Câmara aprova texto-base para reoneração gradual da folha
Aprovada faltando três minutos para o fim do prazo, nova redação determina que, a partir de 2025, haverá transição de três anos para a volta da alíquota cheia do INSS
*Com informações da Agência Brasil e do Estadão Conteúdo
Faltando três minutos para o fim do prazo estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a Câmara dos Deputados aprovou, nesta quinta-feira (12/09), o texto base do Projeto de Lei (PL) nº 1847/24, que propõe, a partir de 2025, transição de três anos para a reoneração gradual da folha de pagamento de 17 setores da economia, e para a cobrança de alíquota cheia do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em municípios com até 156 mil habitantes. Ainda é preciso analisar um destaque ao PL, mas a conclusão da votação deve acontecer ainda hoje.
Com a desoneração, as empresas beneficiadas podem optar pelo pagamento de contribuição social sobre receita bruta com alíquotas de 1% a 4,5%, no lugar de pagar 20% de INSS sobre a folha de salários. O texto prevê, de 2025 a 2027, a redução gradual da alíquota sobre a receita bruta e o aumento gradual da alíquota sobre a folha. De 2028 em diante, voltam os 20% incidentes sobre a folha, e fica extinta a alíquota sobre a receita bruta.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que comemorou a aprovação na manhã de hoje, disse que chegou o momento de pôr ordem no programa, que custou mais de R$ 200 bilhões aos cofres públicos. Também defendeu a necessidade de equilibrar as contas públicas que, segundo ele, registram saldos negativos desde 2015: não é possível seguir beneficiando empresas com o poder de lobby no Congresso Nacional, afirmou. "Você deixa uma grande empresa 10 anos sem pagar imposto. E aí, quer fazer o ajuste fiscal em cima do salário mínimo, do Bolsa Família? Alguém tem que pagar a conta, né?", completou.
O texto-base, alinhavado na noite da última quarta-feira (11/09) pela equipe econômica e pelas lideranças da Casa, e próximo ao fim do prazo determinado pelo STF para concluir o acordo, traz uma nova redação em relação à versão aprovada no Senado.
A mudança, no entanto, está sendo considerada como um ajuste de redação e, por isso, o projeto não terá de passar por nova análise dos senadores. A expectativa é de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancione a lei assim que ela chegar ao Palácio do Planalto.
COMPENSAÇÃO SERÁ FEITA COM DINHEIRO ESQUECIDO NOS BANCOS
O PL surgiu depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional a Lei nº 14.784/23, que prorrogou a desoneração até 2027, por falta de indicação dos recursos para suportar a diminuição de arrecadação. Um acordo posterior foi fechado no sentido de manter as alíquotas para 2024, e buscar fontes de financiamento para os anos seguintes.
O prazo concedido pelo STF para negociação e aprovação do projeto antes de as alíquotas voltarem a ser cobradas integralmente vencia nessa quarta-feira (11/09). Por esse motivo, o item entrou na pauta. Os deputados votavam uma emenda de redação do relator, deputado José Guimarães (PT-CE), mas não houve quórum para encerrar a votação nominal. Era necessária a presença de 257 votantes, mas somente 237 registraram o voto.
O PL contém uma série de medidas que buscam recursos para amparar as isenções no período de vigência, como atualização do valor de imóveis com imposto menor de ganho de capital, o uso de depósitos judiciais e a repatriação de valores enviados para exterior sem declaração.
O novo trecho incluído no texto prevê que a apropriação, pelo Tesouro Nacional, de valores esquecidos em instituições financeiras, mesmo que não computada como receita primária pelo Banco Central, será considerada para fins de cumprimento da meta fiscal do governo. Esse montante é de R$ 85 bilhões, que podem servir como parte da compensação à desoneração.
Hoje, no entanto, o cálculo válido para a verificação do resultado primário é o do BC. O chamado resultado primário é a diferença entre receitas e despesas sem considerar os juros da dívida pública. Ou seja, o número que determina se o governo fechou o ano no azul ou no vermelho, e se cumpriu ou não a meta estabelecida pela equipe econômica. Quando há descumprimento, gatilhos são acionados e o governo é obrigado a gastar menos.
Esse novo trecho foi incluído pela então relatora da proposta, deputada Any Ortiz (Cidadania-RS), nos momentos anteriores à votação. A mudança atendeu a acordo das lideranças com o Ministério da Fazenda para contemplar alertas do BC, mas foi além dos pontos levantados pela autoridade monetária, criando essa exceção no regramento fiscal.
Any Ortiz, porém, abriu mão da relatoria, que passou para o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE). "Guimarães, que o senhor assine essa chantagem que estamos vendo aqui hoje. Não tenho como assinar esse relatório da forma como foi feito, no limite do prazo", disse.
O BC, na última segunda-feira emitiu uma nota técnica aos deputados criticando a forma de se contabilizar esses montantes esquecidos nas contas bancárias, que somam R$ 8,6 bilhões. No documento, a autoridade afirmava que a incorporação desse montante bilionário no cálculo das contas públicas estava "em desacordo com sua metodologia estatística, indo de encontro às orientações do TCU (Tribunal de Contas da União) e ao entendimento do STF sobre a matéria."
SANÇÃO IMEDIATA
A expectativa é de que o Palácio do Planalto dê aval imediato ao projeto, assim que aprovado na Câmara. A pressa se deve ao fato de o prazo dado pelo ministro Edson Fachin, do STF, para que Legislativo e Executivo buscassem uma solução de consenso para o tema vencer nesta quarta-feira, 12/09. Dessa forma, caso a Câmara não aprovasse o projeto até o final do dia, voltaria a valer a decisão tomada pelo ministro do Supremo Cristiano Zanin, em abril, que determinou a reoneração da folha. O tema mobilizou Executivo, Legislativo e Judiciário bem como o empresariado, que reclama de insegurança jurídica neste longo impasse tributário.
A desoneração da folha de pagamentos foi instituída em 2011 para setores intensivos em mão de obra. Juntos, eles incluem milhares de empresas que empregam 9 milhões de pessoas. A medida substitui a contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a folha de salários por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Ela resulta, na prática, em redução da carga tributária da contribuição previdenciária devida pelas empresas. Por decisão do Congresso, em votações expressivas, a política de desoneração foi prorrogada até 2027, mas acabou suspensa por uma decisão liminar do STF em ação movida pelo governo federal.
A alegação é que o Congresso não previu uma fonte de receitas para bancar o programa, e não estimou o impacto nas contas públicas. O Legislativo, porém, argumenta que medidas foram aprovadas para aumentar as receitas da União e que a estimativa de impacto estava descrita na proposta aprovada. O ministro da Fazenda anunciou, então, um acordo para manter a desoneração em 2024, e negociar uma cobrança gradual a partir do próximo ano.
A equipe econômica insiste em uma medida que represente receitas para os próximos anos, nos 17 setores da economia que foram beneficiados: confecção e vestuário; calçados; construção civil; call center; comunicação; empresas de construção e obras de infraestrutura; couro; fabricação de veículos e carroçarias; máquinas e equipamentos; proteína animal; têxtil; TI (tecnologia da informação); TIC (tecnologia de comunicação); projeto de circuitos integrados; transporte metroferroviário de passageiros; transporte rodoviário coletivo e de cargas.
FOTO: Bruno Spada/Agência Câmara