Com tudo caro, até o peru deve ser escasso neste Natal
Supermercados registram alta de até 30% nos preços de produtos natalinos e reforçam a compra de substitutos, como frango e peixes. Casa Santa Luzia enfrenta dificuldade na importação de bacalhau
A ceia de Natal promete ser diferente em mais um ano de pandemia do novo coronavírus. A pressão sobre os custos de produtos natalinos chegou a tal ponto que os supermercados estão com dificuldade para comprar até o que não deveria faltar nas festas natalinas, o peru.
Compradores de redes como Dalben, de Campinas, e Tenda estão, neste momento, em intensa negociação com fornecedores para colocar os produtos desta época do ano em suas lojas.
Afinal, em um ano de inflação e juros altos e salários corroídos, não faz sentido expor nas gôndolas uma peça de peru de apenas dois quilos por R$ 100 ou mais.
Redes consultadas pelo Diário do Comércio falam em aumentos de preços de até 30% sobre 2020, no caso de produtos mais consumidos nesta época.
O quilo do peru, vendido a R$ 21,98 no ano passado, deve subir para R$ 26,98 na rede Dalben, de Campinas (SP). No caso do chester, o aumento deve ser R$ 20,98 para R$ 25,98 o quilo.
Os reajustes desta ordem também ocorrem no caso de produtos como panetones, tender e pernil. Leitoa, aliás, está até em falta no mercado, de acordo com supermercadistas.
Com 95 anos, a Casa Santa Luzia, que planeja as compras de Natal desde o início do ano, informa que o peru está cerca de 20% mais caro neste ano.
O quilo da ave deverá ser vendido a pouco menos de R$ 34. A loja costuma comercializar peças maiores, de seis, oito, dez e até 14 quilos, o que é considerado um diferencial no mercado.
Além da alta de preços, a Santa Luzia enfrenta dificuldade na importação de bacalhau da Noruega, um carro-chefe desta época.
Panetones importados pela loja já chegaram e estão cerca de 11% mais caros neste ano, assim como azeites e outros produtos vindos do exterior.
Se os preços dos produtos não subiram nas fábricas, eles encareceram simplesmente por conta dos reajustes dos fretes, de acordo com Ana Maria Lopes, diretora da loja.
Com 40 lojas no Estado de São Paulo, rede de atacarejo Tenda informa que os reajustes de fornecedores de produtos natalinos chegam a 30% na comparação com o ano passado.
“O peru vai ser um produto ainda mais sofisticado neste Natal”, afirma Fausto Severini, membro do conselho de administração da rede.
Os preços dos alimentos em geral, diz ele, estão subindo devido à falta de insumos, embalagens, e aumentos de preços do frete no mercado internacional e no Brasil.
Panetones, espumantes e cervejas estão de 20% a 25% mais caros neste ano e faltam vidros para algumas bebidas, o que leva as indústrias a trocar de embalagens, diz ele.
OS SUBSTITUTOS
Para driblar a falta de produtos e os aumentos de preços, os supermercados estão correndo atrás de produtos substitutos, como frango e peixes.
A rede Dalben está negociando com a Alliz, empresa de processamento de aves do grupo Zanchetta, a compra de frangos maiores, com apelo de Natal.
O quilo deste frango deve chegar ao consumidor por pouco menos de R$ 20. “A ceia não será tão farta como foi há alguns anos”, diz Fernanda Dalben, diretora de marketing da rede.
Supermercadistas também estão reforçando a compra de peixes, de acordo com Álvaro Furtado, presidente do Sincovaga, sindicato do varejo de alimentos de São Paulo.
“Estamos diante de um problema de difícil solução. Muitos varejistas vão apostar nos peixes que são bons e até mais baratos que algumas aves e carnes bovinas”, afirma.
Para ajudar o cliente nas compras, além de investir em produtos substitutos, a rede Dalben vai trabalhar com kits promocionais de produtos.
Em uma embalagem fechada, por exemplo, o cliente pode levar um chester, um espumante e um panetone, por um preço mais acessível.
Marcas do próprio supermercado também deverão ser reforçadas, já que custam menos do que as líderes de mercado.
DESAFIOS
Um dos grandes desafios dos supermercados neste final de ano, além de brigar com fornecedores por preços menores, será planejar a compra de forma que não sobre produtos.
“É preciso ter um mix que atenda a expectativa e o bolso do consumidor”, diz Fernanda.
“Não há dúvida, o desafio vai ser mensurar a quantidade certa de produtos para cada loja”, afirma Severini.
A rede Dalben decidiu manter o mesmo volume de produtos do ano passado, apesar de ter uma loja a mais neste ano.
A Casa Santa Luzia, que restringiu as compras no ano passado, voltou a comprar volumes adequados ao seu público de anos.
A rede Tenda estima que até poderá crescer um pouco em relação a 2020, tudo porque o setor de atacarejo ganhou mercado com a pandemia.
COMPETIÇÃO ACIRRADA
A disputa por preço baixo vai ser grande neste final de ano, diz Fernanda, como foi percebido pela rede durante a Black Friday, evento que ocorreu na última sexta-feira.
“Nós fizemos boas negociações com alguns produtos, como bebidas, só que em alguns markeplaces os preços estavam lá embaixo. A competição está cada vez mais acirrada.”
As vendas de alimentos já não estão tão aquecidas como no auge das restrições para circulação de pessoas, mesmo faltando menos de um mês para o Natal.
A rede Tenda notou que, no último trimestre, as vendas deram uma esfriada, principalmente no final do mês. “O salário não dura mais os 30 dias”, diz Severini.
A rede Dalben observou que o consumidor está há alguns meses diminuindo a compra de supérfluos e migrando de marcas mais caras para mais baratas.
SURPRESA POSITIVA
Supermercadistas ligados ao Sincovaga acreditam, porém, que podem até ter uma surpresa positiva neste mês, de acordo com Furtado.
Na Black Friday, diz ele, houve uma indicação de que o consumidor está direcionando os gastos para o setor supermercadista em vez de comprar bens duráveis e semi-duráveis.
O Sincovaga estima, portanto, um crescimento de 10% a 12% nas vendas neste mês em relação a dezembro de 2020.
“Os presentes, provavelmente, deverão ser substituídos por gastos com alimentos e festas.”
IMAGEM: Andrei Bonamin/DC