4 oportunidades para o Brasil criadas pela eletrificação do setor automotivo

A frota de carros eletrificados cresceu quase doze vezes no país entre 2019 e 2023. Para Flaminio Fichmann, da Associação Brasileira de Veículo Elétrico, Brasil deve aproveitar esse potencial para gerar empregos e negócios

Mariana Missiaggia
11/Dez/2024
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4 oportunidades para o Brasil criadas pela eletrificação do setor automotivo

Acompanhando uma tendência global, a substituição dos veículos à combustão pelos eletrificados (híbridos e 100% elétricos) avança em ritmo acelerado. Em 2023, foram vendidos mais de 14 milhões de veículos elétricos no mundo. O volume corresponde a 18% das comercializações e representa um crescimento de 35% em relação a 2022.

Os números fazem parte do relatório Global EV Outlook 2024, que também indica que, se mantida essa evolução, em 2035, todo automóvel comprado em qualquer lugar do mundo será movido a eletricidade. De acordo com a agência, a participação do Brasil neste mercado é de 3%, somando uma frota de pouco mais de 385 mil unidades. Em 2019, eram 32 mil veículos do tipo no país, o que significa um crescimento de quase 12 vezes em cinco anos.

Até então, são carros de montadoras da China, Alemanha e Hong Kong que dominam as vendas no Brasil. Algo que, segundo a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), precisa mudar. A expectativa é que o carro elétrico 'made in Brazil' tenha sua produção iniciada até 2027. A princípio, esses veículos devem ser feitos por meio de CKD. Ou seja, o processo em que as peças vêm do exterior para serem montadas em fábricas instaladas no país.

"Não é uma questão de criar concorrência, mas sim, ver o que está acontecendo no mundo e encontrar soluções", diz Flaminio Fichmann, diretor de mobilidade e membro do Conselho Diretivo da ABVE. Recentemente, ele se reuniu com integrantes do Conselho de Política Urbana (CPU) e Núcleo de Estudos Socioambientais (NESA) da Associação Comercial de São Paulo (ACSP) para discutir o cenário da eletrificação em São Paulo.

Para Fichmann (dir.), da ABVE, o Brasil é um dos poucos países com indústria e escala para suportar a produção que a transição para veículos elétricos vai exigir (Imagem: Cesar Bruneli/ACSP)

 

Dando destaque ao ecossistema que existe por trás de cada carro elétrico, Fichmann falou sobre a importância dessa transição e da oferta de novas soluções frente à crescente preocupação com as mudanças climáticas, atendendo às demandas do consumidor por veículos mais ecológicos e eficientes.

Ao mesmo tempo em que o mercado enfrenta desafios importantes, como o elevado custo de aquisição, a falta de infraestrutura de recarga e a ausência de incentivos fiscais adequados, o especialista lista quatro grandes oportunidades que a eletrificação cria para a cidade e para as empresas. Confira:

1 - AVANÇO DO BRASIL EM TECNOLOGIA

Lembrando que europeus e norte-americanos sempre ditaram o ritmo da indústria, pois viram de perto a globalização do setor, Fichmann cita que vemos agora a ascensão dos chineses como protagonistas nessa corrida, com a BYD, líder mundial em mobilidade elétrica, e a novata Seres. Das montadoras tradicionais europeias, os modelos da BMW, do Grupo VW, e da Renault também trazem representatividade.

Embora a indústria nacional automotiva esteja atrasada na adoção de tecnologias, sobretudo para eletrificação, Fichmann aponta o Brasil como um dos poucos países com indústria e escala para suportar a produção de veículos na dimensão que essa transição vai exigir. Hoje, segundo ele, um dos maiores desafios é a inexistência de uma indústria de baterias no Brasil, embora o país disponha praticamente de todos os minérios usados na produção, como fosfato, ferro e lítio.

"Não queremos estar a reboque de uma tecnologia ultrapassada e assumir o risco de a nossa indústria perder relevância local e global. Hoje, somos importadores, mas as empresas precisam pensar em como aproveitar a escala de produção e ter competitividade enquanto o país navega nessa transição", diz.

O Programa Mover, de Mobilidade Verde e Inovação, lançado pelo Governo Federal em 2023, que atualiza o Rota 2030, estabelece novas exigências de sustentabilidade das frotas de carros, ônibus e caminhões e prevê créditos financeiros para empresas que investem em tecnologia e pesquisa. As companhias devem aplicar, no mínimo, entre 0,3% e 0,6% da Receita Operacional Bruta nesses projetos. Estão previstos R$ 19,3 bilhões de créditos financeiros entre 2024 e 2028.

2 - A BUSCA POR FONTES DE ENERGIA RENOVÁVEL

Partindo da ideia de que a eletromobilidade abre a perspectiva de sinergia com outras fontes renováveis, o especialista destaca que temos essas fontes em abundância e o país pode ser líder global na produção de energias limpas, investindo na diversificação da geração de energia.

Dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) indicam que, em 2022, cerca de 83% da eletricidade gerada no país veio de fontes renováveis. A hidrelétrica é a principal, representando aproximadamente 63% da geração total, seguida por energia eólica, biomassa e solar.

Embora a energia solar ainda represente uma pequena parcela da matriz energética brasileira, Fichmann diz que esse mercado tem potencial e vem crescendo, especialmente na geração distribuída, com sistemas instalados em residências, comércios e indústrias.

Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o Brasil tem condições de mudar sua matriz energética – o conjunto de fontes de energia disponíveis – até 2029. Isso reduziria a dependência de hidrelétricas e aumentaria a participação das fontes eólicas e solar.

3 - INCENTIVO À INDÚSTRIA NACIONAL E LIMPA

Se por um lado um automóvel elétrico preserva o meio ambiente enquanto está rodando na rua, não necessariamente ele será igualmente limpo na obtenção dos insumos para a sua fabricação. Por essa razão, Fichmann chama a atenção para a oportunidade de fortalecer a indústria local.

Essa demanda, segundo o especialista, tem atraído investimentos significativos em todo o mundo e o Brasil, com seu vasto potencial de geração de energia limpa, pode tornar-se um destino atrativo para investidores estrangeiros. Nas palavras de Fichmann, multinacionais estão cada vez mais interessadas no Brasil não apenas pela viabilidade econômica, mas também pela pressão para adotar práticas sustentáveis em suas operações globais.

Com o intuito de incentivar a produção local e atrair investimentos estrangeiros, o governo aumentou o imposto de importação para veículos elétricos. A taxação vai de 18% a 25%, de acordo com o modelo (híbridos convencionais, totalmente elétrico e plug-in).

"Não podemos ficar presos a uma indústria antiga. O Brasil é um produtor de veículos e tem uma cadeia de autopeças, precisamos cuidar disso. Podemos produzir esses automóveis e com conteúdo nacional. É uma chave que precisa ser virada".

Para tanto, na visão de Fichmann, é preciso ter políticas de incentivo, investimento em pesquisa e desenvolvimento, além de parcerias com os principais países desse mercado, como a China, que se mostra muito aberta ao Brasil. 

Ao citar que a ABVE segue em busca de incentivos para o setor, o especialista avalia que as regras estabelecidas pelo programa Mover devem colaborar para a nacionalização de produtos.

4 - PLANEJAMENTO E INFRAESTRUTURA DE RECARGA

Nessa adequação aos novos tempos, outro ponto levantado por Fichmann é que as cidades devem ser projetadas para permitir o acesso fácil e combinado entre os meios de transportes. Isso, por intermédio de políticas públicas. Considerando a ampliação da rede como um desafio para a cidade de São Paulo, ele diz que, atualmente, o maior problema é a má distribuição dos pontos de carregamento.

De fato, a infraestrutura para rodar com veículos elétricos é uma preocupação de quem se interessa pelo modelo. Isso porque a autonomia dos automóveis depende dos pontos de recarga, assim como os veículos a combustão dependem de postos de gasolina.

Hoje, são quase cinco mil eletropostos, com previsão de chegar a dez mil nos próximos dois anos por meio de parcerias entre as montadoras e as empresas de postos de combustíveis. O avanço dessa infraestrutura, reforça Fichmann, reflete em novos empregos, investimentos e desenvolvimento de equipamentos, componentes, peças e softwares.

"O que faz um transporte ser eficiente é a complementariedade. A eletrificação exige muita sinergia e as cidades devem ser projetadas para isso. Mais do que elétrico, precisa ser inteligente, democrático e inclusivo".

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IMAGEM: Freepik

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