Dez anos após baixar as portas, Mango volta ao Brasil por meio da Dafiti

A Marca espanhola, que foi sucesso entre as brasileiras com suas peças de estilo casual clássico, aposta na consolidação do e-commerce do país para ter sucesso em seu retorno

Cibele Gandolpho
04/Mai/2023
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Dez anos após baixar as portas, Mango volta ao Brasil por meio da Dafiti

Não é incomum de se ver marcas de grifes internacionais de moda chegando ao Brasil e, pouco tempo depois, fazerem as malas e irem embora. Vários motivos explicam esse movimento: alta carga tributária, dificuldade de logística, prolongada recessão econômica, instabilidade política e falta de ambientação ao manequim brasileiro.

Entre as grandes marcas que aterrizaram por aqui e decolaram pouco tempo depois estão a Forever 21, a Versace, Kate Spade e tantas outras que encerraram suas atividades locais.

A espanhola Mango foi pelo mesmo caminho, deixando o Brasil há 10 anos, mesmo sendo um sucesso absoluto lá fora – são mais de 2.600 lojas em 155 países e faturamento de R$ 14,9 bilhões.

Mas, há menos de dois meses, a gigante espanhola anunciou o retorno ao Brasil por meio da plataforma de vendas da Dafiti. O que explica essa volta de algumas marcas em modelo on-line? Uma resposta, segundo especialistas em varejo, pode ser a consolidação do e-commerce de moda no Brasil, que ganhou mais força na pandemia.

A Mango, criada em Barcelona (Espanha), em 1984, tem como proposta uma alfaiataria atemporal e um estilo casual clássico, e é uma das maiores rivais da Zara na Europa.

Em 2013, depois de abrir um pouco mais de dez lojas, a Mango desistiu de continuar no Brasil, reclamando da burocracia e dos impostos de importação. A varejista espanhola tentou enveredar pela venda on-line, mas a pouca familiaridade do brasileiro com a modalidade na época não ajudou os planos e a marca foi definitivamente embora.

Hoje, a Dafiti tem uma extensa lista de marcas, sendo mais de 100 internacionais. A plataforma oferece uma curadoria de marcas especialmente selecionadas em seu portfólio, seguindo não só critérios de resultado potencial, mas principalmente pela capacidade que cada franquia tem de agregar valor e promover o posicionamento estratégico da Dafiti.

Dentro deste conceito, a Dafiti já tem em seu portfólio muitas marcas internacionais desejadas pelo consumidor brasileiro, como é o caso da GAP, Topshop, Ralph Lauren, Forever 21, Lacoste, Tommy Hilfiger, Michael Kors e Calvin Klein.

As peças da Mango passaram a integrar a seleção premium da Dafiti, com roupas para o público feminino disposto a pagar entre R$ 150 e R$ 500 pelos modelos. Voltados às mulheres maduras das classes A e B, os produtos oferecidos são jeans, malhas, suéteres, cardigans, vestidos, blusas, camisas e saias.

“A Mango é uma marca forte, que foca sua coleção principalmente no lifestyle casual e contemporâneo e atinge mais diretamente uma mulher estabelecida, que sabe o que quer, que entende, gosta de moda e busca produtos de qualidade”, explica Fabio Fadel, Brazil Lead da Dafiti.

Ele acredita que essas características estão altamente correlacionadas com o comportamento da base de clientes da Dafiti, que juntamente com o fato de ser uma marca já reconhecida pelo brasileiro, tem tudo para dar certo.  

Inicialmente, o e-commerce oferecerá apenas peças do universo feminino da Mango, mas, segundo a própria Dafiti, a depender do desempenho, a empresa pode ampliar no futuro a grade de produtos com itens masculinos e infantil.

Fadel destaca que a mulher que se reconhecia na Mango precisava viajar para outros países para adquirir uma peça da marca espanhola. “Além de poder comprar no Brasil pela Dafiti, a cliente ainda pode usufruir de outras facilidades, como o parcelamento, que lá fora não é possível. Isso torna a marca ainda mais acessível ao público brasileiro e nos permite executar a nossa missão de trazer a moda do mundo para todo mundo”, acrescenta.

ESTRATÉGIA

Apesar de a Mango ter claros planos de expandir os negócios globalmente por mais de 20 novos mercados, os especialistas em varejo ouvidos pelo Diário do Comércio não acreditam que o retorno por meio da Dafiti seja uma estratégia da rede espanhola para emendar uma volta com lojas físicas.

Flávio Dias, conselheiro e investidor-anjo, é um dos que não apostam em lojas físicas da Mango no país. Com uma sólida carreira executiva, Dias comandou o e-commerce do Magalu, foi presidente do WalMart.com e CEO da Via e vê essa movimentação apenas como uma estratégia da Dafiti de compor seu portfólio com marcas exclusivas e complementares ao catálogo já existente.

“Parece ser uma parceria comercial tradicional com praticamente zero de complexidade de execução e nenhuma necessidade de investimento ou risco. Cenário bem diferente do que seria uma reentrada no mercado, que certamente requisitaria investimentos em marketing, logística, pessoal, lojas etc”, comenta Dias

Ele também não acredita se tratar de um teste de mercado. “Se esse fosse o caso, a empresa teria que operar dentro do seu modelo de negócio, que é bem sucedido em vários outros países do mundo, e a transação teria que ter outras características, como produtos escolhidos pela Mango, precificação e poder de decisão nas campanhas. Isso tudo está nas mãos da Dafiti.”

Mediante esse controle, o especialista acredita que o alcance em vendas da Mango vai ter limitações, uma vez que as decisões de campanha, nível de exposição, experiência de compra e todo o relacionamento com o cliente fica a cargo da Dafiti, que tem outros milhões de itens e outras centenas de marcas para vender.

Sobre a possibilidade da Mango voltar a ter sua própria plataforma digital para vendas, o consultor é claro. “Os investimentos e os riscos passam a não ser tão baixos, principalmente em logística e na aquisição de clientes. Se não for uma empresa pure player - como a Shein, que tem toda a expertise e os capabililties para vender on-line para vários distintos mercados -, penso ser muito difícil uma estratégia como essa dar certo.”

Para Dias, marcas de roupas podem sim vender bem seus produtos nas plataformas digitais e, dependendo da eficiência da parceria, até pode haver bons resultados. “Porém sem lojas físicas, sem investimento na marca, sem ter o controle promocional ou qualquer relação com o cliente final, fica muito difícil conseguir ter um tamanho relevante no mercado.”

Já para o consultor especializado no mercado de varejo e CEO da Opex Retail, Marcos Hirai, assim como a Zara, a Mango está posicionada no mundo como um produto de fast fashion massificado, mas o custo de importação dos produtos para o Brasil acaba reposicionando a marca como um item premium no mercado local.

“Faz muito sentido a cautela da Mango em voltar ao Brasil por meio da Dafiti. Lá fora, a marca é muito conhecida e quando chegou aqui com o nome de MMG, acho que não foi uma boa estratégia. No entanto, vender pela Dafiti, sem o alto risco de criar toda uma estrutura física, de pessoal, de logística etc., é uma decisão acertada em um segmento tão disputado como o e-commerce. Algo parecido fez a Forever 21, que fechou suas lojas físicas no Brasil em 2022, mas a Dafiti passou a comercializá-la no ambiente on-line.

FAST FASHION

A Forever 21 é uma marca jovem que inaugurou no Brasil com filas enormes nas portas das lojas e causou um alvoroço. “Mas, diferentemente do sucesso que experimentou em outros países com peças baratas em dólar e em euro, no Brasil, seus produtos eram considerados caros para o público que os consumia. Além disso, impostos altos, custos de importação e infraestrutura acabaram elevando o preço final das roupas, situação que foi agravada com a pandemia”, avalia Hirai.

A chamada fast fashion - modelo em que os produtos são fabricados, consumidos e descartados constantemente e com muita rapidez - tem alta rotatividade no exterior, mas não parece funcionar no Brasil, o que ajudou na falta de sucesso da Forever 21 por aqui com lojas físicas.

Atualmente, as peças da marca podem ser adquiridas também na plataforma da Dafiti.

DESAFIOS

O fato é que o Brasil ainda é um mercado pouco explorado por marcas internacionais. Co-autor dos livros “Faces do Varejo”, “Omniera” e “O Mercado, o Consumo e o Varejo pós-pandemia”, Marcos Hirai também acredita que os entraves de impostos, excesso de encargos e logística dificultam o processo. “Além disso, há uma falta de adaptação na modelagem para o corpo da mulher brasileira. Parece que há uma miopia para os hábitos do consumidor brasileiro”, avalia.

Flávio Dias destaca que o Brasil é um mercado desafiador para as marcas internacionais, a começar pela força das marcas locais, que já conhecem bem o gosto dos brasileiros, aprenderam a operar e já têm seus canais de venda, sua logística e sua base de clientes bem desenvolvidos.

“A logística certamente entra como mais um ponto de complexidade, dadas as dimensões continentais do país, condições das estradas e até mesmo questões de segurança. A configuração dos impostos (taxas diferentes de estado para estado, substituição tributária etc.) também costuma complicar bastante para empresas que não estão acostumadas a esse cenário.”

Já para o executivo da Dafiti, apesar de existir muitas marcas premium que vêm para o Brasil, ainda não há um grande investimento no país. “Além do risco de entrar no mercado sem awareness e da demanda de investimento para chegar por meio de uma loja física, as empresas também têm dificuldade de entender e enfrentar a complexidade fiscal, tributária, econômica e política, especialmente quando se tem uma parte relevante do portfólio alocado em produtos importados”, avalia Fadel.

Alguns fatores oferecidos pela Dafiti abrem os olhos das marcas para o Brasil. “Acabamos sendo bem-vistos como uma parceira que possibilita às marcas atuarem no Brasil, reduzindo seus riscos operacionais. Isso por meio de um bom relacionamento que a Dafiti já tem com tantas marcas globais, pela estratégia de se apresentar como uma plataforma que promove o branding com uma curadoria de moda, especialmente executada para promover as coleções, respeitando o conceito (lifestyle) de cada marca, além de termos um bom nível de serviço para todo o país”, completa.

 

IMAGEM: Mango/divulgação

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