O que está por trás do colapso do viaduto da Marginal
Não se trata de um caso isolado. O país precisa contar com um sistema informatizado de todas as pontes e viadutos, que emita alertas quando não for feita a avaliação ou manutenção

É preciso lembrar, em primeiro lugar, que toda catástrofe nunca é motivada por um único “fator”, mas sim por uma sucessão de equívocos e negligências.
Diferentemente do que foi alegado pelas autoridades de que “o viaduto não apresentava problemas estruturais”, a verdade é que os responsáveis não “ouviram” os avisos e advertências da superestrutura de concreto.
“O rompimento do ponto de apoio de um dos blocos” não ocorreu do dia para noite, mas é o resultado de um processo de negligencia e descaso.

Longevas e constantes infiltrações de água possibilitadas por juntas de dilatação deterioradas, além da rápida deterioração do concreto e de suas armaduras, comprometem os aparelhos de apoio que deixam de proteger os pontos de contato entre as estruturas, permitindo que as constantes movimentações fizessem o trabalho de demolição do concreto.
As ausências de inspeções regulares e serviços de prevenção são a verdadeira causa desse colapso nas estruturas do viaduto.
As normas técnicas preveem inspeções técnicas anuais e especiais a cada cinco anos para verificação e providências nas variadas e possíveis patologias das estruturas.
No caso da cidade de São Paulo não ocorrem inspeções há mais de sete anos (foram suspensas na gestão Fernando Hadad) e as licitações em andamento (Gestão Doria) estão paralisadas e em análise pelo Tribunal de Contas do Município, há quase dois anos.
Essas licitações são para contratação dos serviços de inspeção e posterior licitação dos serviços de prevenção (possivelmente recuperação e consertos emergenciais) de 33 complexos de pontes e viadutos que já foram identificados com relevantes problemas estruturais.
A atribuição de fiscalizar e manter a integridade dessas estruturas é da administração responsável pela malha viária específica.
É da prefeitura a responsabilidade por inspecionar e reparar pontes dentro da cidade. O governo de cada Estado deve zelar pelas obras em rodovias estaduais, enquanto a União cuida das que pertencem a estradas federais.
Situações como do Viaduto da Marginal Pinheiros ocorrem em diversas outras localidades, como a recente a queda de um viaduto em Brasília (a inspeção que apontava a necessidade de

reparos estava na administração do Distrito Federal desde 2010, esperando decisão).
Nas rodovias sob concessão a fiscalização é de responsabilidade pública e a manutenção da concessionária. No caso das rodovias paulistas, por exemplo, quem deve verificar os riscos de seus viadutos e pontes é a equipe do DER-SP e, com base nessa aferição, a concessionária é quem fica responsável por fazer eventuais obras. Mas há muita negligencia por parte dos departamentos estaduais.
O DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), vinculado ao Ministério dos Transportes, tem um programa para cuidar das cerca de 8.000 pontes e viadutos sob sua jurisdição. O próprio órgão detectou que 1.712 das estruturas (21%) necessitam de ajustes imediatos. Destas, 920 foram consideradas prioritárias e um grande número de estruturas está “condenada”.
Além da total negligência e falta de providencias, existem muitas outras questões a serem analisadas:
*a “saída” das principais empresas de inspeção e recuperação estrutural do mercado - duas das mais importantes foram vendidas para grupos “estrangeiros” e estão quase desativadas por falta de atividades.
*empresas especializadas que estão em “difícil situação”, pela falta de atividade nos últimos anos, em decorrência da crise econômica.
*normas técnicas obsoletas e falta de atualização técnica dos principais órgãos de controle, inexperiência e ausência de profissionais nos órgãos técnicos causada pelas aposentadorias de seus membros e pelo não preenchimento dos cargos, cortes indiscriminados de orçamentos, etc...
Também não se encontram “foros” apropriados para discussão de novas técnicas de inspeção e de recuperação. Em alguns casos as licitações não permitem o uso de drones para inspeção, obrigando a presença física do técnico em locais de difícil acesso.
Conclusão: os administradores públicos responsáveis pela fiscalização e que não estavam “olhando” têm de arcar com a responsabilidade social desse desastre “anunciado”.
Existem riscos enormes e diferentes de uma simples estrada “esburacada” e dos riscos de desabamentos e colapsos, que na maioria das vezes não são visíveis.
Contar com um sistema informatizado de todas as pontes e viadutos, que emita alertas quando não for feita a avaliação ou manutenção é uma questão de prioritária. Conselhos profissionais deveriam assumir essas funções em nome da sociedade civil e fiscalizar a eficiência da gestão pública.
Toda e qualquer possível “economia” resultante dos “embargos preventivos” pelo Tribunal de Contas serão certamente gastos nas obras emergEncias de recuperação do Viaduto da Marginal Pinheiros.
ENTENDA O CASO
O concreto é o melhor amigo do homem, mas a junta de dilatação é o pior inimigo do concreto.
O movimento é um elemento inevitável quando se aborda o tema das estruturas, principalmente em pontes. Existem dispositivos que permitem suportar os movimentos e assegurar durabilidade e longevidade das estruturas:

- Juntas para movimentação (e dilatação) são “dispositivos” que permitem acomodar variações volumétricas dos materiais, os efeitos da vibração e movimentações inerentes a cada tipo de estrutura. São essenciais para garantir a integridade e a durabilidade e pontes e viadutos. Todo projeto estrutural prevê essas “fendas” entre esses elementos estruturais.
- “Selos” ou juntas de dilatação são os elementos aplicados dos tabuleiros de pontes e viadutos com a finalidade de vedar essas “fendas” permitindo a livre movimentação das estruturas garantindo estanqueidade, estabilidade e durabilidade.
- Aparelhos de apoio são dispositivos maleáveis (borrachas) que fazem a transição entre o “tabuleiro” (superestrutura) e os pilares (infraestrutura) instalados onde estas estruturas se apoiam, permitindo livres movimentações uma em relação à outra.
Apesar do avanço tecnológico a vida útil destes elementos ainda é inferior à vida útil das pontes.