O que se vê e o que não se vê
Dilma erra ao acreditar que, pelos efeitos produzidos, aplicou uma política econômica correta em seu primeiro mandato
Equivoca-se a senhora presidente ao crer que aplicou as medidas econômicas certas em seu primeiro mandato. Para ela, a aplicação desse modelo heterodoxo preservou o crescimento, sustentou o emprego e manteve a renda e o poder de compra do trabalhador.
Para os que comungam do mesmo ponto de vista, surpreendeu a mudança na condução da economia no início do segundo mandato. Temos agora um modelo econômico ortodoxo, cujo objetivo seria restaurar o crescimento até o final do ano, preservando assim o emprego e mantendo a renda e o poder de compra do trabalhador.
Contudo, ambas as percepções são incorretas. Dez em cada dez economistas profissionais advertiram que o novo modelo econômico do primeiro mandato produziria precisamente os frutos que agora estão sendo colhidos.
A senhora presidente, pelo visto, caiu na armadilha apontada em meados do século 19 pelo economista francês Frédéric Bastiat. Em economia, cada ação produz não somente um efeito, mas uma cadeia de efeitos, alguns deles imprevisíveis.
Muitas vezes nos deixamos levar pelos resultados imediatos de nossas ações, não nos dando conta de os resultados imediatos não são sustentáveis. Somos iludidos pelo que vemos, ignorando o que não vemos ou não queremos ver.
O primeiro equívoco decorre de uma percepção equivocada dos fatos. A taxa média de crescimento da economia foi inferior às taxas observadas nos dois mandatos do presidente Lula e nos dois mandatos do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Quem sustentou o pouco crescimento obtido entre 2010 e 2014 foi o setor primário, já que a indústria encolheu nos quatro anos. O emprego total, de fato, se manteve, mas o emprego industrial minguou e os empregos criados fora desse setor foram de pior qualidade.
Argumenta-se também que o poder de compra dos trabalhadores foi mantido. Os reajustes salariais acompanharam, para algumas categorias mais que de outras, a inflação observada no período.
Ocorre que a inflação que serviu de base para os reajustes incluiu um grande número de preços administrados, cujos reajustes permaneceram congelados. A inflação dos preços livres ultrapassou em muito a dos preços administrados.
Muitos viram que essa política econômica estava fadada a eventualmente produzir resultados opostos aos almejados.
Os subsídios e as renúncias fiscais acabariam por criar um enorme déficit e comprometeriam a gestão da dívida pública; a política de expansão do crédito produziu uma explosão da demanda, que alimentou a inflação interna e vazou para o balanço de pagamentos; o crédito subsidiado contribuiu para agravar a situação deficitária das contas públicas; o uso da taxa de câmbio como instrumento anti-inflacionário incentivou as importações e deprimiu as exportações; e por aí vai.
Agora, os preços administrados foram liberados e estão causando um grande estrago nos bolsos dos consumidores; a taxa de câmbio foi liberada de suas amarras, o real tornou-se a moeda que mais se desvalorizou esse ano em todo o mundo e pelo menos parte dessa desvalorização passará para os preços; há um crescente sentimento de insegurança dos que estão empregados com relação a seus empregos; muitos consumidores se endividaram quando o Banco Central reduziu a taxa básica de juros e agora não conseguem pagar suas dívidas.
Poucos também se deram conta de que pela primeira vez em muitos anos registramos um expressivo déficit na balança comercial brasileira, e também pela primeira vez em muitos anos a entrada do investimento direto estrangeiro ficou aquém do déficit em conta corrente do balanço de pagamentos do país.
Portanto os poucos ganhos obtidos nos primeiros anos do segundo mandato rapidamente se transformaram em pesado ônus, cuja correção será dolorosa e tomará mais tempo que o final desse ano, como nos informa o governo.
Nada disso se viu ou se antecipou quando se pôs em prática a "nova política econômica"; viu-se apenas o que estava imediatamente adiante. A despeito da esmagadora evidencia de milhões de pessoas protestando nas ruas contra o governo, um ministro vai à televisão nos dizer que os que protestaram não eram eleitores da senhora presidente e de seu partido.
Não sei eram ou não; mas, pelo teor da frustração demonstrado, não mais o serão.