De secretária a empreendedora, quem é, o que pensa e como trabalha Chieko Aoki
A fundadora e CEO da rede Blue Tree fala sobre os planos de expansão da empresa e aborda temas como ascensão feminina e capacitação de mão de obra no setor hoteleiro

O rosto sereno e reservado de Chieko Aoki não revela, ao primeiro olhar, toda a sua destreza empreendedora. A simpática senhora, de 66 anos e cerca de 1,50 de altura, afirma que nos últimos anos tem trabalhado cada vez mais. Quase não sobra tempo para seu passatempo predileto: cantar Elvis Presley e Frank Sinatra no karaokê.
Leitora aficionada de obras de gestão – entre seus autores preferidos estão Jim Collins e Peter Drucker –, Aoki está lendo atualmente "Motivação 3.0", do escritor americano Daniel Pink. “O livro fala que apenas recompensas e punições não motivam mais as pessoas dentro de uma organização”, diz Chieko. “O que nos motiva é nossa satisfação pessoal e o legado que deixaremos para o mundo.”
De legado e motivação Chieko entende bem. Ela é fundadora da Blue Tree, empresa que administra 22 hotéis, em 18 cidades brasileiras, e emprega 2 300 funcionários. Em 2013, a empresa faturou R$ 350 milhões. Ano passado, a expectativa era crescer 10% – os números oficiais ainda não foram completamente mensurados.
Nascida no Japão, Chieko chegou ao Brasil aos seis anos. Na década de 1960, aos 18, iniciou sua vida profissional na Ford. O cargo: secretária. “Consegui a vaga logo na minha primeira entrevista. Adorei”, diz. Na mesma época, ela ingressou no curso de Direto da Universidade de São Paulo.
No início da década de 1970, aconteceu uma das grandes mudanças na vida de Chieko. Ela se casou com o empresário John Aoki, da companhia japonesa Aoki Corporation, que atuava nos setores de engenharia civil, navegação e hotelaria. O marido trouxe Chieko para o mundo dos hotéis. Era o início da carreira da Dama da Hotelaria.
Após estudar administração hoteleira em Tóquio e Nova York, ela atuou na área de marketing e vendas até chegar à presidência do Caesar Park e do Westin Hotels & Resorts, subsidiárias da empresa do marido. Aos 40 anos – e sem filhos –, ela comandava uma cadeia com cerca de 80 hotéis espalhados por 19 países.
Em 1992, Chieko foi responsável por criar a empresa Caesar Tower, focada em administrar hotéis de bom padrão, mas com tarifas mais baixas do que as dos cinco estrelas. Para ela, era um nicho de mercado promissor.
Anos mais tarde, um imprevisto mudou novamente sua carreira. John Aoki sofreu um acidente vascular cerebral que o tirou da vida empresarial. O episódio levou à venda do Caesar Park para o grupo mexicano Posadas, em 1997. Chieko deixou de ser uma executiva bem sucedida. “Mas não tive tempo para chorar.”
Ela usou a experiência de mais de 20 anos no setor para se tornar uma empreendedora. “Fiquei com alguns hotéis da antiga marca Towers e fundei a minha própria empresa, a Blue Tree”. A inspiração para nomear a nova empreitada veio de seu sobrenome. Aoki, em japonês, significa “árvore azul”.
Com um grupo de cerca de 20 funcionários, Chieko alçou voo solo. Nos anos 2000, a Blue Tree já administrava hotéis em São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Florianópolis, Salvador e Porto Alegre. “O sucesso profissional só acontece quando você se mantém feliz consigo mesma – independente dos desafios que a vida te proporciona”, diz.
A EXPANSÃO DOS NEGÓCIOS DA EMPRESA
Recentemente, a Blue Tree passou a focar a abertura de unidades em cidades do interior do Brasil. A rede vai inaugurar oito empreendimentos fora de regiões metropolitanas até 2017. Cinco serão no interior de São Paulo, nos municípios de Piracicaba, São Carlos, São Roque, Valinhos e Votorantim. Unidades em Bauru e Lins já estão em operação.
A expansão acompanha a tendência do crescimento econômico das cidades de médio porte. Segundo uma pesquisa do Boston Consulting Group, o interior brasileiro vai crescer 28% entre 2012 e 2020. Um incremento de R$ 141 bilhões na economia – cerca de 60% a mais do que o montante movimentado nas capitais. Em Piracicaba, por exemplo, cerca de 30 000 famílias vão integrar as classes A e B até 2020 – número 36% maior em relação a 2010.
Esses municípios também têm em comum a presença de grandes empresas. Piracicaba é sede da Caterpillar e possui uma unidade da siderúrgica ArcelorMittal, que na última década recebeu investimentos de US$ 100 milhões para aumentar a produção. São Roque, com menos de 100 000 habitantes, tem uma unidade da Usina Fortaleza, uma das maiores produtoras de argamassa e revestimentos do país. Outro exemplo é Valinhos, que abriga grandes indústrias, como Eaton e Unilever, que empregam parte dos 118 000 valinhenses. ”
Para a Blue Tree, essas regiões apresentam um movimento de turismo de negócios que se tornará ainda mais promissor nos próximos anos. “O interior de São Paulo está recebendo cada vez mais empresas e indústrias, mas carece de infraestrutura para hospedar executivos e centros de convenções para reuniões e eventos.”
INOVAÇÕES NA REDE
Em dezembro do ano passado, a Blue Tree se lançou em um novo serviço: a franquia hoteleira. No modelo de franquia, hotéis independentes – que não pertencem a nenhuma rede – formalizam uma parceria com a Blue Tree para receber a bandeira da marca. Por sua vez, a Blue Tree transfere seu programa de gestão, marketing, processos de qualidade e sistemas de vendas e reservas para o franqueado. A administração do hotel continua sendo responsabilidade de seu dono.
Até momento, a única empresa captada como franquia foi o hotel Terras Altas. O empreendimento, que ocupa uma área de 200 mil metros quadrados no município de Itapecerica da Serra, está passando por uma reforma para aumentar a sua capacidade de acomodação. Ao término, serão cerca de 150 dormitórios.
“Constatamos que cerca de 70% dos quartos disponíveis no Brasil pertencem a proprietários independentes”, afirma Chieko. “Queremos levar nossa experiência hoteleira para esses empreendedores.”
A SPIN-OFF DA ADMINISTRADORA DE HOTÉIS
Outro negócio que Chieko comanda é a empresa Noah Gastronomia, que reúne uma rede quatro restaurantes, um espaço de eventos na zona sul de São Paulo e uma prestadora de serviços alimentares para empresas e consumidor final. Fundada em 1998, o Noah pertence ao Grupo Chieko Aoki, holding que controla a Blue Tree. Em 2014, a empresa foi responsável por operar os camarotes e lounges da Arena Fonte Nova, em Salvador, durante a Copa do Mundo. A empresa não revela o faturamento.
MULHERES E EMPRESAS
Em 2013, Chieko foi eleita a segunda mulher de negócios mais poderosa do Brasil pela revista Forbes. Também figuraram na lista Adriana Machado, vice-presidente de Assuntos Governamentais e Políticas Públicas da GE para a América Latina, e Claudia Sender, presidente da TAM.
“Nos últimos anos, as brasileiras alcançaram espaço relevante em todos os setores da economia”, afirma Chieko. “A ascensão feminina no Brasil está crescendo devido esforço das próprias mulheres. Não tivemos ajuda do governo, por exemplo.”
A empreendedora, que afirma nunca ter sido vítima de machismo, compara a situação das políticas de igualdade de gêneros brasileiras com a de sua terra natal. O Japão, país conhecido por manter uma postura conservadora em relação às mulheres, lançou recentemente políticas para aumentar a participação delas no mercado de trabalho. A meta do governo é aumentar em 30% a proporção de mulheres em cargos de liderança no setor público e privado. O slogan da campanha é: "Uma sociedade em que as mulheres brilhem".
Por aqui, a força da mulher empreendedora pode ser sentida na formalização de negócios ao longo da última década. Em 2005, havia 19 000 microempreendedoras individuais no país. Hoje, existem cerca de 1,8 milhão de mulheres à frente de micro empresas – 47,4% do total de empreendedores, de acordo com dados da Secretaria da Micro e Pequena Empresa do governo de federal.
“Quanto mais mulheres chegam a posições de liderança, mais a sociedade reconhece a nossa competência”, diz Chieko.
Chieko também participa do grupo Mulheres do Brasil, que reúne 120 executivas e empreendedoras que se encontram mensalmente para discutir temas que envolvem mulheres e negócios. Também integram o comitê Ana Luiza Trajano, presidente da Magazine Luiza, e Sonia Hess, presidente da Dudalina.
CAPACITAR OS FUNCIONÁRIOS
No setor hoteleiro o apreço por um bom serviço é essencial. Muitas escolas técnicas, por exemplo, dão aos cursos de capacitação hoteleira o nome de “a arte de bem servir”.
“O brasileiro é conhecido por ser hospitaleiro e alegre em sua vida pessoal”, diz Chieko. “Porém, essas características não são transferidas para o nível profissional.” Ela diz não ser possível ensinar uma recepcionista, por exemplo, a ser simpática. “Ela precisa sentir vontade de ser cordial” afirma Chieko.
Para o aprendizado do bom atendimento, a Blue Tree oferece para seus funcionários uma plataforma online com mais de 270 horas de treinamento. Lançada em 2011, a Academia de Excelência, como é chamada, dispõem de cursos que ensinam padrões de arrumação das camas, manutenção dos hotéis e atendimento ao hóspede na recepção.
“O funcionário deve ser orientado a praticar o bom atendimento diariamente”, diz Chieko. “E a exigência deve ser constante.” Funcionárias relatam que a própria senhora Aoki (nome por qual é conhecida entre os funcionários) costuma chamar a atenção de empregados que cometem pequenos deslizes – como manter a cabeça baixa enquanto está no lobby ou andar pelo hotel com o uniforme desarrumado.
O MOMENTO DE PLANEJAR UMA SUCESSÃO
Ao ser questionada sobre como planeja fazer a sucessão de seus negócios, Chieko respondeu – com muito bom humor – que pretende permanecer à frente da Blue Tree por muito tempo. No entanto, ela reconhece que é necessário planejar a continuidade do negócio após sua aposentadoria. “Não posso atrelar a vida da empresa com a minha vida pessoal”, afirma ela. “Considero a empresa uma entidade, que deve prosseguir sua trajetória após a minha saída.” Ainda assim, Chieko disse que ainda não iniciou a avaliação para uma futura sucessão.