha de camisetas básicas, que acabava de ser lançada.
O vídeo foi gravado no dia 8 de junho. A campanha vai ao ar nesta segunda-feira (19/06).
A empresa, que em menos de um mês acolheu e colocou em prática a ideia da estagiária, é a Chico Rei, responsável pela venda de 10 mil unidades por mês, somente pela internet. Com uma receita anual de R$ 6,5 milhões, emprega 50 funcionários.
Foi fundada há dez anos por Imbrizi e o amigo e ex-sócio André de Andrade, 31 anos, quando ambos cursavam a Faculdade de Artes da Universidade Federal de Juiz de Fora. Andrade saiu recentemente da sociedade.
No primeiro ano, o negócio andou mal. A dupla amargou prejuízo devido à elevada inadimplência dos clientes - um punhado de lojas multimarcas.
A Chico Rei deslanchou quando decidiu entrar no comércio eletrônico e adotar práticas de gestão e de comunicação pouco disseminadas no ramo.
Produz camisetas com estampas que remetem a filmes, séries de TV, moda, música, livros, rock, brasilidade e mundo dos geeks -gíria em inglês que define pessoas aficcionadas por determinado tema, como séries.
Mesmo em meio à recessão, as vendas de camisetas nunca caíram, segundo os sócios. Nos últimos cinco anos, o faturamento anual da Chico Rei cresceu 225%: saltou de R$ 2 milhões para R$ 6,5 milhões.
A Chico Rei ostenta números de causar inveja aos concorrentes. Segundo informa, 300 mil consumidores vestem as camisetas produzidas pela empresa, entre os 970 mil produtos criativos produzidos. Também possui quase um milhão de internautas nas redes sociais. Os funcionários já consumiram 27 mil litros de café.
Veja, a seguir, princípios e práticas seguidos pela empresa, de acordo com Imbrizi.
?FILOSOFIA DE VIDA VALE MAIS DO QUE O CV
Na hora de contratar, Bruno e André consideram mais o que os candidatos acreditam e buscam para a vida do que o currículo.
“Contratamos pessoas que gostam do novo, não têm medo de desafios, nem são acomodadas. Têm vontade de transformar o mundo. Costumamos dizer que preferimos segurar um louco que empurrar um morto.”
Há, neste sentido, quatro questões recorrentes formuladas durante a entrevista: qual a contribuição que espera levar para a empresa? O que imagina encontrar na Chico Rei? como se vê dentro de dois anos? O que planeja para sua vida?
As respostas devem estar sintonizadas com a filosofia da empresa: produzir artigos com qualidade, ter responsabilidade social e ambiental, inovar sempre em todos os departamentos, conferir poder de decisão (empowerment) para os funcionários.
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?AÇÕES CRIATIVAS PARA AMPLIAR O CONTATO COM OS CLIENTES
Na semana passada, duas equipes participaram de uma disputa do jogo da torta na cara. Um grupo concorria a um dia de frete grátis para os clientes. O outro, à distribuição de pequenos cadernos.
Cerca de 6 mil clientes acompanharam a competição pela internet, que aconteceu no espaço de convivência da empresa, reunindo o pessoal de marketing, atendimento e produção.
A turma do frete grátis ganhou. "Foi uma competição entre funcionários que beneficiou os clientes e promoveu a integração entre as equipes e, ao mesmo tempo, entre os funcionários e os clientes", diz Imbrizi.
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?FUNCIONÁRIOS TÊM VOZ
Todos participam do processo de criação das camisetas. “Se temos cinco funcionários que gostam de rock, independentemente da área, são eles que vão opinar no processo de criação de estampas relacionadas a esse gênero musical.”
A Chico Rei acumula em seu portfólio a criação de duas mil estampas, com o envolvimento de funcionários que têm afinidade com os temas.
A campanha que vai ao ar neste mês para divulgar a linha de camisetas básicas da empresa foi uma ideia da estagiária Cristina Duarte, 24 anos, da área de comunicação.
O mote da campanha é que qualquer pessoa, por mais exótica que seja, como uma drag queen, pode usar uma camiseta básica, sem perder a identidade.
“E a Chico Rei, com uma campanha como essa, também se posiciona como uma empresa livre de preconceitos”, diz ele.
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?PRODUÇÃO PROATIVA PARA DAR PODER AO FUNCIONÁRIO
A Chico Rei treina os funcionários para que todos possam trabalhar em todas as fases dos processos de confecção. Quem trabalha na produção sabem fazer bainha, arremates, acabamento das camisetas.
“Para todas essas etapas, geralmente, as confecções seguem o modelo fordista, com linhas de produção. Nós decidimos adotar um modelo proativo”, diz ele.
A empresa determina, de acordo com a demanda, quantas camisetas precisam ser produzidas por hora.
As costureiras se organizam para realizar a tarefa. Se alcançam a meta de produção até sexta-feira na hora do almoço, podem ir para a casa.
O modelo proativo, de acordo com Imbrizi, melhorou em 60% o grau de eficiência da empresa. Se durante um determinado período a Chico Rei produzia 100 camisetas, agora faz 160.
“Investíamos 18% do faturamento em marketing. Hoje, 6%, com o mesmo resultado. O sistema proativo dá poder para o funcionário, aumentando a autoestima e a produtividade.”
As camisetas são vendidas ao preço médio de R$ 60. A empresa tem crescido mesmo em meio à maior crise econômica, diz Imbrizi, porque não vende apenas um produto, mas um conceito.
“Nosso mercado ganhou má-fama por contratar pessoas com trabalho análogo ao de escravo. Queremos inverter isso. O salário do nosso pessoal é de 20% a 60% superior ao da média do mercado. No dia do aniversário, o funcionário não trabalha”, diz.
Os sócios da Chico Rei também entendem que é preciso ajudar a comunidade onde a empresa está instalada e, para tanto, reservou uma área para a instalação de uma horta orgânica. As verduras e os legumes são distribuídos para os vizinhos.
O nome Chico Rei é uma homenagem a um escravo trazido do Congo para o Brasil, que comprou a sua alforria e a de outros 500 escravos ao fazer uma reserva de ouro, quando trabalhava em uma mina.
Para Bruno e André, a marca representa o conceito de uma empresa baseado em criatividade e liberdade.
Pedimos a dois consultores especializados em varejo, Luis Henrique Stockler e Nidelci de Oliveira, que avaliassem o estilo de gestão seguido pela empresa;
Para eles, a administração horizontalizada da Chico Rei é mais frequente em startups lideradas por jovens empreendedores.
“Uma administração em que decisões são compartilhadas e os líderes batem o martelo, não há dúvida, é muito mais dinâmica”, diz Stockler.
No caso da Chico Rei, observa ele, há dinâmica na inovação, no lançamento de produtos e na forma de comunicação com os clientes.
“As equipes parecem estar muito alinhadas, o que ajuda na velocidade e na assertividade das decisões”, afirma.
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A maioria das empresas de varejo no Brasil, sobretudo as mais antigas, na avaliação de Stockler, possui pesadas estruturas hierárquicas e formalizadas. “Isso, num mercado altamente competitivo e em transformação, pode prejudicar os negócios.”
Para Nidelci, em empresas maiores, nas quais o modelo de gestão está mais enraizado, o modo de pensar das lideranças precisa ser trabalhado.
"Não há necessidade de tirar o olho de resultados, mas a essência de uma administração não deve excluir o envolvimento dos funcionários."
O estilo de gestão da Chico Rei vai de encontro às aspirações de jovens profissionais: Trabalhar em locais com objetivos claros e que possam compartilhar ideias, tarefas.
“Os jovens só ficam em empresas nas quais eles têm alguma conexão, não apenas por dinheiro, mas pelo objetivo do negócio. Nas empresas pequenas é mais fácil de implantar este tipo de administração”, diz ela.
O índice de rotatividade no comércio brasileiro supera 60%, em média, a cada ano. Na Chico Rei, é de 5%.
A forma de administrar de Bruno e André é rara hoje no país, de acordo com os consultores. Algumas empresas, no entanto, estão começando a trabalhar a ideia de unir valores pessoais aos valores das organizações.
“Não tem jeito, daqui para frente a empresas vão ter de rebolar e olhar com mais atenção a forma de lidar com pessoas e talentos.”
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FOTOS: Divulgação/ Gabriel Venzi